Natália Portinari

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Reportagem

Por que as emendas parlamentares não são transparentes? Entenda a disputa

Nos últimos anos, um dos principais embates em Brasília é a respeito da falta de transparência nas emendas parlamentares, que representam um orçamento cada vez maior.

Em 2024, R$ 49 bilhões dos R$ 251 bilhões previstos em investimentos com recursos da União foram destinados a emendas parlamentares.

Mas por que parlamentares têm interesse nessa falta de transparência?

Há dois problemas distintos. O primeiro é o do "orçamento secreto", que começou com as emendas de relator, e o segundo, das emendas Pix, como são chamadas as transferências especiais da União para municípios e estados da federação.

Em 2019, foram criadas as emendas de relator, controladas pelo parlamentar responsável por relatar o projeto de lei orçamentária de cada ano. A ideia era tirar o poder dos ministérios de decidir para onde mandar o dinheiro.

O primeiro relator nesses moldes, Domingos Neto (PSD-CE), ganhou poder de ditar diretamente a distribuição de cerca de R$ 20 bilhões. Mas o cargo vinha com a responsabilidade de dividir essa verba entre os parlamentares mais poderosos, como os líderes partidários.

Ou seja: não eram R$ 20 bilhões para que o relator decidisse onde gastar sozinho, e sim uma negociação política entre os parlamentares mais influentes, sem transparência nem mesmo para os 513 deputados e 81 senadores.

Por isso, quando finalmente os dados vieram à tona, foi possível perceber que poucos parlamentares, como Márcio Bittar (União-AC), Arthur Lira (PP-AL), Davi Alcolumbre (União-AP), Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Fernando Bezerra (MDB-PE), haviam conseguido direcionar mais de R$ 100 milhões cada um para suas bases eleitorais.

Para um parlamentar do "baixo clero", pode ser positivo propagandear que conseguiu direcionar R$ 50 milhões extras para seus municípios, por exemplo.

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Já para os políticos da cúpula do Congresso, o efeito é o oposto. Eles são pressionados por seus pares a dividirem melhor as indicações e ficam com a reputação de centralizadores, o que tem um efeito negativo nos relacionamentos do dia a dia.

O ex-presidente da Câmara Arthur Lira, por exemplo, enviou R$ 357 milhões do orçamento secreto aos municípios de prefeitos aliados. Durante seus quatro anos de gestão, teve diversos desgastes com outros deputados, que o acusaram de não dividir bem os recursos.

Isso não significa, porém, que não se saiba onde esse dinheiro foi parar. Toda emenda parlamentar tem uma destinação conhecida, que pode ser consultada através do Portal de Transparência da União.

Após a proibição das emendas de relator, o Congresso tentou usar as emendas de comissão para fazer essas distribuições sem transparência, mas o STF determinou, no final do ano passado, que será preciso revelar os "padrinhos".

Para o STF, o uso de emendas parlamentares não pode contrariar os princípios constitucionais da transparência e impessoalidade.

Emendas Pix

Um problema diferente é o das emendas Pix, ou transferências especiais. Elas caem rapidamente (como um Pix) na conta do município ou do estado, e não precisam ter uma finalidade definida. São transferências para usar como quiser.

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Nesse caso, há, necessariamente, a identificação do parlamentar que enviou o dinheiro. Não é possível usar emendas de comissão (nem emendas de relator, enquanto existiram) para transferências especiais.

A falta de transparência faz com que até os órgãos de controle tenham dificuldade em descobrir onde está sendo usado o dinheiro. Portais de transparência das prefeituras muitas vezes não seguem a lei e não dão detalhes sobre as receitas e despesas municipais.

Em relação às emendas Pix, a lei aprovada em acordo entre o Congresso e o Executivo no ano passado criou novas regras. Será preciso haver uma destinação específica para as transferências e dar transparência a como está a execução dos gastos.

Já as emendas de comissão seguem em um embate entre STF e Congresso, com indiretas a respeito do tema nos discursos dos novos presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre, na eleição no último sábado (1º).

Elas devem seguir existindo nesse ano, mas o STF determinou que o governo só irá pagar as indicações "carimbadas" com os nomes de seus padrinhos.

Nesta terça-feira (4), Hugo Motta, o novo presidente da Câmara, disse ao UOL que não vê problema em seguir a determinação do STF e indicar os padrinhos das emendas de comissão.

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