Natália Portinari

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Projeto sobre emendas articulado por Alcolumbre beneficia o próprio senador

O projeto de lei votado pelo Senado sobre restos a pagar, que permite que até R$ 4,6 bilhões em investimentos já cancelados voltem para o Orçamento, beneficia o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União), e seu estado, o Amapá.

Um levantamento da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados obtido pelo UOL mostra que o estado com mais verbas canceladas é o Amapá, com R$ 515 milhões descartados no fim de 2024.

Em seguida vêm os estados de São Paulo (R$ 385 milhões), Amazonas (R$ 304 milhões), Bahia (R$ 293 milhões) e Paraíba (R$ 290,8 milhões), estado do presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos).

O autor do projeto é o senador Randolfe Rodrigues (PT), também do Amapá, líder do governo no Congresso e aliado do presidente do Senado.

Durante o mês de fevereiro, a Casa ficou parada, e Alcolumbre marcou apenas uma sessão para votar a proposta que beneficia seu estado e preserva suas emendas.

O texto permite que os investimentos do orçamento de 2020, 2021 e 2022 cancelados no final do ano passado — em que cidades e estados perderam o prazo para fazerem as obras — continuem ativos.

No final do ano passado, foram cancelados R$ 2,4 bilhões em investimentos dos ministérios, R$ 60,9 milhões em emendas de comissão e R$ 2,2 bilhões em emendas de relator (conhecidas como orçamento secreto).

O projeto ainda precisa passar pela Câmara dos Deputados e não deve "ressuscitar" a totalidade desses valores, já que coloca algumas condições, como que já haja uma licitação em andamento para executar a obra.

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Emendas de Alcolumbre

Dos R$ 515 milhões cancelados em verbas para o Amapá, pelo menos R$ 129,5 milhões são de convênios cujo padrinho é o próprio Alcolumbre, segundo ofícios enviados por ele aos ministérios das Cidades e do Desenvolvimento Regional.

A maior obra prejudicada é um convênio de R$ 95,7 milhões para pavimentação em Santana (AP), cidade administrada por Bala Rocha (PP), aliado de Alcolumbre. Seu empenho (reserva para pagamento) foi anulado.

O senador assegurou os recursos para as obras em 2020, mas o município não conseguiu executar o convênio até hoje. Por isso, houve o cancelamento.

Há outros repasses do senador cancelados para Calcoene, Oiapoque, Laranjal do Jari, Serra do Navio e Tartarugalzinho. Como mostrou o UOL, Alcolumbre é o líder nas verbas dos "restos" do orçamento secreto.

Técnicos de Orçamento ouvidos pela reportagem apontam que, após uma eventual aprovação da lei, os ministérios precisarão analisar quais obras se encaixam nas exigências para serem executadas.

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O texto relatado pelo senador Carlos Portinho (PL-RJ), que ainda pode mudar, prevê que não poderão ser pagos valores relativos a obras e serviços que estejam "sob investigação ou apresentem indícios de irregularidade".

O UOL identificou também convênios com valores menos expressivos indicados por outros parlamentares que sofreram cancelamentos.

Uma obra de R$ 13,7 milhões patrocinada por Sérgio Petecão (PSD-AC) em Epitaciolândia (AC), por exemplo, teve seu empenho (reserva para pagamento) cancelado, assim como R$ 8,1 milhões indicados por Vanderlan Cardoso (PSD-GO) e R$ 5,2 milhões por Márcio Bittar (União-AC).

Há R$ 14,8 bilhões em emendas de comissão e de relator já autorizadas em anos anteriores que ainda não foram pagas. Essas verbas devem entrar como restos a pagar neste ano, além das que foram canceladas.

Há um prazo de dois anos até que as transferências garantidas a estados e municípios sejam perdidas por falta de execução. É por isso que os repasses autorizados em 2023 e 2024 ainda estão preservados.

Procurado, o presidente do Senado disse, através de sua assessoria, que o projeto "salva obras importantes nos municípios e estados brasileiros, assegurando a efetiva entrega de bens e serviços à população brasileira. Isso ocorre por meio da prorrogação do prazo para que os entes públicos finalizem o processo de execução física e orçamentária de instrumentos legais vigentes e anteriormente contratados".

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"Essa medida evita que recursos já empenhados sejam cancelados, impedindo que obras essenciais fiquem inacabadas ou deixem de ser executadas por questões burocráticas. Estamos garantindo que investimentos públicos resultem em benefícios concretos para população. Trata-se apenas de uma ampliação do prazo para que os entes públicos regularizem seus compromissos, sem comprometer a estabilidade fiscal e sem gerar impactos negativos nos serviços prestados."

"Ademais, ressalta-se que a maioria dos instrumentos que podem ser beneficiados com essa prorrogação no Estado do Amapá, são despesas discricionárias do próprio Poder Executivo".

Reportagem

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