Natália Portinari

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Reportagem

Governo começa a liberar pagamentos de verbas políticas na Saúde

O governo federal começou a liberar verbas "extras" no Ministério da Saúde, que funcionam como um novo orçamento secreto no governo Lula, para atender deputados e senadores da base aliada.

Em uma portaria publicada em 22 de maio, foi autorizado o pagamento de R$ 40 milhões. Como mostrou o UOL, o governo deve pagar R$ 3 bilhões a municípios de parlamentares que votaram a favor do orçamento de 2025.

Em tese, esses recursos devem ser usados para vacinação, controle de doenças, atenção à saúde da mulher, credenciamento de novas equipes de saúde, entre outras finalidades previstas pelas regras do Ministério da Saúde.

Na prática, não há transparência sobre esse uso, já que o dinheiro se mistura com outros recursos dos fundos de saúde municipais.

A cidade mais beneficiada até agora é Tuntum (MA), com R$ 4,4 milhões. Em seguida estão Itaíba (PE), com R$ 2,7 milhões, e Anchieta (ES), com R$ 2,4 milhões. Ao todo, são 46 municípios contemplados nessa primeira liberação.

O ministério não divulgou qual político foi responsável por cada indicação. As tabelas com os pedidos são enviadas pela Câmara e pelo Senado à Secretaria de Relações Institucionais, da ministra Gleisi Hoffmann (PT).

Tuntum é base eleitoral do senador Weverton Rocha (PDT-MA). Procurada, a prefeitura disse que tem bom relacionamento com Weverton e com a senadora Ana Paula Lobato (PDT-MA), mas não esclareceu quem enviou a indicação.

Em Itaíba, em Pernambuco, o prefeito Pedro Pilota (Republicanos) é próximo do ministro Silvio Costa Filho, deputado licenciado do mesmo partido.

O prefeito disse que fez o pedido diretamente pelo Ministério da Saúde e negou que tenha pedido ajuda a algum parlamentar.

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Já Anchieta é administrada por Léo Português (PSB). Ele disse que a liberação dos recursos foi fruto de um esforço concentrado que fez em Brasília neste mês, visitando vários gabinetes, e que não sabe ao certo qual parlamentar foi atendido, porque pediu que vários incluíssem o município em suas listas.

Ele pediu que Amaro Neto (Republicanos), Fabiano Contarato (PT), Jaque Rocha (PT) e Gilson Daniel (Pode) indicassem verbas na saúde para cidade.

Segundo o prefeito, o município sofreu recentemente uma perda de arrecadação que precisa ser compensada. "São emendas para custeio de atenção primária, aplicação de recursos no consórcio municipal de saúde e nos atendimentos. São recursos muito bem-vindos e serão bem utilizados", afirmou.

Duas cidades ligadas ao senador Davi Alcolumbre (União-AP), Santana (AP) e Tartarugalzinho (AP), também vão receber R$ 2,2 milhões e R$ 2 milhões, respectivamente.

O prefeito de Santana, Bala Rocha (PP), e o de Tartarugalzinho, Bruno Mineiro (União), são os principais agraciados pelos investimentos direcionados por Alcolumbre. O senador já financiou diversas obras de infraestrutura nesses municípios e enviou emendas para seus sistemas de saúde.

O UOL procurou os prefeitos do Amapá e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, mas não obteve resposta.

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O prefeito de Cabo Frio (RJ), Dr. Serginho, disse que os R$ 2 milhões que sua prefeitura irá receber provavelmente foram uma indicação de Soraya Santos (PL-RJ). A deputada, por sua vez, não respondeu ao contato do UOL.

O que são as verbas

Embora sejam chamadas de emendas informalmente, essas verbas são, na realidade, um "extra" para deputados e senadores da base aliada, direcionados pela Saúde com orientação da Secretaria de Relações Institucionais.

Elas não passam pelo trâmite das emendas parlamentares comuns. Portanto, não é possível saber quem foi o seu "padrinho", e o governo também não tem a obrigação de pagar todas as indicações.

Isso possibilita que essas verbas sejam distribuídas de forma desigual, privilegiando municípios de aliados.

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A ministra da SRI, Gleisi Hoffmann, fez um acordo com os presidentes da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e com Davi Alcolumbre (União-AP), para pagar R$ 3 bilhões na Saúde pela aprovação do orçamento de 2025.

No ministério, esse fluxo é operacionalizado pela equipe de Alexandre Padilha (PT-SP), que assumiu a pasta em março, quando o acordo foi selado. Antes disso, ele ocupava o posto de Gleisi Hoffmann, ministro da SRI.

No Congresso, o clima é de pressão para que as demais liberações aconteçam logo. O ministério, porém, só pode liberar propostas que se adequem a uma portaria publicada em 22 de maio, que estipula critérios técnicos.

Nessa portaria há a previsão de que serão usados os seguintes critérios:

  • necessidade de saúde da população;
  • dimensões epidemiológica, demográfica, socioeconômica e espacial;
  • perfil demográfico da região;
  • perfil epidemiológico da população a ser coberta; e
  • características quantitativas e qualitativas da rede de saúde na área.

O total previsto no orçamento para negociações políticas na Saúde é até R$ 8 bilhões neste ano, segundo fontes no Congresso e no governo.

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Ao UOL, a SRI negou que faça parte do trâmite de indicação dessas verbas "extras". A pasta disse que "trata exclusivamente da tramitação de emendas parlamentares e não participa da execução orçamentária de fundos discricionários de órgãos e autarquias do governo".

O Ministério da Saúde afirmou que "todos os projetos e destinações de recursos seguem critérios técnicos previamente definidos e são objeto de transparência ativa".

"As liberações de recursos das propostas encaminhadas à pasta são submetidas a rigorosa análise e dependem de dotação orçamentária para a sua aprovação. Para aprimorar estes mecanismos, o Ministério da Saúde editou a portaria Nº 6.916 estabelecendo regras para repasses de parcela única."

"Em 2025, foram liberados R$ 490 milhões para estados e municípios de todo o país, em conformidade com as regras da administração pública — incluindo os recursos da Portaria Nº 6.916 citada. Os R$ 40,3 milhões, que representam menos de 10% dos recursos de parcela única, atendem a solicitações de gestores locais de 46 municípios, em 19 estados diferentes, para ampliar a assistência primária da população nessas regiões."

Reportagem

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