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Paulo Sampaio

Em SP, negro casado com prefeito diz que está mais vulnerável a ataques

Max, com Edgar: "Chega um momento em que a sociedade exige uma resposta mais dura do Estado" - Arquivo Pessoal
Max, com Edgar: "Chega um momento em que a sociedade exige uma resposta mais dura do Estado" Imagem: Arquivo Pessoal

Colunista do UOL

07/06/2020 04h00

Chamado recentemente de "macaco" nas redes sociais, o modelo homossexual Max de Souza acredita que o preconceito no Brasil é tão virulento quanto nos Estados Unidos. Max e seu marido, o prefeito de Lins (420 km de SP), Edgar de Souza (PSDB), se juntam ao coro de indignados que desde a semana passada se manifesta contra crimes raciais em ambos os países. As mortes de um adolescente no Rio e de uma criança no Recife deixaram a sociedade estarrecida. Em Minneapolis, no estado americano de Minnesota, o assassinato brutal de um homem negro por um policial branco desencadeou uma onda de protestos.

"Chega uma hora em que a sociedade exige uma resposta mais dura do Estado", diz Max. "A violência contra os negros aumenta a todo instante, mas os crimes passam desapercebidos, muitas vozes não são ouvidas. A melhor maneira de mostrar que estamos, sim, vendo tudo, é irmos para a rua. Sem violência, na paz."

A mesma coisa

Distantes cerca de 8 mil km uma da outra, Lins e Minneapolis têm em comum o fato de estarem em países liderados por governos conservadores, adeptos da repressão pela força. Tanto aqui quanto lá, a polarização política tende a acirrar os ânimos. Segundo o prefeito Edgar de Souza, "a dinâmica de luta nos dois países é diversa, mas a conexão mundial tornou tudo mais próximo".

"Graças à atenção que a grande mídia tem dado ao assassinato nos EUA, a gente pôde ver o quanto esses atos bárbaros são corriqueiros no Brasil. Infelizmente, eu tenho a impressão de que muitas vezes não causam a mesma comoção aqui. Entretanto, desta vez ficou claro que o caso do (George) Floyd e o do menino Miguel, ou do João Pedro e da Agatha são a mesma coisa: racismo."

Beijos e telefones

Juntos há dois anos, Max e Edgar foram apresentados em 2018 por um amigo em comum. Na ocasião, Edgar, 41 anos, estava se divorciando de seu primeiro marido. "A gente se conhecia só das redes sociais, eu o seguia no Instagram. Um dia, em uma festa, trocamos beijos e números de telefones, mas não nos falamos mais. Passado um tempo, eu o convidei para vir a um show da Marília Mendonça em Lins, e desde então não nos separamos mais."

Nascido em Itubera, no litoral sul da Bahia, Max representa a típica vítima de múltiplos preconceitos. Negro, nordestino, homossexual, ele passou a enfrentar mais uma hostilidade quando se casou com um homem público: "Além de tudo, interesseiro", comentam os maledicentes.

Max e Edgar em Ilhabela, agosto de 2019 - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Max e Edgar em Ilhabela, agosto de 2019
Imagem: Arquivo Pessoal

Objeto sexual

Quatorze anos mais jovem que o prefeito, Max é alto, malhado, muito vaidoso. Estudante de educação física, chegou a concorrer ao título de Mister Brasil 2019, ficou em 4º lugar. "Eu sou muito observador, percebo em todos os lugares que uma pessoa negra precisa estar muito bem vestida para não ser discriminada. Se eu cuido da aparência, sei que vou ser bem recebido, mas não estou isento de passar por situações constrangedoras."

Alto, malhado, vaidoso, Max chegou a concorrer a Mister Brasil em 2019 - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Alto, malhado, vaidoso, Max chegou a concorrer a Mister Brasil em 2019
Imagem: Arquivo Pessoal

O tipo físico avantajado de Max eventualmente desperta o que Edgar chama de "objetificação do homem negro". O prefeito diz que, em relação a seu primeiro marido, o preconceito sexual foi acrescido da descriminação pela cor. "As pessoas olham para os homens negros como objeto sexual, e desprezam a inteligência, a competência, a capacidade."

Max afirma que, ao contrário do que se poderia supor, a proximidade do poder não o blindou contra ataques racistas e homofóbicos: "Eu fiquei mais vulnerável, porque estou mais exposto. E eu sou bastante ativo nas redes sociais", diz.

É ali que ele milita.

Em 17 de maio, "Dia Internacional contra a Homofobia" - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Em 17 de maio, "Dia Internacional contra a Homofobia"
Imagem: Arquivo Pessoal

Como?

"Só de expor o meu relacionamento com outro homem, já estou militando. Uso as armas que eu tenho. Procuro falar abertamente sobre homofobia, racismo, discriminação social, e respeito quem tem pontos de vista diferentes, mesmo que não aceite os meus", diz.

A propósito, não foi a primeira vez que o chamaram de "macaco". "Nem a última", ele diz.