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Plínio Fraga

Peso da delação de Cabral depende de quanto conta sobre STF e STJ

O ministro Luiz Fux agradeceu o apoio de Cabral com beijo nos pés da primeira-dama - Bruno Rocha/Fotoarena/Estadão Conteúdo
O ministro Luiz Fux agradeceu o apoio de Cabral com beijo nos pés da primeira-dama Imagem: Bruno Rocha/Fotoarena/Estadão Conteúdo

Colunista do UOL

17/12/2019 12h47

O valor da delação premiada que o ex-governador Sérgio Cabral negociou com a Polícia Federal será medido por fatos concretos e indícios de eventuais crimes de tráfico de influência e corrupção praticados na escolha de ao menos dois ministros do Supremo Tribunal Federal e quatro ministros do Superior Tribunal de Justiça.

A delação de Cabral, rejeitada pelo Ministério Público Federal e depois negociada pela Polícia Federal, está na mesa do ministro do STF Edson Fachin.

Existe uma clara disputa de poder entre procuradores e policiais federais na negociação de acordos desse tipo. À parte essa peleja corporativa, Cabral efetivamente participou de negociações diretas envolvendo nomeações para a cúpula do Judiciário.

Se Cabral não menciona episódios concretos nos anexos da delação, ainda mantidos sob sigilo, sua proposta de colaboração caminhará para o nada.

Se Cabral detalhar sua participação na escolha de ministros para as duas mais altas cortes do país, o problema ganhará dimensões jurídicas graves.

A primeira questão que se coloca é a existência de eventuais crimes de tráfico de influência e corrupção na escolha de ministros do STF e do STJ. Como tais postos exigem indicação direta do presidente da República, é natural que haja conversas e disputas políticas.

É assim na suprema corte americana, na qual a correlação de forças entre conservadores e progressistas tem relação direta com a presença na Casa Branca de um republicano ou de um democrata. Não seria diferente no Brasil.

Sérgio Cabral sempre foi falastrão. No auge do poder, entre 2007 e 2014, quando governou o Estado do Rio de Janeiro e teve no Palácio do Planalto os aliados petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, gabava-se de ter sido vitorioso na indicação de dois ministros ao STF.

O primeiro foi Carlos Alberto Menezes Direito (1942-2009), indicado por Lula em setembro de 2007 na vaga de Sepulveda Pertence.

O segundo foi Luiz Fux, nomeado por Dilma em março de 2011 na vaga de Eros Grau.

Fux já afirmou publicamente que deve o cargo a Cabral: "Uma pessoa que contribuiu muitíssimo para mim, na caminhada ao Supremo, foi o governador Sérgio Cabral. Eu sou amigo dele e da mulher dele. E ele levou meus currículos [para Dilma]. Você tem de ter uma pessoa para levar seu perfil e seu currículo para quem vai te nomear. Senão, não adianta", disse Fux em depoimento à Fundação Getulio Vargas, como registra o livro "Os Onze", de Felipe Recondo e Luiz Weber.

Seriam necessárias provas _ ou indicativos concretos para obtê-las _ para que a operação de apoio de Cabral a Fux seja tipificada como crime. Houve vantagens indevidas? Tráfico de influência? Corrupção?

Fux acumula fatos controversos envolvendo Cabral. Alguns são folclóricos como ter beijado os pés da então primeira-dama Adriana Ancelmo, mulher de Cabral, para agradecer sua indicação ao STF. Outra questão polêmica foi a nomeação de sua filha, Marianna Fux, para o cargo de desembargador do Tribunal de Justiça do Rio em 2013. Era então uma profissional de 32 anos, com limitada experiência profissional.

Por lei, um quinto dos desembargadores deve ser escolhido entre profissionais do direito. Cabe à Ordem dos Advogados apresentar uma lista de seis nomes, que em seguida os desembargadores reduzem a três, em votação no TJ. A escolha final é do governador do Estado, que nomeia um dos três mais votados. Cabral escolheu a filha de Fux.

Esses fatos são detalhados por Cabral? Não se sabe ainda. O ex-governador diversas vezes afirmou ter trabalhado na indicação de ministros para o STJ como Luis Felipe Salomão (nomeado por Lula) e Marco Aurélio Bellizze (indicado por Dilma). Especifica como o fez e que tipo de ajuda recebeu em troca?

Essas são as questões de peso para que se avalie se a delação de Cabral vale a pena. Preso há três anos, o ex-governador soma condenações de 268 anos. Estaria disposto a devolver R$ 368 milhões _ dinheiro que assumidamente desviou. Se resumir seu depoimento a acusações pontuais contra juízes de primeira e segunda instâncias do Rio de Janeiro, é compreensível que se recuse seu relato dos fatos. Reafirmará apenas sua fama de contador de vantagens.