Raquel Landim

Raquel Landim

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Reportagem

Dino cria marca política própria, e Congresso teme 'Lava Jato das emendas'

Com o avanço das investigações da Polícia Federal sobre as emendas parlamentares, um juiz vem, novamente, ganhando cada vez mais proeminência em Brasília: Flávio Dino.

Para os deputados no Congresso, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) está "mancomunado" com o governo federal e quer promover uma "Lava Jato das emendas", para ajudar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a recuperar popularidade.

Já auxiliares de Lula negam qualquer "negociação" com Dino, mas divergem sobre os motivos.

Em uma semana de conversas em Brasília, a coluna ouviu quatro ministros do governo Lula que lidam diretamente com o tema. Procurado, Dino não deu entrevista.

Para alguns, Dino está criando uma marca política própria com o caso das emendas, a exemplo do que já ocorreu com Joaquim Barbosa no mensalão, com Sergio Moro na Lava Jato e com Alexandre de Moraes no combate às fake news.

Outros avaliam que o Congresso mexeu com os "brios" do juiz Dino ao desrespeitar suas decisões e que ele sempre disse publicamente que o avanço do Legislativo sobre as prerrogativas do Executivo no Orçamento é "inconstitucional".

Pessoas próximas ao ministro dentro do STF sustentam outra interpretação.

Dizem que não existe uma "marca" de Dino no caso das emendas, porque ele era senador quando o STF proibiu o orçamento secreto, em 2022.

Na visão dessas pessoas, ao reabrir o caso em setembro de 2023, a pedido de entidades da sociedade civil que denunciavam o descumprimento da decisão do Supremo, Dino apenas não prevaricou.

Continua após a publicidade

Inquéritos de suspeitas de corrupção com emendas tramitam hoje com praticamente todos os ministros do STF, mas o fato é que Dino é quem domina os holofotes.

Jogo combinado?

No Congresso, o vaivém de liberação e bloqueio das emendas do fim do ano passado, durante a aprovação do pacote fiscal, seria a prova de que Dino e o governo têm um "jogo combinado".

Porém, os ministros de Lula descrevem o período como um dos mais tensos recentemente, só perdendo para a polêmica em torno do Pix e da Receita Federal.

"Havia uma decisão do Supremo sobre as emendas. Só que nós tínhamos uma bomba fiscal para desarmar no meio do caminho", afirmou uma fonte.

Segundo os ministros, ao criar as chamadas "emendas de líderes", o Congresso não respeitou a decisão de Dino e o acordo entre os Poderes.

Continua após a publicidade

Pressionado pela imprensa e pela sociedade civil, que ingressou no STF após denúncia publicada pela revista piauí, Dino reagiu com um novo bloqueio.

"O ministro não ia tomar um passa-moleque do Congresso", diz outra fonte.

Deputados rebatem e afirmam que o líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE), concordou com as emendas de líderes. O Planalto, portanto, seria o fiador do acordo.

'Lava Jato das emendas'

Hoje o clima no Congresso é de apreensão. O assunto "emendas" permeou a posse dos novos presidentes da Câmara e do Senado e também é tema nas discussões da reforma ministerial.

Líderes partidários acreditam que Dino e o governo querem promover a "Lava Jato das emendas" para atingir os partidos da oposição e do centrão.

Continua após a publicidade

A operação Overclean, que chegou até a cúpula do União Brasil, seria um exemplo.

Com a relatoria dessa operação nas mãos do ministro Kassio Nunes Marques, os parlamentares acreditam ter ganho um respiro, mas as investigações sobre as emendas seguem ininterruptas na Polícia Federal e na CGU (Controladoria-Geral da União).

Na visão dos parlamentares, as autoridades policiais estão misturando "o joio e o trigo".

"O deputado que fizer coisa errada tem que pagar, mas não faz sentido deixar todas as emendas paradas por causa disso", disse uma fonte à coluna.

Deputados também acreditam que Dino está comprando briga com as pessoas erradas.

Eles afirmam que o atual presidente do Congresso, David Alcolumbre (União-AP), é mais "ardido" do que o anterior, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). "Ele não vai se curvar", dizem.

Continua após a publicidade

Para outra fonte, Hugo Motta (Republicanos-PA), que agora preside a Câmara, tem fama de apaziguador, mas também não costuma ceder.

A polêmica das emendas seria ainda um empecilho para a entrada do ex-presidente da casa Arthur Lira (PP-AL) na Esplanada dos Ministérios. "Vamos trazer o problema das emendas para dentro do governo?", questiona um auxiliar do presidente.

Dino convocou uma audiência de conciliação entre os Poderes em 27 de fevereiro para tratar das emendas.

Muito se especula em Brasília se o ministro pretende em algum momento deixar a toga para retomar a carreira política. Seu nome é frequentemente lembrado com um possível sucessor de Lula, em 2030.

Operadores experientes afirmam que, se for esse o caso, ele precisa ter cuidado na dose. No Brasil, juízes que pegaram muito pesado com a corrupção e com os políticos, dizem, acabaram inviabilizados.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Deixe seu comentário

O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.