Derrite merece um amigo secreto inusitado para SP ter mais segurança
Na minha confraternização de Fim de Ano, daria uma viagem à Bahia para o secretário da Segurança Pública paulista, Guilherme Derrite.
Lá, o Capitão testemunharia que polícias que matam muito não deixam ninguém mais seguro. Na Bahia, entre janeiro e outubro deste ano, 1.344 civis foram mortos por policiais. Mais que todas as polícias dos 50 estados americanos juntos. Ainda assim, a Bahia continua a ser o estado com maior número de mortes violentas do país.
A gestão do bolsonarista Derrite parece se inspirar na dos petistas baianos. No mesmo período, sob Derrite, a polícia paulista matou 676 civis —o dobro da média registrada durante a gestão Doria/Rodrigo Garcia, o governo tucano pré-Tarcísio. Sim, já podemos sentir saudades da pax tucana, daquela polícia bastante menos descontrolada. Pior: a letalidade na era Tarcísio não fez um único paulistano sair à noite serelepe, falando ao celular na calçada. Nos sentimos tão ou mais inseguros.
Nos últimos dois anos, a Bahia quadruplicou o número de policiais denunciados por crimes como homicídio, formação de grupo de extermínio, fraude processual, tortura e extorsão. Será que Derrite e cia. perceberiam que quando uma corporação não tem freios, supervisão ou punição por excessos, esse mesmo poder absoluto corrompe?
Nesse amigo secreto de recursos fartos, eu traria para São Paulo o secretário de Segurança da Bahia, o delegado federal Marcelo Werner Derschum Filho. Ele teria muito o que explicar a seus colegas do "campo progressista" sobre o fracasso de 18 anos do governo petista baiano na segurança.
Como os petistas ficaram décadas levianamente chamando a polícia tucana de "fascista", não devem ter percebido que aquela era a mais bem-sucedida do Brasil. Quem vive com segurança na porta do trabalho e guarita gigante na porta do prédio onde mora, depende menos de segurança pública. Nas nossas favelas, a polícia tucana era escandinava quando comparada à baiana ou a tarcisiana. Mas nossa esquerda banalizou o termo fascista para a opinião pública.
Fascista por fascista, muita gente acredita que os fardados de Derrite são os mesmos.
Ao assumir que errou em relação às câmeras corporais nos uniformes policiais, Tarcísio deu um fiapo de esperança de que ainda pode corrigir seus erros. Na política nacional, isso é raríssimo. Gleisi, Lula e boa parte do PT jamais admitiram as barbeiragens econômicas de Dilma, Mantega et caterva e se empenham em delinear um Dilma-3 no presente momento.
Os tucanos não admitiam que a ordem trazida pelo PCC, sem disputa de territórios, reduziu a violência no estado. Vai que Tarcísio nos surpreende de novo?
(Será muito difícil ver a ministra Anielle Franco ou algum ministro do STF cobrando câmeras corporais para a PM baiana. Sabemos que a segurança dos mais pobres está longe, muito longe, de ser a verdadeira prioridade em pautas partidárias. O pobre baiano é o que mais sofre com a violência em Jequié ou Feira de Santana. Mas ela está muito longe de Caraíva ou Trancoso, ou das disputas políticas de Brasília. O único estado mais violento que a Bahia e onde a polícia mata mais per capita é o Amapá. Tampouco os veteranos senadores Alcolumbre e Randolfe serão incomodados para comentar esse detalhe.)
Levaria para a Cidade do México
Em vez de velas aromáticas, porta-retratos ou outros badulaques, meu amigo secreto investiria em intensivões no exterior. Tirando muitas das nossas autoridades do comodismo de se tentar sempre o mesmo.
Quer embaralhar as fronteiras ideológicas de nossos militantes mais ingênuos? Levaria Derrite, Werner, os chefes de ambos e alguém do governo federal, aquele que jamais teve uma política nacional de segurança a sério, para a Cidade do México. Para fugir dos lugares óbvios.
Sei que a burocracia adora visitar e conhecer boas práticas em Nova York, Paris ou Barcelona, para jamais aplicá-las aqui, mas a capital mexicana nos daria um chacoalhão e tanto. Os cartéis de lá são muito maiores que qualquer facção do crime organizado por aqui, a polícia é corrupta e são vizinhos do maior mercado consumidor de drogas do mundo, os EUA.
Ainda assim, há boas notícias para reflexão. A capital mexicana reduziu a violência à metade em duas décadas. Os grandes cartéis mexicanos operam em estados que são rota para o mercado americano e deixaram a capital menos assediada. E a esquerda que governa a capital mexicana há trinta anos ininterruptos triplicou o efetivo (existe corporação municipal, com poderes de polícia).
De 2000, primeira vez que pisei lá, à semana passada, quando voltei pela décima vez à antiga capital asteca, o choque é tremendo. Gente falando ao celular, numa boa, no lotadíssimo centro histórico —que, de barra pesada, virou um ímã para turistas, gringos e famílias mexicanas de baixa renda que passeiam pela arquitetura preservada dos últimos cinco séculos, gastando no máximo o algodão-doce para as crianças.
Algumas iniciativas locais deveriam ser replicadas aqui. Há anos, a polícia local recebe cursos de meditação e respiração. Para acalmar as forças de segurança, combater a depressão de quem vive sob o estresse nas ruas, para ensinar autocontrole. Querer uma polícia menos violenta também exige mais carinho com os próprios policiais. Jornadas de gestão emocional viraram um termo comum naquela capital que é a mais parecida no mundo a São Paulo, em escala e defeitos.
Em menos de cinco anos, do início da pandemia da covid para cá, estima-se que 100 mil americanos tenham se mudado para a capital mexicana. Expatriados de alta renda, nômades digitais e até californianos que se sentem mais seguros na maior metrópole latino-americana do que em Los Angeles ou San Francisco. Para embaralhar qualquer certeza ideológica e preparar resoluções de ano novo menos óbvias.
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