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Reinaldo Azevedo

Teoria do Design Inteligente em meio à extrema burrice como profissão de fé

Bolsonaro e Aguiar Neto durante encontro em março passado, quando professor ainda liderava entidade de reitores - Marcos Correa/PR
Bolsonaro e Aguiar Neto durante encontro em março passado, quando professor ainda liderava entidade de reitores Imagem: Marcos Correa/PR

Colunista do UOL

28/01/2020 08h12

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Se a gente considerar todo o governo Bolsonaro, incluindo Paulo Guedes, quem tem o currículo acadêmico mais denso é Benedito Guimarães Aguiar Neto, nomeado na sexta presidente da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior). Mas... Vamos ver.

Aguiar Neto é formado em engenharia elétrica pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), fez doutorado na Universidade Técnica de Berlim e pós-doutorado na Universidade de Washington (EUA). É reitor da Universidade Mackenzie desde 2011 e presidiu, entre 2016 e 2019, o Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (Crub).

Enfim, pode-se dizer, alguém na Educação que está preparado para o cargo que ocupa!

Sim, o preparo acadêmico parece inegável. Então qual é o problema?

A depender das escolhas de Aguiar Neto, pode ser gigantesco. Ou pode ser nenhum.

O acadêmico com pós-doutorado é adepto da corrente de pensamento, de inspiração religiosa, chamada "Teoria do Design Inteligente". Trata-se de uma tentativa de emprestar cientificidade ao criacionismo.

Sei... O doutor tem o direito de acreditar no que lhe der na telha, desde que sua crença ou convicção de origem religiosa não afete o seu desempenho à frente de um órgão público.

O que é que está deixando a turma de orelha em pé? Em outubro do ano passado, ainda à frente do Mackenzie, ele conferiu uma palestra e afirmou o seguinte:
"Queremos colocar um contraponto à teoria da evolução e disseminar que a ideia da existência de um design inteligente pode estar presente a partir da educação básica, de uma maneira que podemos, com argumentos científicos, discutir o criacionismo."

Tudo se complicaria muito se o doutor estivesse a falar numa entidade pública.

A Capes lida com recursos públicos e os destina à pesquisa que não depende de um alinhamento religioso prévio para que possa fazer sentido. Ainda que o pesquisador possa ter uma religião, a pesquisa não pode. Porque já existem os religiosos para cuidar dessa área da vida. Nas teocracias, as coisas podem ser diferentes, claro! — e necessariamente piores.

Devemos a um monge que gostava de observar plantinhas o início dos estudos sobre genética. Refiro-me a Mendel! Em vez de ver Deus nas ervilhas — digamos que estivesse, vá lá... —, preferiu usá-las para estabelecer as leis da hereditariedade.

Desconheço afirmação polêmica de Aguiar Neto depois da posse, que se deu na sexta. Que ele quisesse, numa entidade privada, criar um grupo para disseminar a tal "Teoria do Design Inteligente", vá lá... Não pode sonhar remotamente com essa possibilidade quando se trata de dinheiro público. E não consta que tenha dito algo nessa linha.

A piada é irresistível... Quando Aguiar Neto olha à volta no próprio Ministério da Educação, ele não se vê tentado a desconfiar da existência até de Deus? Afinal, um "design inteligente" não produziria aquilo, né?

De resto, sabem como é... Sob certas circunstâncias, tem-se a seleção dos piores. Em especial quando ela é feita por homens, não pela natureza.