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Reinaldo Azevedo

Em "live", Bolsonaro e Onyx chamam tiros contra Cid de "legítima defesa"

Delinquência sem limites: para a dupla de sábios, quando amotinado encapuzado e armado atira, está praticando legítima defesa - reprodução/Youtube
Delinquência sem limites: para a dupla de sábios, quando amotinado encapuzado e armado atira, está praticando legítima defesa Imagem: reprodução/Youtube

Colunista do UOL

21/02/2020 09h50

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Os sinais de inquietude com os rumos do governo Jair Bolsonaro começam a se tornar mais evidentes. Governadores, ministros do Supremo, lideranças parlamentares — todos aqueles que, de algum modo, apostaram que o presidente se adequaria ao padrão da institucionalidade, ainda que mantendo o seu estilo — já jogaram a toalha. Não adiante! O homem não entende o peso do seu cargo. Ocorre que isso pode ganhar contornos perigosos quando os que estão à sua volta, ainda que com mais preparo intelectual ou mais vivência política, resolvem desaprender com o chefe.

O governo federal — e o chefe do dito-cujo é Bolsonaro — assinou um decreto de Garantia da Lei e da Ordem para o Ceará. Isso significa que o Exército fará a segurança das ruas enquanto vigorar o dito-cujo, com o eventual auxílio da Força Nacional de Segurança. É o correto, dado o grau de delinquência a que bandidos disfarçados de soldados conduziram a Polícia Militar no Estado. Nem vou especular se o presidente assinou o troço, vamos dizer, por força do querer. É provável que a tanto tenha sido convencido pelos ministros militares do Planalto e pelo próprio titular da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, que burro não é.

Há movimentação de caráter político-sindical, o que é vedado pela Constituição, em pelos menos dez Estados. Afirmar que as lideranças em favor da greve falam a linguagem do bolsonarismo não é nem preconceito nem juízo de valor. Trata-se apenas de uma constatação. Basta entrar nas redes sociais em que os supostos defensores das PMs se manifestam, e lá está, de modo inequívoco, a marca dos seguidores do "Capitão".

Muito bem! Nesta quinta, o presidente fez uma de suas "lives", com público sempre decrescente. Na primeira metade, o seu parceiro foi o agora ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni. Em seguida, entrou o, como direi?, inefável secretário da Pesca, Jorge Seif Jr. Só vendo para crer.

Uma nota curta sobre esse rapaz para voltar a Onyx. Num dado momento, ele anuncia que vai dar um "beijo hétero" no presidente. E pimba! Lasca o seu ósculo. Conversa vai, conversa vem, depois de a dupla defender que área de reserva ambiental em Angra vire uma nova Cancún, Bolsonaro pergunta a seu secretário beijoqueiro: "Você gosta de comer peixe"? E o rapaz responde, com seu habitual ar inteligente e ferino: "Só sereia". E os dois riem bastante. Bolsonaro o chama de o seu Zero Seis... Seif tem de se cuidar. Todos os que se aproximaram demais de Bolsonaro foram fulminados pelo Zero Dois. Carluxo não vai perdoar o seu irmão postiço, comedor de sereias...

Voltemos a Onyx. O presidente puxa o assunto do Ceará. Diz:
"A imprensa continua... Obrigado, imprensa brasileira, vocês são maravilhosos! Está aqui, ó, Folha e UOL: 'Vereador bolsonarista liderou motim em quartel onde Cid Gomes foi baleado'... O motim lá se deve a um vereador bolsonarista."

Ele se vira, então para Onyx e diz: "Vou te botar em xeque aqui, não fala o nome dele, não. Aquele cara que subiu num trator e foi tentando empurrar o portão lá, com crianças, com mulheres, ele agiu corretamente? Sim ou não?"

E o ministro mergulha na mais abjeta delinquência política e moral:
"É evidente que não, né, presidente!? Aí é uma irresponsabilidade, um desequilíbrio, um ato que colocou em risco a vida de muitas e muitas pessoas. E evidente que, quando tu tem a tua vida em risco, tu tem o direito à legítima defesa".

É espantoso! Exceção feita a Ciro Gomes — e, mesmo assim, nem com muita convicção porque estúpido não é —, não conheço uma só pessoa que defenda a ação de Cid Gomes. Irresponsável e temerária, sim. Absurda! Reconhecê-lo, no entanto, não pode servir de desculpa para justificar a "milicianização" da PM do Ceará.

Notem: Bolsonaro, seus filhos e aliados próximos não emitiram uma única vírgula de censura às ações criminosas dos policiais grevistas do Ceará. Corrijo-me: dos bandidos grevistas, já que policiais não são. Chamar tiros disparados por um fardado, encapuzado e amotinado de "legítima defesa" corresponde a justificar e a apoiar um ato criminoso. Mais do que isso: a fala serve de estímulo a movimentos grevistas em outros Estados.