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Reinaldo Azevedo

É preciso aprovar PECs para desmilitarizar a política já. E com quarentena!

Deputada Perpétua Almeida, que apresenta PEC para começar a disciplinar a bagunça militar na vida pública, e general Eduardo Pazuello, exemplo máximo da bagunça - Reprodução; José Dias/PR
Deputada Perpétua Almeida, que apresenta PEC para começar a disciplinar a bagunça militar na vida pública, e general Eduardo Pazuello, exemplo máximo da bagunça Imagem: Reprodução; José Dias/PR

Colunista do UOL

30/07/2020 08h36

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É chegada a hora de votar também, e com não menos urgência, limites para que militares participem do governo. É preciso pôr fim à farra em curso, com mais de 2.500 cargos de confiança ocupados por quadros da ativa das Forças Armadas. A aberração máxima em curso está no Ministério da Saúde, sob a intervenção do general Eduardo Pazuello, cuja arrogância só é menor do que a incompetência.

A deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC) apresentou uma PEC que acrescenta um Inciso XXIII ao Artigo 37 da Constituição, a saber:

Art. 1º O art. 37 da Constituição passa a vigorar acrescido do seguinte inciso XXIII:
XXIII - O militar da ativa somente poderá exercer cargos de natureza civil na Administração Pública, nos três níveis da Federação, desde que atendidos os seguintes requisitos:
a) se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-se da atividade;
b) se contar mais de dez anos de serviço passará automaticamente, no ato da posse, para a inatividade.

É claro que apoio a proposta. E noto que, no caso, ela trata de "cargos de natureza civil na Administração Pública". Mas há um problema diverso a requerer outra emenda. Também no caso da elegibilidade — DISPUTA DE ELEIÇÕES —, a categoria goza de um privilégio inaceitável.

Leiam o que dispõe o Parágrafo 8º do Artigo 14 da Constituição:
§ 8º O militar alistável é elegível, atendidas as seguintes condições:
I - se contar menos de dez anos de serviço, deverá afastar-se da atividade;
II - se contar mais de dez anos de serviço, será agregado pela autoridade superior e, se eleito, passará automaticamente, no ato da diplomação, para a inatividade.

Vamos ao Inciso I. Tem-se entendido que "afastar-se" quer dizer "desligar-se". Assim, se o militar quer virar político, muito bem, que deixe a função.

Se, no entanto, ele está na função há mais de 10 anos, ora vejam!, será "agregado pela autoridade superior": se for eleito, vai para a reserva? E se não for?

É aí que entra esse "enrolation", o tal "agregado pela autoridade superior". O que significa? O troço está definido no Artigo 80 da Lei 6.880, conhecida como "Estatuto dos Militares".

Diz o texto:
"Agregação é a situação na qual o militar da ativa deixa de ocupar vaga na escala hierárquica de seu Corpo, Quadro, Arma ou Serviço, nela permanecendo sem número."

E o Artigo 81 lista as várias circunstâncias em que isso pode acontecer. Finda a condição transitória da agregação, ele volta a integrar os quadros normalmente.

Entenderam o absurdo? Um militar com mais de 10 anos de carreira pode deixar por algum tempo a função para dar uma ciscada na política. Se for eleito, vai para a reserva. E se não for? Aí ele volta para os quadros da corporação.

Querem risco de politização das Forças Armadas mais evidente?

A mesma Constituição que permite essa excrescência veda, e com correção, a filiação partidária aos militares. Está lá no Inciso V do Parágrafo 3º do Artigo 142 da Constituição:
"V - o militar, enquanto em serviço ativo, não pode estar filiado a partidos políticos"

Assim, o indivíduo militar é o único que pode ser candidato sem ter partido. Ele passa a essa condição quando pede o registro de sua candidatura, depois de convenção partidária.

A República não pode mais conviver com esses despropósitos. Militar que quer exercer cargo político, pela via da eleição ou não, tem de deixar a carreira. Também ela tem seus privilégios como forças regulares do Estado.

Assim, todo apoio à PEC da deputada Perpétua Almeida, que trata do exercício de cargos púbicos. Precisamos de uma outra que mude a questão da elegibilidade.

Ah, sim: as mesmas regras valem para os membros das Polícias Militares.

Mas quero avançar um pouco.

QUARENTENA
E militares? Será que deveriam, igualmente, ser submetidos à quarentena antes de exercer um cargo público, elegível ou de confiança?

Notem que apoio o texto da deputada porque é um avanço. Mas acho que precisamos ser muito mais rigorosos.

O que vejo no Brasil contemporâneo me diz que os oficiais-superiores e os oficiais-generais deveriam, sim, se submeter a uma quarentena. De quanto tempo? Também de oito anos, ainda que já tenham passado para a reserva.

A razão é simples: o proselitismo político, mesmo de quem está na reserva, contamina a tropa. Vejam a frequência com que os generais planaltinos se referem às Forças Armadas como "nós".

"Nós" uma ova! Quem exerce cargo político é político, ainda que tenha sido militar. Ou político que era médico ou jornalista fala em nome das respectivas carreiras que tinham?

EM SUMA
As carreiras de Estado -- militares, juízes, membros do MP -- não podem tomar de assalto a política. O povo brasileiro, composto na sua quase totalidade de pobres e remediados, já é bastante generoso nos privilégios e prerrogativas que garante a essa gente toda.