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Reinaldo Azevedo

STF - Extinga-se antes a monocracia ilegal para, então, questionar a legal!

Pergunta que não quer calar: monocracia boa é a que Luiz Fux pratica, e ruim, a praticada por seus adversários de pensamento? - Marcelo Camargo/Agência Brasil/ND
Pergunta que não quer calar: monocracia boa é a que Luiz Fux pratica, e ruim, a praticada por seus adversários de pensamento? Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil/ND

Colunista do UOL

19/10/2020 07h42

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Já comentei no programa "O É da Coisa" e repito aqui. É claro que não tenho nada contra a que maioria das decisões do STF seja tomada pelo pleno e, se necessário, pelas respectivas turmas. Desde que se trave um debate informado e que aqueles que advogam tal prática o façam por convicção, não por oportunismo. Quem defende a mudança não pode ter em mente a escolha do melhor modelo que garanta a vitória da sua tese. Estão em curso no Supremo algumas alterações no Regimento Interno. Faço aqui considerações que me parecem necessárias.

Em evento a distância promovido pelo site Consultor Jurídico, o ministro Luiz Fux, presidente do STF, pontificou:
"O Supremo do futuro é um Supremo que sobreviverá sempre realizando apenas sessões plenárias. Será uma Corte em que a sua voz será unívoca. Em breve, nós 'desmonocratizaremos' o Supremo Tribunal Federal para que as suas decisões sejam sempre colegiadas, em uma voz uníssona daquilo que a Corte entende sobre as razões e os valores constitucionais".

Perfeitamente. Eu prefiro belas palavras às feias -- ou nem tão belas, mas de bom conteúdo, como "desmonocratizaremos". Desde que elas correspondam aos fatos. O ministro Gilmar Mendes também participou do evento e afirmou o seguinte:
"Vejo muita gente entusiasmada: 'vamos proibir liminar'. A liminar mais longa que conheço no STF é aquela do auxílio-moradia. Por que não vem pro plenário de imediato?".

É claro que estava respondendo ao colega de toga. O agora presidente do Supremo concedeu, em setembro de 2014, liminar estendendo a todos juízes — perto de 18 mil — e a todos os membros do Ministério Público — perto de 13 mil — o auxílio-moradia. Demorou quatro anos para levar a questão ao pleno. Sua liminar custou aos cofres públicos mais de R$ 5 bilhões.

Atenção! Há quatro tipos de ações que tratam do chamado "controle concentrado de constitucionalidade": ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade, ADC (Ação Declaratória de Constitucionalidade), ADO (Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão) e ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental). A Lei 9.868 regula as três primeiras; a 9.882, a última. Todas elas só podem ser votadas pelo pleno.

Em janeiro deste ano, Luiz Fux aproveitou o recesso e concedeu liminar contra o juiz de garantias. E o fez em Ação Direta de Inconstitucionalidade — que só pode ser decidida pelo pleno. Ao migrar para a Presidência, seus casos ficam com aquele que vai para seu lugar na turma: Dias Toffoli. O que fez o doutor? Anunciou que seu voto já estava pronto para que essa ação não migrasse para o colega.

Na Presidência, ele não pautou essa ADI porque é contra o juiz de garantias. Assim, o ministro que diz querer decidir tudo em colegiado; que foi aplaudido por retirar as ações penais das turmas — na verdade, o truque consistiu em tirar a Lava Jato da Segunda Turma —, como vemos, é chegado a uma decisão monocrática. Talvez se possa dizer que sua divisa seja esta: "Decisões monocráticas boas são as minhas; as dos outros são viciosas".

Luiz Roberto Barroso havia feito profissão de fé na decisão colegiada no dia anterior a seu ato monocrático que afastou do mandato o senador do dinheiro na cueca e adjacências. Eu defender o tal Chico Rodrigues (DEM-RR)? Não mesmo! Deixo isso para Bolsonaro. Importam-me procedimentos. A prática, já disse aqui, foi inaugurada em 2016 com o afastamento do então deputado Eduardo Cunha (MDB-RJ), que agora está preso. Qual é o busílis de uma decisão como essa? Não há lei que a ampare. Quando o ato é monocrático, tanto pior.

Há debate no Supremo para mudar o Regimento Interno e, assim, diminuir as decisões monocráticas. Além desses recursos que citei — e há para eles leis já impõem decisões colegiadas, embora não sejam seguidas —, há a Reclamação, o Habeas Corpus e o Mandado de Segurança, que comportam liminares monocráticas. Não é possível simplesmente proibir ministros de tomar decisões individuais.

Melhor fariam alguns membros do STF, a começar do presidente, Luiz Fux, se eles próprios se entendessem primeiro com leis que já existem — ou que não existem — e abrissem mão da MONOCRACIA ILEGAL para, então, questionar a MONOCRACIA LEGAL.