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Reinaldo Azevedo

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

CPI chamou ex-ministro Pazuello, não o general. Exército, fique fora disso!

Pedido de Pazuello ao Comando do Exército para que seu depoimento fosse adiado e e o envio da solicitação à CPI pela Secretaria Geral da Força. Tudo vergonhoso! - Reprodução
Pedido de Pazuello ao Comando do Exército para que seu depoimento fosse adiado e e o envio da solicitação à CPI pela Secretaria Geral da Força. Tudo vergonhoso! Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

05/05/2021 07h15

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Assistiu-se a um episódio vergonhoso nesta terça-feira na CPI da Covid-19: e, creiam, o adiamento do depoimento de Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, não é o mais grave. Já chego ao ponto.

Dadas as circunstâncias, não restava alternativa ao comando da comissão. Os governistas, claro!, queriam que o turista de shopping prestasse um depoimento virtual. Omar Aziz (PSD-AM), o presidente, deixou claro: não contassem com ele para patranhas.

Como sabem, Pazuello alegou que teve contato com dois coronéis infectados pelo vírus, razão por que estava em quarentena. No dia 26 de abril, há nove dias, desfilava todo pimpão, sem máscara, num shopping de Manaus. Indagado sobre a transgressão à ordem legal, respondeu, com evidente cinismo, que não sabia onde comprar a proteção.

Não temos, obviamente, como saber se Pazuello fala ou não a verdade. Ele já contraiu covid-19, mas a reinfecção é possível, especialmente em razão das variantes que andam soltas por aí. Mais: ele pode não contrair a doença de novo, mas carregar o vírus. Em suma, o adiamento era inescapável. Esperto, ele se ofereceu para um depoimento virtual, o que, por óbvio, baixaria a temperatura das coisas.

Não! O general que, com destemor, assumiu a Saúde no dia 16 de maio de 2020, quando os mortos eram 15.662, e deixou a pasta quando se contavam 298.853, em 23 de março deste ano — um crescimento de 1.808% —, não pode ficar com medinho dos senadores, não é mesmo?

É claro que a coisa toda cheira ao temor típico de poltrões. É gente desse naipe que costuma falar em dar golpe... Treme diante de uma CPI, mas acha que pode governar o mundo inteiro. Reitero: a fuga é o de menos. O episódio mais grave está nos dois documentos que chegaram à comissão, com uma verdade neles contida que conta uma mentira. Explico.

MINISTÉRIO DA DEFESA E EXÉRCITO
Um dos documentos foi enviado pela Secretaria Geral do Exército, o que faz com que traga o Brasão da República e a origem: "Ministério da Defesa - Exército Brasileiro". É assinado pelo general de divisão Francisco Humberto Montenegro Junior. Lá está escrito:
"(...) Informo que o general de divisão EDUARDO PAZUELLO, convocado para audiência nesta Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia, encaminhou (...)"

E ficamos sabendo que Pazuello entrou em contato com contaminados, o que o levou a pedir ao comando do Exército (???) que seu depoimento fosse adiado ou feito à distância. Ao comando do Exército? Por quê?

A Secretaria Geral da Força, então, solicita à CPI "providências cabíveis", enviando também o requerimento do ex-ministro.

ERRO
Há um erro grotesco nessa informação. A mentira está numa verdade. Sim, Pazuello é "general de divisão", mas não foi convocado por isso. A CPI quer ouvir o ex-ministro da Saúde, não o militar. Se ele acabou encarnando as duas coisas, o que se tem é só a evidência de uma aberração.

Também Pazuello diz em sua petição:
"Sobre a comunicação deste oficial general, informo-vos..."

Não! A CPI chamou aquele sujeito que, no cargo de ministro, não obedecia às ordens do Exército, mas àquelas dadas pelo presidente da República. Lembram-se? "Um manda, o outro obedece", como disse a Bolsonaro no dia 22 de outubro de 2020 — quando, aliás, estava recolhido ao hotel de passagem do Exército porque com covid-19. Chegou a ser internado.

DESASTRE PARA A REPUTAÇÃO
Eis aí o desastre para a reputação das Forças Armadas. Mais um. Pazuello exerceu um cargo próprio a civis, sem entender absolutamente nada do assunto, e continuou como militar da ativa. Os senadores não querem debater o seu desempenho como general de divisão. A CPI que se instalou no Senado não apura atividades do Exército no cumprimento de sua função. Sim, no caso da compra, produção e distribuição de cloroquina, é preciso que se convoquem os que, com ou sem farda, participaram do embuste. Mas esse é outro assunto.

O que Pazuello faz — e o Ministério da Defesa e o Exército endossam — é colocar a reputação da Força a serviço de um ministro desastrado, procurando usar a farda para se proteger, esteja ou não contaminado. Havendo o risco de estar, que fosse ele próprio a solicitar a providência à CPI, sem a intermediação da Força. Se e quando um general for convocado porque general, isso certamente estará explícito no requerimento.

ENVERGONHOMECTINA
Esses dois documentos demonstram uma vez mais o erro de as Forças Armadas se meterem com política. Se Pazuello diz que pode estar contaminado, é claro que não deve comparecer. Não é preciso que os respectivos timbres do Ministério da Defesa e do Exército do Brasil se associem ao ex-ministro da Saúde.

Senhores oficiais generais das Três Forças, vejam bem o que a politização mesquinha e vulgar está fazendo contra a reputação dos militares.

Nesse caso, sim, há uma droga de ação preventiva: ENVERGONHOMECTINA.

Ela pode livrar os uniformizados de tentações típicas de repúblicas bananeiras, devolvendo-os às funções constitucionais. E estas não incluem governar o país.

De resto, se o adiamento do depoimento chega com a chancela da Defesa e do Exército, tudo o que Pazuello diz e faz também tem essas certificações, incluindo seu passeio no shopping e sua refugada de agora.

As coisas precisam voltar aos eixos. Ora dois generais e um almirante dizem ter se escondido para tomar vacina, ora Pazuello cola a imagem dos militares à do fujão.

Até quando?