Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
As grossas asneiras de Moro sobre privatizações. Mais: A cabra e o demônio
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A ignorância de Sergio Moro sobre quase tudo, incluindo direito, é uma coisa assombrosa. Em 2018, considerava espantoso que pessoas razoavelmente instruídas — não muito, é claro — achassem possível, por exemplo, que Jair Bolsonaro pudesse governar o Brasil, dada a quantidade de asneiras que era capaz de proferir por dia, por hora, por minuto. Sempre padeceu de logorreia alastrante. Com a ajuda de Moro, foi eleito. O resultado está aí.
Agora é a vez de o Bolsonaro que se pretende um pouco mais limpinho — aquele que não esparrama farofa; só destrói institucionalidade — tentar a sorte ou a desdita do Brasil. Refiro-me, claro!, ao morismo e à sua personagem principal. Espantoso, mais uma vez, é que olhem para Moro e digam: "Eis aí um possível presidente da República". As asneiras que disse nesta terça em conversa com empresários no interior de São Paulo seriam de causar piedade não houvesse no discurso o ranço do improviso calculado, da crítica fácil, do falar por falar. Em termos intelectuais propriamente, trata-se mesmo de má-fé. O ex-juiz tenta desesperadamente encontrar um discurso que vá além de sua conhecida sanha policialesca.
Depois de sua inexplicável passagem pela Alvarez & Marsal — alguém é capaz de dizer por que ele ganhou quase R$ 4 milhões em 11 meses de "trabalho"? —, voltou ao Brasil para nos salvar da tal polarização entre a extrema direita e a democracia. Eu não me enganei e quis escrever precisamente isto: Moro é aquela via que não quer o bolsonarismo raiz, mas que rejeita igualmente o caminho democrático. Ou não desfilaria por aí propondo a criação de um tribunal de exceção, para gáudio de fascistoides salta-pocinhas.
O doutor era o candidato de uma nota só: combate à corrupção. Aí ele resolveu diversificar o discurso. Precisava de uma convicção em economia. Huuummm... Por que não o liberalismo de propaganda do século passado? Paulo Guedes, o ministro da Economia, deu com os burros n'água ao estabelecer a parceria com um reacionário ensandecido. Mas o que sabe Moro sobre liberalismo? Nada! Seus conselheiros lhe sopraram às orelhas: "Defenda privatizações. Liberais sempre defendem privatizações." E Moro, obediente, cumpre a determinação. Daquele seu jeito. Com aquela sua destreza. Com a eloquência conhecida.
Falando nesta terça a empresários de São José do Rio Preto, o valente pregou que se passe a Petrobras nos cobres e classificou a empresa de "atrasada". De imediato, pode-se pensar que ele tenha restrições à gestão da empresa, que a considere incompatível com modernas teorias de administração, que não a veja alinhada com a tecnologia da informação... Seria curioso porque a petroleira é, sabidamente, uma gigante de ponta nessas áreas. Mas não! O liberal aprendiz estava pensando em outra coisa e disse algo realmente singular:
"A Petrobras teve papel importante para o país, mas é uma empresa atrasada, que ainda vive da exploração do petróleo, um combustível que o resto do mundo já não está mais usando. Hoje estamos discutindo outras formas de energias limpas, mais ambientalmente corretas".
O atraso da Petrobras, então, está em "ainda" explorar petróleo, é isso mesmo? O resto do mundo já fez a transição para energias limpas, ambientalmente corretas? Definitivamente, este senhor não tem a menor noção do que está falando. Pode-se até achar uma penca de motivos para a privatização, menos esse. Moro é, antes de mais nada, tosco. Se o mundo não usa mais esse "combustível", como ele diz, então a empresa não precisa ser vendida, mas fechada.
Uma coisa é considerar que se caminha para a exploração de energias limpas e que o Brasil precisa pensar numa economia de baixo carbono; outra, muito distinta, é imaginar que a mudança se dará amanhã e que é preciso, então, por isso, vender a Petrobras. Trata-se de uma formidável asneira de mau aluno.
OS BANCOS
O homem quer ser mesmo um liberal exemplar. Vender apenas a Petrobras? Não! Ele também diz que, se eleito, pretende passar nos cobres o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. Mesmo? E o fez nestes termos:
"Cada privatização precisa avaliar o momento, mas meu viés é positivo. O assunto não pode ser um tabu. Outro exemplo são os bancos, a Caixa e o Banco do Brasil. Hoje temos os bancos digitais que deu certo (sic). E estamos presos ao passado. Se for possível privatizar tudo, que se privatize tudo."
Minha Nossa Senhora dos Aflitos! Diga-se de novo: não é sortilégio nenhum propor a privatização dessas duas empresas — O BB é de economia mista, como a Petrobras; a CEF é realmente pública. O desastre está nos argumentos. Mais uma vez, o que se nota é a opinião que acaba de ser redigida no joelho. As duas instituições estão alinhadas com o que há de mais moderno na área digital. O problema não é esse. Moro fala em privatizar o Banco do Brasil sem conhecer, certamente, os vínculos da instituição com o financiamento à agricultura. Por que ele não pergunta ao agronegócio de ponta e aos pequenos e médios agricultores se querem que o Banco do Brasil atue apenas como um banco comercial?
A CEF, então, concentra uma batelada de programas oficiais, alguns de caráter social. A rigor, tem a licença para TAMBÉM atuar como banco, mas seu papel é bem mais amplo e não poderia ser assumido por essas "fintechs" que fazem muito barulho e que Moro, o tabaréu deslumbrado, associa à modernidade.
Espantoso.
VOTO NA CABRA
Moro foi (mal) aconselhado a ser mais agressivo. Embora tenha sido notavelmente truculento e autoritário quando juiz, sua imagem é associada à passividade. Parece meio moleirão e um tanto apalermado. A sua turma quer confronto: "Pegue mais pesado; seja mais incisivo. Precisamos gerar memes para você".
E ele não teve dúvida. Previu uma catástrofe caso haja um segundo turno entre Lula e Bolsonaro e disse algo insólito em caso de segundo turno entre o ex-presidente e o atual:
"Eu votaria em qualquer pessoa que não fosse Lula ou Bolsonaro. Votaria numa cabra se fosse o caso. Mas jamais em um ou outro. Nosso projeto tem melhores chances de vitória".
É mesmo, é? Interessante.
A figura caprina está associada, no bestiário medieval, ao demônio. O pentagrama invertido, empregado pelos satanistas, estiliza a cabeça de um bode. Moro poderia ter dito: "Votaria num cachorro, num gato, no macaco Tião, num jumento..." Mas não! Foi escolher logo a cabra. Na manhã de ontem, esteve com pastores em São José do Rio Preto. Essa intimidade toda com o bode pode levantar alguma desconfiança...
"Que é, Reinaldo? Está dizendo que Moro é satanista?"
Não. Só abobado. Mas, por óbvio, é muito esperto, como sabe a Alvarez & Marsal, que lhe pagou quase R$ 4 milhões por meros 11 meses de trabalho que ninguém sabe o que é.
Moro, entre Bolsonaro, Lula e Baphomet, você votaria em quem?
Votar numa cabra? Moro ainda precisa roubar uma fatia grande do eleitorado de Bolsonaro. Como se vê, pode aderir à mesma linguagem.
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