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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Governo quebra a cara ao tentar tirar nomões do PIB de texto pró-democracia

Para que jamais se esqueça: Ciro Nogueira ajudou a dar o golpe das PECs no Parlamento e é conivente com o discurso propriamente golpista de Bolsonaro, em especial contra o STF, Eis a cara do principal inimigo da democracia e do Supremo hoje, Depois de Bolsonaro, claro! - Marcelo Camargo/Agência Brasil
Para que jamais se esqueça: Ciro Nogueira ajudou a dar o golpe das PECs no Parlamento e é conivente com o discurso propriamente golpista de Bolsonaro, em especial contra o STF, Eis a cara do principal inimigo da democracia e do Supremo hoje, Depois de Bolsonaro, claro! Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Colunista do UOL

26/07/2022 19h47

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A gente tinha a impressão, até outro dia, de que a democracia era um fundamento que só interessava às esquerdas, às ONGs empenhadas na defesa dos direitos humanos e às entidades ligadas ao mundo jurídico, para as quais o estado de direito é precondição do pacto civilizatório. Ainda bem que não é assim. Documento que veio a público nesta terça prova que não. O governo fez uma pressão imensa para que pesos pesados da economia retirassem a sua assinatura. Foi bem-sucedido com quem não interessa à causa e malsucedido com quem interessa. Vale dizer: quebrou a cara ao tentar tirar a assinatura de nomões do PIB.

Vocês sabem quantas vezes cobrei aqui e em toda parte a mobilização da sociedade civil contra o golpismo, fazendo uma convocação especial ao empresariado brasileiro. Afinal, a eles interessa democracia ou ditadura? Essa conversa de que, para os negócios, tanto faz haver um regime democrático ou uma tirania sanguinolenta era mesmo verdade? Não era, não.

Noticiei aqui, no dia 21, que uma carta em defesa do estado de direito será lida no dia 11 de agosto na Faculdade de Direito da USP, sob os auspícios das históricas arcadas da São Francisco. Também publiquei a íntegra. O manifesto antigolpista faz alusão à "Carta aos Brasileiros", lida por Goffredo da Silva Telles Jr. nessa instituição, no dia 8 de agosto de 1977. Há 45 anos, Goffredo vocalizava a voz dos que pediam o fim da ditadura e uma Constituinte; hoje, o manifesto pode ser intitulado "Estado Democrático de Direito Sempre".

Sim, os empresários que interessam e que são contabilizados no PIB que salva o país estão preocupados com a democracia. Mais do que isso: eles a consideram precondição para o crescimento e o desenvolvimento do país. Repudiam, pois, o golpismo e o ataque às garantias individuais e públicas asseguradas pela Constituição de 1988.

O manifesto, que já divulguei aqui no dia 21, tem agora as assinaturas — entre elas, a deste escriba. E está aberto a adesões, neste link, onde também se encontra a íntegra. Os nomes, em ordem alfabética, estão agrupados por categorias, a saber: Ministros Eméritos do STF; Docentes da USP; Docentes de Outras Universidades; Personalidades; Membros da Magistratura; Membros dos Tribunais de Contas; Membros do Ministério Público; Membros da Defensoria Pública; Membros da Advocacia Pública e Privada; Sociedade Civil. Vem ao mundo com 3.069 subscritores. Acessando o documento, você tem acesso à lista de nomes (canto superior direito)

Uma nota: há a distinção entre "Docentes da USP" e de "Outras Universidades" como mais uma homenagem à Carta de 77, lida na São Francisco. Ademais, também este documento começou a ser gestado nas Arcadas. A Carta de 77 encontra-se igualmente disponível.

EMPRESÁRIOS
É evidente que todas as adesões são importantes. Dou destaque ao apoio de empresários e banqueiros porque Bolsonaro gosta de alegar intimidade com o capital, colocando-se como seu escudo de proteção contra os fantasmas comunistas que moram debaixo de sua cama, ao lado do urinol e da garrucha. Não! Poucas pessoas fazem tanto mal, também ao capitalismo brasileiro, como este senhor.

A carta será lida na USP no dia 11 de agosto. Embora conte com adesões importantes do que chamarei genericamente de "capital", não será o único texto oriundo dessa turma que virá a público em defesa do estado de direito e do respeito às urnas. No mesmo dia, entidades empresariais, como Fiesp e Febraban, divulgarão um outro documento com o mesmo teor, mas com acento na importância que a democracia tem para uma economia de mercado comprometida com a justiça social.

Bolsonaro e os golpistas estão mais assanhados do que lambari na sanga. Mas têm de admitir que a batalha do golpe está perdida. Não sei se o outro golpe, o legiferante, arquitetado por Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, e Ciro Nogueira, ministro da Casa Civil, será bem-sucedido, dando a vitória ao atual mandatário. Espero que não. O que não será fácil é desfechar um golpe contra a realização da eleição ou o resultado das urnas, caso este se mostre adverso.

Entre os signatários da carta que foi arquitetada na USP estão pesos-pesados do empresariado, também do mercado financeiro, como João Moreira Salles, Roberto Setúbal, Persio Arida, Horácio Lafer Piva, Luiz Fernando Figueiredo, Armínio Fraga e Guilherme Leal...

Ao ser informado de que banqueiros subscreviam um documento em defesa da democracia, Ciro Nogueira afetou desdém (falso!) e afirmou que eles estão descontentes com o governo Bolsonaro porque o PIX teria diminuído seus lucros. Há duas provas de que Nogueira mente, além da terceira -- que consiste em Nogueira ser Nogueira:
1: se Bolsonaro perder, o PIX continua;
2: com Selic a 13,25% ao ano, que banqueiro leva em conta o PIX? Não há tarifa que concorra com juros nos cornos da Lua.

A verdade é que os palacianos estão desesperados. Temem mesmo é a cadeia porque todos eles sabem o que fizeram contra a democracia e o estado de direito no Verão de 42. Ops! De 22, 21, 20, 19...

O golpe vai perder.

Não deve ser fácil para o governo ter de ler coisas como as que seguem, sendo subscritas por pessoas, grupos e categorias tão diversas:

Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado Democrático de Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.

Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.

Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior: a defesa da ordem democrática.

ENCERRO
O governo deu início a uma forte pressão para que signatários retirassem seus respectivos nomes do documento. Quem cedeu não merecia estar no grupo. Quem merece estar no grupo não cedeu,

Você também pode assinar o documento.

Estado de direito sempre!