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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Mais uma evidência de que comissão de militares é só peça do jogo golpista

Coronel Ricardo Sant"ana, que integra comissão de militares que fiscaliza urnas eletrônicas. Nas redes sociais, vocaliza as teses dos golpistas e faz militância política. Está habilitado para ser fiscal? - Reprodução; Reprodução
Coronel Ricardo Sant'ana, que integra comissão de militares que fiscaliza urnas eletrônicas. Nas redes sociais, vocaliza as teses dos golpistas e faz militância política. Está habilitado para ser fiscal? Imagem: Reprodução; Reprodução

Colunista do UOL

05/08/2022 17h12

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Na minha coluna na Folha desta sexta, afirmo que não há a menor possibilidade de a tal comissão de militares que "fiscaliza" o sistema eletrônico de votação dar o seu "ok". O que Jair Bolsonaro faria depois? A tropa foi montada para rejeitar, não para fiscalizar. As manifestações públicas de Paulo Sérgio Nogueira, ministro da Defesa, o evidenciam à farta. Escrevo lá:

"Digamos que um manto de bom senso se desdobrasse desde o empíreo e cobrisse o Ministério da Defesa, muito especialmente o general Paulo Sérgio Nogueira, seu titular, num evento verdadeiramente maravilhoso, sobrenatural e solene. Pronto! No dia 12 próximo, tudo estaria resolvido. Restaria a Jair Bolsonaro vociferar entre lunáticos, alegando supostas fragilidades no sistema de votação em caso de derrota."

Mais: o "veredito" dos fardados sobre o código-fonte será divulgado a 12 de agosto, um dia depois da leitura dos dois manifestos em defesa da democracia e do estado de direito. Bolsonaro depende da restrição para manter o clima de suspeição e para, em caso de derrota, questionar o resultado. Essa fiscalização é uma patranha de cartas marcadas.

Escrevo ainda:
"Infelizmente, o Ministério da Defesa não está nessa empreitada como garantia suplementar de segurança, mas para fazer a vontade de um candidato a déspota bem pouco esclarecido. Não se dedica, em suma, à inspeção, como prevê a lei, mas ao proselitismo político, como veta a lei."

Minha coluna é uma análise a partir da lógica — ou falta dela — que orienta os atores. Pois bem. O repórter Rodrigo Rangel revela no Metrópoles a atuação nas redes sociais de um dos nove militares escalados pela Defesa para fazer a análise do código-fonte.

Trata-se do coronel de Exército Ricardo Sant'ana. Informa Rangel:
"As publicações do coronel Ricardo Sant'ana seguem a linha do discurso propalado pelo presidente da República e por seus apoiadores. O militar, de 47 anos, formou-se oficial em 1997 e estava lotado até recentemente no Instituto Militar de Engenharia, o IME. Alguns posts compartilhados pelo militar com seus seguidores no Facebook envolvem, inclusive, questionamentos à integridade do próprio sistema de votação adotado pelo TSE. Uma publicação de Sant'ana chegou a ser marcada pela rede social como 'informação falsa'."

Em suas publicações, o coronel "fiscalizador"
- ataca o sistema de votação, acusando-o de ser inseguro;
- passa adiante postagens de bolsonaristas radicais;
- compartilha uma escancarada "fake news", segundo a qual Lula teria roubado um faqueiro que a rainha Elizabeth teria dado a Costa e Silva;
- põe em dúvida as pesquisas eleitorais;
- diz coisas como "votar no PT é exercer o direito de ser idiota";
- comentando um texto em que Simone Tebet afirma que mulheres devem votar em mulheres, escreveu "vaca vota em vaca"...

SÓ MAIS UM?
"Ah, mas ele é um numa comissão de nove..."

Não é um qualquer. Informa a reportagem:
"É ele quem assina, por exemplo, um ofício enviado ao TSE no final de junho no qual o Exército pede uma série de arquivos relacionados às eleições de 2018 e 2014."

Rangel indagou se o Ministério da Defesa tinha ciência da militância do coronel Sant'ana quando o escalou para a comissão. Não teve resposta até agora. O militar também não quis se manifestar e apagou suas postagens na rede, como se isso fosse restaurar a sua isenção de "fiscal".

ENCERRO
Essa fiscalização e o trabalho dessa comissão é só uma etapa da arquitetura golpista. Essa gente macula, mais uma vez, as Forças Armadas, que estão se transformando numa espécie de empreendimento privado de lunáticos, o que é uma agressão a uma instituição permanente do Estado.

Por isso escrevo em minha coluna:
"Tem-se, pois, que a mobilização para proteger o próprio pleito -- que está sob ameaça -- e o cumprimento da vontade do eleitor, qualquer que seja o veredito, nunca foi tão necessária. Bolsonaro vive um momento especialmente alucinado, contaminando outros à sua volta com seus delírios, porque vê amplos setores do empresariado a defender a ordem legal."