Reinaldo Azevedo

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Opinião

Bolsonaro encontra o destino que escolheu; Trump elogia eleições no Brasil

Esta terça não começou nada bem para Jair Bolsonaro. E terminou mal. Até Donald Trump desmoralizou a sua pregação. Eduardo, o ainda deputado brasileiro (PL-SP), ora licenciado, "refugiado" nos EUA para denunciar Alexandre de Moraes, vai ter de dar um pito no presidente americano: "Assim você não me ajuda". E é claro que a quarta não será nada animadora para o ex-presidente, cujo destino não será definido por Moraes, mas por suas próprias escolhas. E não será um bom lugar. E assim será não porque os ministros conspirem contra ele, mas porque ele conspirou contra a democracia.

O que houve de inesperado ou novo na primeira sessão de julgamento da admissibilidade da denúncia contra o ex-presidente e outros sete acusados? Em essência, nada. Todas as preliminares apresentadas pela defesa já tinham sido antes examinadas e rejeitadas pelo tribunal. Há até procedimentos, convenham, um tanto exóticos, não é mesmo? É o caso dos pedidos de impedimento dos ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Flávio Dino.

Ora, se o próprio pleno já havia rejeitado o pleito, com a única exceção de André Mendonça, que integra a Segunda Turma, que sentido fazia submeter de novo a questão à Primeira? Deixa de ser o exercício da ampla defesa para se converter em tática para desgastar o tribunal e alimentar rancores das milícias digitais. Em situações assim, penso que se deixa de fazer a chamada "defesa técnica" e se opta pelo alarido militante. Infelizmente, essas duas esferas têm se misturado de maneira incômoda.

FUX
Luiz Fux resolveu expressar divergência sobre o foro. À diferença de seus colegas, avalia que a questão deveria ser julgada pelo pleno, o que também não é novo. Em dezembro de 2023, ele foi o único a votar contra mudança regimental que restabeleceu a competência das Turmas para processar e julgar ações penais originárias contra os que têm foro no tribunal. O ministro fez uma escolha que me parece imprópria: quando o pleno votou o mérito da questão, não relacionado a um caso específico, ele ficou vencido. Se quer restabelecer a competência do pleno para as ações penais, que proponha, então, nova mudança no Regimento. Ou se vai chutar a bola da colegialidade para o mato?

Pediu-se também a anulação da delação de Mauro Cid. É impróprio fazê-lo como preliminar de um julgamento sobre aceitação de denúncia. Os cinco votaram contra o pedido exótico, mas Fux fez questão de tecer considerações sobre a delação do tenente-coronel, na qual viu problemas em razão de várias correções de rota. Se apontar que dispositivo legal impede que o colaborador altere seu depoimento, faço companhia ao crítico: "Pô, é estranho mesmo". Mas inexiste essa vedação legal. De todo modo, a seu tempo, essa delação passará pelo escrutínio do tribunal. E se for anulada? Anulada estará, e Cid não terá direito aos benefícios que foram negociados. Mas aí vem a questão: seria anulada por quê? Que delatores estejam sempre com um olho no gato e outro no peixe, bem, isso é do jogo.

GONET
O resto seguiu a rotina esperada. Paulo Gonet, o procurador-geral, fez uma síntese devastadora dos eventos. Os defensores, aliás, não negaram a existência dos crimes -- como fazê-lo? Preferiram destacar que seus respectivos clientes eram inocentes. José Luís de Oliveira Lima, advogado do general Braga Netto, destacou-se num particular: houve por bem se solidarizar com os ministros em razão do 8 de janeiro, especialmente com Alexandre de Moraes. Afirmou:
"Esta defesa não ficará em silêncio diante dos ataques veementes, criminosos, feitos contra esta Corte e contra todos os integrantes do Supremo Tribunal Federal. Quero dizer a vossa excelência, eminente ministro Zanin, que eu vi na televisão, assustado, os atos de 8 de janeiro 2023. E qualquer advogado e qualquer cidadão precisam deixar claro isso quando tiver a oportunidade de falar, principalmente nesta casa. Eu registro aqui, em nome desta defesa, a solidariedade de acordo a solidariedade à Corte, a solidariedade a todos os ministros desta Corte, especialmente ao eminente relator, por quem eu tenho longo e longo respeito".

A fala está, em si, correta. Os atos foram criminosos. E acerta também quando afirma que o ataque se deu contra todos os ministros da Corte. Como se vê, não se cuida de falar em "parte interessada" para tentar excluir um magistrado do julgamento no caso de este sofrer ameaças, não é? Afinal, "partes interessadas" no caso da intentona malsucedida de 2022/2023, como deixa claro o doutor, são todos os integrantes do tribunal. E acho que não ocorre a ninguém dizer que inexiste no país um STF à altura de Bolsonaro...

BOLSONARO PRESENTE
Noticiou-se como fato inesperado a presença de Bolsonaro no tribunal, como se estivesse lá, como sugeriam alguns, para encarar os ministros e o procurador-geral da República. Fosse uma tática, não estaria entre as mais bem-sucedidas da história, certo? Até parece que esse tribunal não enfrentou pressões piores...

Mas, note-se, o "Mito" não estava lá em vão. De dentro do tribunal, publicava mensagens nas redes sociais desmerecendo o tribunal, tratando de forma demeritória o julgamento e difamando o trabalho do relator. Apelou até ao jogo entre Brasil e Argentina, que se deu na noite de ontem. Escreveu:
"Brasil e Argentina em campo hoje às 21h no Monumental de Núñez. Vamos torcer pelos nossos garotos voltarem com a vitória. Já no meu caso, o juiz apita contra antes mesmo do jogo começar... e ainda é o VAR, o bandeirinha, o técnico e o artilheiro do time adversário; tudo numa pessoa só".

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Bolsonaro é, efetivamente, um seca-pimenteira. Também institucional.

ARRUAÇA
Na noite anterior, no podcast "Inteligência Ltda.", na presença de Tarcísio e na companhia remota de Eduardo Bolsonaro, já havia acusado um conluio entre o TSE, o governo Biden -- por intermédio da Usaid --, e o governo chinês para lhe roubar a eleição. Eduardo acha que os chineses mobilizaram Moraes e Gonet para retirá-lo da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara. Ele se chateou e foi morar nos EUA. Na conversa, disse que o pai já está condenado e pregou, ainda que de maneira oblíqua, que não se aceite a decisão do tribunal, se ela for adversa, e que se hostilizem os que não comungam de sua cartilha.

Bolsonaro contratou um medalhão para a sua defesa técnica, Celso Villardi, mas não abre mão da arruaça. Como inexiste modo de arruaceiros aprenderem com advogados, resta torcer para que advogados não comecem a receber lições de arruaceiros.

TRUMP PARA ENCERRAR
Donald Trump, o líder-modelo da família Bolsonaro -- inclusive quando o americano agride os interesses do nosso país -- e suposto chapa de Eduardo, assinou uma ordem executiva ontem que "fortalece a verificação da cidadania dos eleitores e proíbe cidadãos estrangeiros de interferirem nas eleições dos EUA". Ainda que possa não estar de olho em coisas muito boas, convenham: é um absurdo que a nação mais rica da Terra não tenha um cadastro unificado de eleitores. Olhem a falta que faz naquele país, e está provado de novo, uma Justiça Eleitoral.

O trecho da decisão está aqui. Sabem que país é elogiado por fazer eleições seguras em razão, por exemplo, da biometria? Sim, o Brasil. Já se lê:
"Apesar do autogoverno pioneiro, os Estados Unidos agora falham em impor proteções eleitorais básicas e necessárias empregadas por nações modernas e desenvolvidas, bem como aquelas ainda em desenvolvimento. Índia e Brasil, por exemplo, estão vinculando a identificação do eleitor a um banco de dados biométrico, enquanto os Estados Unidos dependem amplamente da autocertificação para cidadania."

Sim, também se exalta o voto em papel em alguns países e se fala da necessidade de limitar o escrutínio pelo correio... Que façam lá a escolha deles.

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E pensar que a desconfiança sobre o sistema eleitoral brasileiro — que até Trump vê como exemplar — foi o pretexto usado pelos conspiradores para tentar dar um golpe.

Falharam. E vão para a cadeia. Tivessem triunfado, iríamos nós.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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