Reinaldo Azevedo

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Opinião

Direita na Paulista: ameaça, conspiração e militares incitados contra civis

O ato na Paulista contra o Supremo, contra as instituições e em favor do golpismo, comandado por Jair Bolsonaro e por Tarcísio de Freitas e coadjuvado por outros governadores, não foi, já demonstrei, um sucesso. Dadas as medições de Datafolha e de um tal Monitor da Opinião Pública, abrigado na USP, havia menos gente em São Paulo do que no Rio quando se levam em contas as respectivas populações dos dois estados. O dito "evento de massa", por si, "flopou" de novo, mais agora do que antes. Importante, aí sim, é analisar o estado das direitas no Brasil porque é claro que isso tem desdobramentos em 2026. No evento de ontem, houve de tudo: acusação de que o Judiciário definiu o resultado da eleição de 2022, que teria sido, então, um "golpe" dado pelo próprio Supremo, ameaças caso o tribunal não faça a vontade daqueles que ali estavam e incitação da animosidade das Forças Armadas contra os Poderes constituídos.

Ficou evidente que inexiste alternativa de direita fora do campo bolsonarista, razão por que o inelegível e futuro condenado por tentativa de golpe de Estado, entre outros crimes, impõe a sua agenda. Na quinta, Ronaldo Caiado (União Brasil), governador de Goiás, por exemplo, lançou sua pré-candidatura na Bahia e pregou a harmonia entre os Poderes. Três dias depois, estava no palanque em que se demonizou o STF à larga. Um ministro foi, na prática, chamado de "bandido"; outro, de "covarde". Bolsonaro, por sua vez, sustentou que foi ele o golpeado em 2022 por interferência do TSE. Ele ainda não reconheceu o resultado daquela eleição.

Além de Tarcísio e Caiado, compareceram a essa nova modalidade de "Festa da Selma" dois outros governadores que se colocam como pré-presidenciáveis ou se oferecerem para o jogo ao menos: o do Paraná, Ratinho Jr. (PSD), e o de Minas, Romeu Zema (Novo). A eles se juntaram o de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL); o de Mato Grosso, Mauro Mendes (União), e o do Amazonas, Wilson Lima (União), onde faltou oxigênio durante a pandemia. Como esquecer aquele vídeo histórico em que Bolsonaro ironiza um doente de covid sufocado? Lima já se esqueceu. Ah... Havia um outro nome testado nas pesquisas: Michelle, a mulher do chefe da organização criminosa, segundo a PGR.

Inexistem, até agora, nomes da direita para disputar a Presidência fora desse grupo. E, pois, aí está o campo que deve rivalizar com Lula em 2026. Três, dois, um para que algum sábio, tenho até candidato para isso, diga que o petista está mais feliz do que nunca com o que se viu neste domingo porque também ele investe na chamada "polarização"... Como se pudesse ser responsabilizado ou pelas sandices daquele a quem chamam "Mito" ou pela inexistência no país de uma direita que abrace a democracia e não flerte com golpistas.

Vejam o estado miserável a que Bolsonaro reduziu os ditos "conservadores". Não que os valentes pudessem fazer algo muito distinto do que se vê caso agissem por conta própria. Sim, claro!, só em países livres existem protestos de rua sem repressão do Estado. Mas é uma tolice supina sustentar que toda manifestação concorre para o aprimoramento da própria democracia. Os vários fascismos europeus do século passado gostavam nas ruas.

O ato deste domingo busca emparedar o Supremo, de modo a lhe tirar a autonomia para julgar. Como as palavras fazem sentido, é claro que há um tom de ameaça nesta fala de Silas Malafaia:
"Senhores ministros, o povo é o supremo poder. Não brinquem com um povo pacífico. Não brinquem com um povo pacífico. A medida do povo brasileiro está se enchendo de tanta covardia, maldade e injustiça. Se os senhores pensam que vão prender Bolsonaro... [PAUSA LONGA] Eu sou de paz. Sou aguerrido na fala, mas eu sou de paz. Olhem aonde os senhores vão querer levar o Brasil (...) Se os senhores prenderem Bolsonaro, o que é que pode acontecer no Brasil? Pode não acontecer nada, mas pode acontecer tudo."

Ninguém precisa ser especialista em interpretação. Quem assistir ao vídeo vai perceber que também a pausa embutiu uma advertência aos juízes, como a dizer: "Não ousem condenar; não ousem prender!". Dirá alguém: "Isso é coisa do pastor, não de Bolsonaro ou dos governadores". Nada disso! Todos os presentes coonestavam a ameaça. Ninguém desce aos infernos por conta própria se não está disposto a dançar com o capeta.

Definitivamente não me preocupa a manifestação por si. Os "milhões" não aparecerem para socorrer Bolsonaro. Os senhores governadores, chefes de Executivos estaduais eleitos pelo mesmo sistema que levou Lula à Presidência, endossavam com a sua presença teorias conspiratórias sobre a eleição de 2022 e a penca de impropérios contra o Supremo, especialmente contra Moraes.

Num dado momento, ao defender Braga Netto, ex-ministro da Defesa, ex-chefe da Casa Civil e vice na chapa de Bolsonaro, afirmou o pastor:
"Eu não posso esquecer de falar: general Braga Netto. Sabe por que ele está preso? Porque Alexandre Moraes diz que ele estava tentando obstruir o processo. Um general condecorado no exterior, com ficha limpa. Ah, eu não vou me calar aqui, não. Cadê esses generais de quatro estrelas do Alto-Comando do Exército? Cambada de frouxos, cambada de covardes, cambada de omissos! Vocês não honram a farda que vestem. Não é para dar golpe, não. É para marcar posição".

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Como é que os generais do Alto-Comando "marcariam posição" sem ameaçar o Supremo? Se isso não é incitar a animosidade das Forças Armadas contra os Poderes constituídos, as definições desse crime, então, foram atualizadas.

A isso tudo os senhores governadores assistiram impávidos. É bom que vocês saibam: Bolsonaro será condenado e preso. E isso só não vai acontecer se ele fugir ou se houver um golpe de estado.

Quem flerta com um golpe flerta com todos. Quem coonesta a ameaça e a incitação da sublevação militar contra o Judiciário está investindo na desordem. Eis aí a extrema direita a dizer: "Ou vocês ficam conosco ou ficam com a democracia, com a Constituição e com as instituições".

É claro que há moderados no Brasil. Sabemos onde se encontram. E, por óbvio, não estavam no palanque da Paulista.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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