Reinaldo Azevedo

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Opinião

Motta e Mesa agem contra a porra-louquice e querem Gilvan da Federal punido

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e a Mesa decidiram pôr um pouco de ordem no caos que a extrema direita promove na Casa. Há muito se perdeu qualquer noção de limite, e o Código de Ética que deve reger a atividade parlamentar não é nem mesmo uma vaga lembrança. No ritmo em que as coisas se desenvolvem, ou involuem, o destino é o desastre. E, se querem saber, não se está muito longe de um evento que pode mesmo ser trágico. E não exagero.

O Conselho de Ética analisa nesta terça uma representação liderada pelo próprio Motta que pede a suspensão por seis meses do deputado Gilvan da Federal (PL-ES) em razão de ofensas dirigidas à ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT-PR), que é deputada licenciada. No dia 29 de abril, em sessão da Comissão de Segurança Pública, na presença do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, Gilvan chamou a ministra de "prostituta".

A suspensão do mandato por seis meses só é menos grave do que a cassação. O deputado agora alvo de representação é o mesmo que, no dia 8 do mês passado, afirmou desejar que Lula morra. Disse então: "Quero que ele vá para o quinto dos infernos, é um direito meu. Não quer dizer que vou matar o cara. Mas eu quero que ele morra, que vá para o quinto dos infernos. Porque nem o diabo quer o Lula. Por isso que ele tá aí, superou um câncer. Tomara que tenha um ataque cardíaco". No dia seguinte, dizendo-se "cristão", admitiu — ou fingiu admitir — que havia se excedido: "Reconheço que exagerei na minha fala".

As contrições de Gilvan são breves. Na terça passada, afirmou:
"Na época em que esse ex-presidiário [o presidente Lula] foi preso, eu estava na Polícia Federal, e chovia (sic) ataques à PF pelo pessoal do PT. Por exemplo, da senadora Gleisi Hoffmann. Hoje, elogiam a PF porque temos um diretor-geral petista. Na Odebrecht, existia uma planilha de pagamento de propina a políticos. Eu citei aqui o nome Lindinho e Amante, que devia ser uma prostituta do caramba. Teve até deputado que se revoltou. Ou seja, a carapuça serviu."

Para registro: Gleisi e Paulo Bernardo — seu ex-marido, que também foi deputado e ministro — foram absolvidos pelo STF em 2018. Outas denúncias referentes à Lava Jato foram arquivadas. Os interessados podem fazer uma pesquisa, apelando a fontes confiáveis, para obter detalhes. Prestem, no entanto, atenção a um aspecto: qualquer que fosse a situação jurídica da ministra, os termos de Gilvan são inaceitáveis e violam o Código de Ética.

Afirma a representação da Mesa da Câmara, encabeçada por Motta, que Gilvan praticou "condutas incompatíveis com o decoro parlamentar", com "manifestações gravemente ofensivas e difamatórias contra deputada licenciada para ocupar cargo de ministra de Estado, em evidente abuso das prerrogativas parlamentares, o que configura comportamento incompatível com a dignidade do mandato". O relator do caso é o deputado Ricardo Maia (MDB-BA), que escreveu ainda: "Trata-se de medida legítima, proporcional e necessária, que visa preservar a dignidade da representação parlamentar e zelar pela integridade da instituição legislativa perante o povo brasileiro".

Assinam também a representação o primeiro vice-presidente da Câmara, Altineu Côrtes (PL-RJ); o segundo vice, Elmar Nascimento (União-BA); o primeiro-secretário, Carlos Veras (PT-PE); o segundo secretário, Lula da Fonte (PP-PE), a terceira secretária, Delegada Katarina (PSD-SE), e quarto secretário, Sergio Souza (MDB-PR). Mesmo que aprovada no Conselho de Ética, a suspensão precisa do endosso da maioria absoluta da Casa: 257 votos.

FREIO DE ARRUMAÇÃO
Se Motta não meter o pé no freio de arrumação, há, sim, o risco de descontrole. Ora, depois de o deputado Gustavo Gayer (PL-GO) ter comparado a ministra a uma "garota de programa" -- sugerindo que ela, o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), seu marido, e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP) formam um trisal --, Gilvan achou que poderia dar mais um passo. Há uma espécie de disputa na lama para saber quem diz a coisa mais asquerosa.

Até onde eles podem chegar? Temos visto que a baixaria de hoje é sempre superior à da véspera e inferior à de amanhã, numa escalada da indignidade. O bruto pode ter pensado: "Ora, se, até agora, não aconteceu nada com Gayer, por que não testar um novo limite?"

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Define o Código de Ética da Casa no Artigo 4º:
Art. 4º Constituem procedimentos incompatíveis com o decoro parlamentar, puníveis com a perda do mandato:
I - abusar das prerrogativas constitucionais asseguradas aos membros do Congresso Nacional (Constituição Federal, art. 55, § 1º);

Estabelece o Artigo 5º:
Art. 5º Atentam, ainda, contra o decoro parlamentar as seguintes condutas, puníveis na forma deste Código:
III - praticar ofensas físicas ou morais nas dependências da Câmara dos Deputados ou desacatar, por atos ou palavras, outro parlamentar, a Mesa ou comissão, ou os respectivos Presidentes;

CAMINHANDO PARA O ENCERRAMENTO
No sábado, o deputado Rogério Correia (PT-MG) encaminhou à Mesa da Casa um pedido de ação de busca e apreensão contra o também deputado Delegado Caveira (PL-PA). Na semana passada, este senhor posou para fotos em seu gabinete segurando uma pistola de calibre .40 ao lado do vereador Zezinho Lima (PL-PA), que segurava um fuzil de 5.56 mm.

Lembra Correia:
"O ingresso de armas nas dependências da Câmara, especialmente armas de guerra, está condicionado ao acautelamento prévio das armas junto ao Departamento de Polícia Legislativa, nos termos do artigo 2º do Ato da Mesa nº 103/2019, tampouco há notícia de autorização excepcional concedida pela autoridade competente".

Sim, é o que diz uma das normas de funcionamento da Casa. Até porque ninguém precisa ser um sabichão para concluir que o tal Caveira e seu parceiro de armamento não estavam, nas dependências do Parlamento brasileiro, a intimidar bandidos. Quem posa com armas naquele local está querendo intimidar adversários políticos, o que é absolutamente inaceitável.

Ou esse tipo de delinquência é contida, com a devida responsabilização daqueles que a promovem, ou o Parlamento Brasileiro assumirá as feições de milícia ou máfia.

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O Congresso Nacional tem de ter a coragem de aplicar as regras de funcionamento que ele próprio votou. Enquanto é tempo.

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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