Confissão de Bolsonaro sobre grana a Eduardo pede sua prisão preventiva já

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Não estou aqui a evocar o testemunho de ninguém, tampouco de Celso Vilardi, advogado de Jair Bolsonaro. Se eu poderia eventualmente, falo por hipótese, invejá-lo nos transes da remuneração — adaptando Bocage —, não tenho como fazer o mesmo nos transes da ventura. Deve ser muito difícil advogar para um hipossuficiente, digamos, moral. Sem contar as suas burrices táticas e estratégicas.
O cara está de tal sorte acostumado a fazer o que lhe dava na telha — na certeza estúpida que alimenta sobre a própria sapiência e sobre o devido processo legal — que sai por aí a falar pelos cotovelos. O defensor do ex-presidente sabe que conta agora apenas com a eventual boa vontade de Alexandre de Moraes para que seu constituído não tenha a prisão preventiva decretada — coisa que eu faria antes que o galo desse o terceiro canto.
No dia mesmo em que Bolsonaro concedeu entrevista ao UOL, observei que havia confessado um crime ao dizer que financiava a aventura americana de Eduardo, o filho. Falou assim, de rompante, como quem conta uma valentia, como quem bate no peito a arrotar grandeza. E também ele, a exemplo do próprio, não escondeu que o filho estava alhures para cavar punições ao Judiciário brasileiro — o que, acovardado, negou ontem —, buscando intimidar os juízes e interferir na instrução criminal.
Permitam-me um clichê, de que fujo como o diabo da Cruz (alerta de ironia), mas o uso do cachimbo acaba por entortar a boca. O dito "Mito" estava tão habituado a violar a lei; a fazer discurso golpista em porta de quartel; a ameaçar o Supremo em comício de 7 de Setembro; a tramar em reunião ministerial o empastelamento das eleições, que não viu mal nenhum em contar no UOL: "Eu pago as contas de Eduardo nos EUA".
Ocorre que o cara é investigado por prática de crimes — não tenho dúvida de que os cometeu e de que os comete ainda agora. Ele mesmo diz que seu objetivo naquele país é cavar punições para Moraes. Como seu senso de limite é muito estreito, chegou a dizer nas redes que o Judiciário e o Ministério Público são suspeitos para cuidar de qualquer coisa que lhe diga respeito. Mais: faz praça de sua suposta desenvoltura junto ao governo Trump para punir autoridades no Brasil.
Como os dias andam meio atrapalhados por aqui — e até alguns "clowns" racistas, misóginos, homofóbicos (acrescentem aí toda sorte de abjeção) se tornam heróis da liberdade de expressão para os idiotas —, os Bolsonaros contam hoje com um valente time de colunistas na outrora chamada "grande imprensa". Só não consegui identificar até agora o prêmio pago. Certamente não é o triunfo do estado de direito. Algum haverá. E não deve ser a satisfação intelectual de dividir bibliografia com a família... Mas sigamos.
O tal "Mito" deve ter achado que contava uma bravura na entrevista ao UOL. Não! Ele estava confessando, quando menos, a conivência com o crime. Como Eduardo não esconde que seu objetivo é intimidar e punir juízes no Brasil, trata-se evidente coação no curso do processo e de tentativa de interferência na instrução criminal. Em nome de quem age Eduardo?
Pois bem: o fanfarrão fez a besteira de contar, achando que propagandeava uma grandeza, que sustentava Eduardo fora do país. Como, apropriadamente, se abriu um inquérito para investigar as ações do rapaz e como um de seus declarados objetivos é beneficiar o pai, faltava que se tivesse a prova material — acima de qualquer dúvida razoável — de que atuava em parceria com alguém que é réu na ação penal sobre a tentativa de golpe.
Não há mais dúvida razoável ou irrazoável. Bolsonaro teve de confessar à Polícia Federal: sim, ele é o braço financeiro das aventuras do filhote contra o Judiciário. E não é pouco dinheiro. O sujeito que mendiga Pix revelou — e talvez tenha suposto que os investigadores já o soubessem — que enviou ao rebento a bagatela de R$ 2 milhões. Para que mesmo? Confessadamente, o cara está lá desde o fim de fevereiro para intimidar o Judiciário. O beneficiário direto de sua ação criminosa, se bem-sucedida, é seu financiador: o pai.
Ocorre que esse pai é réu no tribunal que é alvo das ações do filho.
Transcrevo o Artigo 312 do Código de Processo Penal:
"Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.
§ 1º A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares.
§ 2º A decisão que decretar a prisão preventiva deve ser motivada e fundamentada em receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada."
Essa gente foi longe demais. É preciso decretar a prisão preventiva de Bolsonaro. Ele confessou que atua abertamente contra a ordem pública — ao financiar quem promove coação no curso de processo — e representa uma ameaça à instrução crimina. Afinal, é a fonte pagadora não de quem apenas ameaça uma testemunha ou põe em risco a integridade das provas, o que já seria de extrema gravidade, mas de quem tem a ousadia de ameaçar o Supremo Tribunal Federal e o Ministério Público.
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