Rodrigo Ratier

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Opinião

Tímido, plano de educação de Boulos é quase igual ao de Nunes

O programa de educação de Guilherme Boulos (PSOL) é muito parecido com o de Ricardo Nunes (MDB) ou o programa de educação de Ricardo Nunes é semelhante ao de Guilherme Boulos? Nesse caso, a ordem dos fatores altera o produto.

Educação é um tema com larga tradição na esquerda, cujos valores clássicos pressupõem uma transformação da sociedade. Ao passo que a direita conservadora quer... bem, conservar o que está aí. Que o plano do oposicionista seja tímido e pouco distinguível das propostas do incumbente é sintomático do estado atual das candidaturas progressistas.

Nunes tem como principal bandeira a fila zerada para as creches - na realidade, uma conquista da gestão Bruno Covas, em dezembro de 2020.

A lista de propostas é uma tediosa aula de continuísmo: "manteremos" a vaga garantida nas creches, "continuaremos" melhorando o ensino público, "ampliaremos" o ensino integral, "continuidade" da formação continuada, "manteremos" investimentos em modernização, "seguiremos trabalhando" para incluir alunos com deficiência, "construir mais" Centros Educacionais Unificados (CEUs) e "consolidá-los" como espaço de convivência.

Faria algum sentido se a rede estivesse rodando bem. Não é o caso, a julgar pelos resultados no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). Nos anos iniciais, a cidade não apenas não atingiu a meta para 2023 como piorou em relação a 2021 —ano que, por sua vez, foi pior do que 2019. Nunes segue atribuindo a queda à pandemia.

Diante disso, o que propõe Boulos? Construir mais CEUs —igual a Nunes; transformar escolas em espaços de convivência —semelhante ao projeto de Nunes para os CEUs; investir na formação continuada —igual a Nunes; implantar ensino integral em todas as escolas —-o mesmo que Nunes, com mais alcance, mas sem indicar como vai universalizar o serviço.

As especificidades são vagas: "psicólogos em todas as escolas". Qual a proposta de trabalho? A simples presença não resolve a "evasão" ou "problemas de saúde mental", como diz o programa. É preciso uma política articulada de escuta, acolhimento e encaminhamento.

A "valorização dos educadores" também está mal explicada: qual a política de aumento salarial? Será para todos ou atrelada ao desempenho dos alunos? Idem para a "melhoria e modernização" dos Centros de Educação Infantil. "Vamos oferecer um ambiente seguro, estimulante e acolhedor", diz o programa. Sobram adjetivos, falta detalhamento concreto.

Das bandeiras tradicionais da esquerda, só sobrou o fim do analfabetismo. É um avanço em relação a outros planos, que basicamente esperam que os analfabetos (hoje em dia, pessoas mais idosas e longe da escola) apenas morram para melhorar os índices. Boulos propõe ação concreta, ainda que, novamente, a menção a um "grande mutirão" soe etérea.

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É pouco, e não é por falta de gente preparada para planejar sobre o tema. Tanto PT quanto PSOL têm quadros bem formados para uma discussão qualificada, que passe pelos temas que realmente importam: currículo (o que ensinar); metodologias de ensino (como ensinar); alternativas pedagógicas para combater indisciplina e violência (elas existem); gestão democrática (o programa traz uma única menção —sem qualquer aprofundamento, como faz Nunes); a finalidade da educação na sociedade; os princípios e valores, enfim, que guiam uma educação pautada pela transformação social. E as estratégias concretas para chegar lá.

Sobre as pautas catapultadas pela extrema direita para gerar pânico moral —educação sexual e de gênero, liberdade de cátedra, demonização dos professores, escolas cívico militares —, silêncio total. É verdade que são assuntos laterais e explorados de forma caricatural. Mas uma postura firme sobre os temas ajudaria a repor as coisas em seu devido lugar.

Sendo mais abrangente, pode-se buscar no plano de governo termos classicamente associados à esquerda. "Igualdade" aparece cinco vezes em seu antônimo (desigualdade), e uma na recriação da secretaria de igualdade social. É verdade que Boulos apresenta o valor como a motivação central da candidatura: "Quero ser prefeito porque acredito que é possível unir a todos para enfrentar o maior problema da nossa cidade: a desigualdade social". "Coletivo" surge apenas como adjetivo (coletivo de cultura, de natureza esportiva, negociação ou transporte coletivo). "Cooperação", com três menções, não desce do nível da abstração (idem para "justiça", com sete menções). "Solidariedade" vem como adjetivo - "solidária" -, acompanhando os projetos de cozinha e economia solidária, e não como valor.

Na tentativa de suavizar sua imagem, Boulos mira em um programa pouco polêmico, mas acaba gerando um plano sem vibração, sem vida. Como resultado, a exploração de diferenças em relação a Nunes acaba se centrando no periférico: quem é melhor gestor, quem tem a ficha mais limpa etc. Não é uma exceção entre os progressistas. A transformação do PT em máquina eleitoral ao longo dos anos 2000 envolveu a diluição da identidade que forjou o partido a ponto de quase descaracterizá-lo.

A ideia, como se sabe, é afastar a imagem de "invasor". Talvez caiba perguntar: para quê? A ocupação coletiva de prédios e terrenos que não cumprem função social poderia ser um traço exaltado de uma biografia. A este ponto da campanha, Boulos assumiu em parte essa perspectiva, dizendo ter orgulho de ter ajudado dezenas de milhares de pessoas a conquistar moradia.

No terreno da educação, porém, ainda prevalece o temor. Trata-se de uma área central para a promessa de "um outro mundo possível", que costumeiramente foi o terreno da esquerda. São tempos estranhos em que cabe à direita vender sonhos —ainda que violentos, hiperindividualizados, baseados em consumo e no pressuposto da desigualdade. O segundo turno da eleição paulistana é, sim, uma disputa entre esquerda e direita. Mas um dos lados anda com vergonha de dizer seu nome.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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