Justiça faz leva de condenações de empresas por assédio pró-Bolsonaro
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Levantamento feito pela coluna revela que ao menos 10 empresas foram condenadas somente neste ano pela Justiça do Trabalho, em vários estados do país, por assédio eleitoral contra seus funcionários na disputa presidencial de 2022.
Em todas as ações, as empresas pressionaram seus funcionários, de algum modo, para que votassem no então presidente Jair Bolsonaro (PL), que disputava a reeleição contra Lula (PT).
Há casos em que funcionários foram obrigados a vestir uma camiseta amarela com o número de campanha de Bolsonaro, ameaças de demissões e até mesmo promessa de folga em caso de vitória bolsonarista.
A Stara Indústria de Implementos Agrícolas, por exemplo, foi condenada em segunda instância pela Justiça do Trabalho do Rio Grande do Sul a pagar uma indenização de R$ 30 mil a uma funcionária que relatou à Justiça ter sofrido coação eleitoral por parte da empresa.
De acordo com a ação, a Stara divulgou que, se Bolsonaro não vencesse o segundo turno, cortaria 30% do seu orçamento, em uma clara ameaça de realizar demissões.
"O empregador tinha a intenção deliberada de interferir no voto de seus empregados, que, em razão da subordinação hierárquica e da dependência financeira em relação à empresa, estavam vulneráveis à pressão para atender exclusivamente aos seus interesses ideológicos", afirmou na decisão o desembargador Marçal Figueiredo.
A empresa, que ainda pode recorrer, disse que apenas exerceu sua liberdade de expressão e que em nenhum momento houve ameaças ou pressão política sobre os funcionários. Afirmou que o comunicado sobre a possibilidade de cortes orçamentários era dirigido aos fornecedores, "sendo uma prática empresarial comum, baseada em projeções de mercado".
Funcionária obrigada a assistir a vídeos de Bolsonaro
Em Nilópolis, no Rio de Janeiro, a Justiça do Trabalho condenou a JMR Manutenção e Comércio a pagar R$ 10 mil a uma funcionária que foi obrigada a assistir vídeos com propaganda em favor de Bolsonaro, além de sofrer ameaças de demissão em caso de vitória do PT.
"Tal conduta extrapola o poder do empregador, representando verdadeiro abuso de direito", declarou na sentença o juiz Fernando Abreu.
A empresa, que ainda pode recorrer, disse que não houve assédio e que a funcionária não foi vítima de qualquer conduta abusiva.
Camisas da seleção com o número 22 nas costas
Em Pinhais, no Paraná, de acordo a Justiça, a LGK Transporte de Cargas obrigou seus funcionários a utilizarem camisetas amarelas com o número 22 [da campanha de Bolsonaro] numa ocasião em houve jogo da Seleção Brasileira de futebol.
A empresa disse à Justiça que o autor do processo não foi obrigado a pegar a camiseta e que não houve qualquer tipo de coação, mas a desembargadora Cláudia Pereira a condenou a pagar uma indenização de R$ 10 mil ao funcionário.
"Constitui ato ilícito toda conduta que se destine a interferir de forma indevida no exercício legítimo do direito de escolha de representantes durante o processo eleitoral, pois resulta em violação a direitos políticos", afirmou na ação.
Folga só se Bolsonaro fosse eleito
Em Rio Verde, Goiás, a Videplast Indústria de Embalagens vai pagar uma indenização de R$ 261 mil para 327 funcionários após ser condenada em segunda instância por assédio eleitoral em um processo movido pelo sindicato dos trabalhadores. Cada funcionário receberá R$ 800,00.
De acordo com o processo, a empresa prometeu folgas aos trabalhadores no dia seguinte da eleição caso Bolsonaro fosse reeleito. A empresa alegou à Justiça que não houve indicação de candidato para votar, nem promessa de benefício, mas desistiu de recorrer e assinou uma petição comprometendo-se a fazer o pagamento da indenização.
Ameaça de demissão
Em Itapevi, São Paulo, a Justiça do Trabalho condenou a CFCAB-R a pagar R$ 20 mil a um funcionário que em 2022 demonstrou ter sido pressionado pelo proprietário da empresa a votar em Bolsonaro. "Quem não votar vai ser demitido", teria dito o responsável, segundo o relato feito no processo.
Após a eleição, em um post ele escreveu: "Estamos contratando. Quem fez o L não há vagas, obrigado". À Justiça, a empresa alegou não haver provas que sustentem a acusação de assédio eleitoral. O processo já transitou em julgado, ou seja, não cabe mais recurso.
Havan teria dito que fecharia as portas se Bolsonaro não ganhasse
Na cidade de Jacareí, também em São Paulo, a empresa Havan, de Luciano Hang, foi punida em um processo aberto por uma funcionária que relatou à Justiça que a sua supervisora não aceitava conversas contrárias a Bolsonaro. Ela disse que uma colega foi despedida por essa razão, e que a gerente dizia que a loja fecharia as portas caso o PT ganhasse a disputa.
O juiz Fabrício Martins Veloso declarou na sentença que ficou comprovada a pressão sobre os funcionários para que não houvesse voto em partido contrário ao adotado por Luciano Hang. Ele condenou a empresa a pagar uma indenização de cerca de R$ 6 mil.
A Havan, que já recorreu da sentença, se defendeu no processo alegando que a funcionária nunca foi exposta à pressão ou constrangimento.
Afirmou que testemunhas confirmaram em audiência que nunca houve assédio ou perseguição. A Havan declarou na ação ter sido eleita uma das melhores empresas para se trabalhar no país e que a posição pessoal de Luciano Hang sempre observou seu direito de livre expressão, nunca representando qualquer ameaça sobre seus funcionários.
Cobrança no WhatsApp por votos em Bolsonaro
Em outro caso no Estado de São Paulo, na cidade de Jundiaí, de acordo com a decisão da juíza Camila Moura de Carvalho, a Comercial de Móveis Jordanésia criou um grupo de WhatsApp para os funcionários no qual impunha a todos o dever de votar em Bolsonaro. Ninguém podia sair do grupo e a pressão psicológica era enorme e constrangedora, citou a magistrada ao determinar o pagamento de uma indenização de R$ 10 mil
A empresa, que já recorreu, disse que os documentos juntados ao processo não comprovam que houve indicação de voto em Bolsonaro. Disse que a acusação é leviana.
Na cidade de Itajaí, em Santa Catarina, a CPX distribuidora foi condenada em segunda instância por ter usado um grupo de WhatsApp interno para fazer campanha pró-Bolsonaro. Uma das mensagens anexadas ao processo dizia: "Ex-presidiário ladrão, não era nem para ter o direito de se candidatar".
A empresa, que ainda pode recorrer novamente, disse à Justiça que o grupo de WhatsApp não era institucional e foi criado pelos próprios funcionários. Afirmou que nunca houve ameaças ou determinação para que os trabalhadores votassem em determinado candidato.
O desembargador Garibaldi Ferreira, relator do processo, afirmou na decisão que a sequência de mensagens de cunho eleitoral constrangeu os que não concordavam com aquele tipo de opinião. A autora do processo vai receber, pela decisão, uma indenização de R$ 5 mil.
Discurso político a funcionários dias antes do primeiro turno
Outra condenação ocorreu no município de Aracruz, no Espírito Santo. Em setembro de 2022, o proprietário da Imetame Metalmecânica reuniu seus empregados e fez um discurso político, incitando-os a votar em Bolsonaro.
Ao determinar que a empresa pague uma indenização de R$ 2 mil a cada um dos seus funcionários, o juiz Geraldo Wandenkolken disse que ficou caracterizado o assédio eleitoral. Citando vídeos anexados ao processo, afirmou que a conduta da empresa configurou uma grave violação aos direitos políticos dos funcionários e um atentado aos princípios democráticos.
A empresa, que ainda pode recorrer, disse na defesa apresentada no processo não houve assédio, argumentando que a fala do proprietário, mesmo com conteúdo político, "não configurou ameaça ou coação aos empregados, respeitando sua liberdade de expressão e de voto".
Funcionário temporário foi ameaçado de não ser efetivado
A décima condenação ocorreu em Santo André (SP). A empresa Betel terá de pagar uma indenização de R$ 6 mil a um funcionário temporário que foi pressionado pelo seu supervisor a votar em Bolsonaro, sob ameaça de não ser efetivado. "A conduta afronta aos direitos ao voto e à liberdade política, configurando ataque direto à democracia em ambiente de trabalho, local que deveria ter sido preservado das disputas políticas", diz a decisão.
A empresa, que ainda pode recorrer, disse à Justiça que sempre pautou sua atuação por preceitos éticos e que jamais soube de reclamações a respeito da atuação do supervisor. Afirmou que a dispensa do trabalhador, três meses antes da eleição, não tem nenhuma relação com sua posição política.
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