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Rubens Valente

Ex-chefe da Inteligência da PF diz que Presidência nunca cobrou relatórios

29.nov.2018 - Operação da PF para combater exploração de minério radioativo - Divulgação/PF
29.nov.2018 - Operação da PF para combater exploração de minério radioativo Imagem: Divulgação/PF

Colunista do UOL

19/05/2020 19h34

O ex-diretor de Inteligência da Polícia Federal, o delegado Cláudio Ferreira Gomes, afirmou nesta terça-feira (19) que esteve por duas vezes com o presidente Jair Bolsonaro, uma das quais junto com o então ministro da Justiça, Sérgio Moro, e nunca o presidente cobrou que ele apresentasse relatórios de inteligência.

Da mesma forma, o delegado disse que nunca "a Presidência da República" ou mesmo a Abin (Agência Brasileira de Inteligência), por meio do seu diretor, o delegado Alexandre Ramagem, cobraram algo a respeito de diminuição da produção de relatórios de inteligência.

O depoimento vai na contramão do que vem dizendo Bolsonaro para justificar suas desavenças com Moro. Desde que o ministro deixou o governo, no dia 24 de abril, Bolsonaro tem dito que precisava de relatórios de inteligência da PF para subsidiar suas decisões e que esse seria o motivo de cobranças junto a Moro.

"Não houve nenhum pedido específico de relatório de inteligência, por parte da Presidência da República, dirigido à Diretoria de Inteligência Policial no período de sua gestão", afirmou Gomes em seu depoimento.

"Todas as demandas apresentadas pela Abin, na condição de órgão central do Sistema Brasileiro de Inteligência, [...] foram atendidas pela Diretoria de Inteligência durante a gestão do depoente [Gomes]", afirmou o ex-diretor.

O delegado disse ter estado duas vezes com Bolsonaro, uma durante uma solenidade na Academia Nacional de Polícia e outra quando acompanhou o então ministro Moro em um despacho no Palácio do Planalto. Gomes, na ocasião, respondia pela PF a ausência do então diretor, Maurício Valeixo. Gomes entrou na sala da reunião somente no final do encontro entre Bolsonaro e Moro e, nesse momento, também "não lhe foram solicitados dados de investigação policial em curso ou de inteligência".

Gomes também explicou que "nunca houve difusão direta de documentos de inteligência da Diretoria de Inteligência ao presidente da República durante sua gestão". Porém, disse o delegado, isso poderia ter ocorrido. "A difusão de documentos de inteligência estratégica diretamente à Presidência da República ou a qualquer dos órgãos públicos brasileiros pode ser feita, dependendo da urgência, sem que haja qualquer ilegalidade."

Os documentos de "inteligência estratégica" citados por Gomes são diferentes dos documentos de inteligência a serem usados em inquéritos policiais e processos criminais. A DIP, de acordo com o delegado, pode atuar nas duas pontas.

Gomes também foi indagado sobre eventual queda na produção de relatórios. Pelo contrário, disse o ex-diretor, houve um incremento.

"Não chegou ao conhecimento do depoente [Gomes] qualquer informação sobre eventual falha ou queda de produtividade na produção de documentos de inteligência repassados às instâncias superiores, pela DIP ou pelo canal do Sisbin [Sistema Brasileiro de Inteligência]. Gostaria de esclarecer que o número de documentos de inteligência produzidos pelo Sistema de Inteligência da Polícia Federal (Sinpol) no ano de 2019 foi superior aos anos anteriores."

O ex-diretor da DIP disse que mantém "um bom relacionamento pessoal e institucional com o dr. Ramagem", o diretor da Abin. "Durante a sua gestão o dr. Ramagem nunca lhe solicitou qualquer informação sobre investigação criminal e tampouco foi alegada falta de produtividade da Diretoria de Inteligência Policial."

O depoimento foi prestado aos investigadores da PF e da PGR (Procuradoria Geral da República) no inquérito que tramita no STF (Supremo Tribunal Federal) a fim de apurar as denúncias de Moro (Justiça e Segurança Pública) sobre suposta interferência do presidente Jair Bolsonaro na cúpula da PF.

A DIP é uma das sete diretorias da PF vinculadas ao diretor-geral. Ela coordena a produção de relatórios de inteligência em todo o país.

Após a posse do novo diretor-geral da PF, Rolando Alexandre de Souza, Gomes foi substituído na chefia de inteligência da PF no último 12 pelo delegado Alexandre Isbarrola, ex-superintendente no Rio Grande do Sul.