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Wálter Maierovitch

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Crime organizado sonha com 'lavanderia' dos cassinos legalizados no Brasil

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Imagem: Shutterstock

Colunista do UOL

05/01/2022 04h00

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O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), aposta as suas fichas na legalização dos jogos de azar no Brasil.

Em dezembro, Lira conseguiu —apesar da pressão dos evangélicos— o regime de urgência na votação do projeto legislativo liberatório.

Os empresários da recreação e do turismo voltaram a sonhar graças a Lira e ao Centrão. O mesmo se pode dizer do crime organizado que lava dinheiro sujo e depois recicla capitais nos estabelecimentos de jogos de azar.

A lembrar que a Cosa Nostra ítalo-americana construiu e transformou a selvagem e paradisíaca ilha de Aruba (Antilhas Holandesas) em uma megaestrutura turística, com cassinos e hotéis luxuosos.

Os livros sobre máfias siciliana-americanas contam a vida de Mayer Lansky, "ministro das finanças" da Cosa Nostra americana e chamado de o "Rei dos Casinos". Lansky, conforme contou, nunca passou mais de meia hora detido em delegacias na sua longa vida. Nunca foi condenado.

No Brasil, a máfia italiana implantou bingos e máquinas eletrônicas de jogos de azar. Valeu-se de uma medida provisória. Depois houve recuo do governo Lula e a medida provisória acabou derrubada. Isto porque a polícia italiana descobriu, na célebre Operação Malocchio (Mau-olhado), que o dinheiro da cocaína dos "cartelitos" colombianos era, pela Cosa Nostra italiana, lavado na compra de componentes eletrônicos de jogos de azar na Espanha.

As montagens das máquinas eram feitas no Brasil. E no Brasil, além das montagens, ocorriam as distribuições e as vendas dos equipamentos, com programas gerenciadores (softwares) onde a possibilidade de ganho pelo apostador era mínima.

O historiador holandês Johan Huizinga, um humanista, escreveu uma clássica obra sobre o jogo de azar, aquele onde apenas a sorte deveria contar. O título do seu mundialmente conhecido livro é significativo: "Homo Ludens" (Homem Lúdico).

Huizinga lembrou que o jogar é ínsito ao ser humano, desde sempre. Ou melhor, é cultural. Huizinga falou no jogar como exercício individual, ou coletivo, por adultos e crianças. Para o lazer e a gerar resultados no desenvolvimento físico e intelectual. E Huizinga não esqueceu dos jogos coletivos.

O grande lance de Huizinga foi concluir que o jogar nunca foi o problema. O problema só aparece quando surge o explorador, o intermediário do jogo, ou melhor, o popular banqueiro.

Sobre isso, outro exemplo histórico. Aconteceu no Rio de Janeiro, em 1880. O imperador Pedro 2º, criador do Jardim Zoológico, sabia ser preciso de capital para mantê-lo. Aí, apelou-se para o jogo.

Coube ao barão de Drumond criar uma combinação de números. Os frequentadores do parque, e era a grande atração da época, compravam um bilhete numerado. No final do dia, tirava-se, do alto de uma alta estaca, o papel onde estava grafada a combinação de números vencedores. Com efeito, nasceu, em seguida e espalhou-se pelo distrito federal, o jogo do bicho, com as combinações do barão de Drumond. O jogo do bicho passou a ser proibido em 1890 e depois virou contravenção penal.

O presidente da Câmara, Lira, deverá colocar na pauta da Câmara, em fevereiro, o projeto de legalização do jogo no Brasil. Lira, e todos sabem, pode sempre surpreender e votar projetos fora da pauta, de surpresa.

Bolsonaro, para fazer média com os evangélicos e manter a pauta conservadora dos costumes, acena com o veto. Só que a força do capital pode ser mais forte e, num estado laico, os preceitos religiosos devem contar pouco e os vetos são derrubados.

O marechal Enrico Gaspar Dutra, quando presidente eleito pelo prestígio do ex-ditador Getúlio Vargas, disse que o jogo nunca seria legalizado no seu mandato. Sua esposa, muito católica e influenciada pela Igreja, não deixava o marechal cogitar em abrir a "jogatina". Agora, são as lideranças evangélicas a se opor.

Num pano rápido. Façam as suas apostas se será ou não legalizado o jogo? É bom não esquecer que no Brasil temos o "Estado-banqueiro", aquele a explorar as loterias, mega-sena, etc.