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Wálter Maierovitch

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Vacinação de crianças: Queiroga dá para trás

Colunista do UOL

05/01/2022 18h28Atualizada em 06/01/2022 18h04

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Muitos pensam que todas as normas legais ensejam interpretações diversas. Não é assim. Existem normas claras, a não exigir dificuldades interpretativas.

Quando Roma era a "capital do Mundo", os pretores diziam algo usado até hoje: "in claris, non fit interpretatio" ("as leis claras interpretam-se por si mesmas").

Não havia interpretação constitucional possível, diante do aval da ciência, da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da nossa Agência de Vigilância Santitária (Anvisa), para o presidente Bolsonaro valer-se dela e não autorizar a vacinação contra a covid em crianças entre 5 e 11 anos de idade.

Esse tipo de negacionismo, omissão fundada na ignorância de Bolsonaro e no sabujismo do ministro-médico Queiroga, representa, - e não há dúvida interpretativa a respeito de tipificação penal -, crime contra a humanidade e sujeita o infrator ao Tribunal Penal Internacional.

O ministro Queiroga, que hoje dá meia-volta, procurou, para agradar Bolsonaro, contornar o negacionismo presidencial com a adesão a outras estultices: prescrição médica e autorização dos pais ou responsáveis.

Três ações foram apresentadas junto ao Supremo Tribunal Federal. Duas, por conexão, foram distribuídas ao ministro Ricardo Lewandowski e a terceira, à ministra Cármem Lúcia.

Com o recuo de Queiroga, que acabou de anunciar a inclusão da imunização das crianças no Programa Nacional, com datas marcadas para o início, a ação voltada a estabelecer essa obrigatoriedade perdeu seu objeto, a sua razão de existir pois desapareceu a causa do pedido. O ministro Lewandowski deverá arquivar.

Como o ministro Queiroga também recuou e anunciou não ser necessária a apresentação de prescrição médica pela criança a ser imunizada, a outra ação também perde o objetivo.

Queiroga, quanto a isso, correu para realizar, a aproveitar o prazo dado na requisição de informações feita por Lewandowski, com a sua inusitada consulta pública.

Ora, se já havia manifestações técnico-científicas, a consulta pública, não técnica e meramente política, não ajudaria em nada na tomada de decisão pelo ministro. Enfim, como até as pedras sabiam que seria concedida liminar pelo STF, e a liminar-cautelar iria merecer confirmação pelo Plenário da Corte, o ministro tentou arrumar uma tábua para evitar desmoralização maior.

Queiroga já concluiu a consultação. Por tal razão, a ação distribuída à ministra Cármem Lúcia, que era voltada a impedir a audiência pública, também perdeu o objetivo e deverá ser extinta, sem julgamento do mérito.

Resta, no momento, a questão da obrigatoriedade da autorização dos responsáveis pelas crianças. A respeito, se a dupla Bolsonaro-Queiroga não recuar, a liminar acautelatória será dada. Estão presentes os requisitos legais para a cautela de antecipação, liminar. A autoridade dos genitores não pode colocar em risco os filhos menores. Crianças não imunizadas correm risco de contágio e até morte.

A respeito, a jurisprudência é pacífica. Só para lembrar, já foi autorizada pela Justiça a transfusão de sangue de menor de idade não autorizada pelos pais. Com efeito, a autorização para vacinação não precisará ser apresentada às autoridades sanitárias encarregadas da imunização.

Num pano rápido. O governo Bolsonaro já sabia que, se não recuasse, seria novamente corrigido, no interesse da sociedade, pelo Supremo Tribunal Federal.