Wálter Maierovitch

Wálter Maierovitch

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Opinião

No desespero, Bolsonaro volta a cogitar cargo de senador vitalício

Diante do fracasso do evento bolsonarista do domingo na orla de Copacabana, falsamente dado como de busca de sensibilização para se anistiar os envolvidos diretamente no episódio golpista e danoso do 8 de Janeiro, voltou-se à ideia de tornar Jair Bolsonaro "senador vitalício". Isso por emenda constitucional e a atropelar a inelegibilidade declarada pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Dei uma pesquisada nos países que, com base na Constituição, colocam os seus ex-presidentes como senadores vitalícios.

Burundi, República Democrática do Congo e Ruanda têm como membros permanentes do Senado os seus antigos chefes de Estado.

O Paraguai tem também, mas com uma peculiaridade. O ex-presidente transforma-se em senador vitalício, sem direito a voto. Pode usar a tribuna, opinar em comissões, mas está proibido de votar. A meta principal é dar testemunho da sua experiência.

No Brasil, caso aprovado por emenda constitucional o cargo de senador perpétuo, teremos uma outra peculiaridade.

Peculiaridade bananeira, de matriz ofensiva à ética e à moral.

O par: Collor

O golpista Jair Bolsonaro, péssimo militar, péssimo parlamentar e péssimo presidente, teria como par Fernando Collor de Mello que, além do impeachment sofrido em antiga decisão do Senado, foi recentemente condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

Collor encontra-se condenado definitivamente no STF pelos dois supracitados crimes. O processo tramita em fase limitada apenas para o acertamento de penas, em reduzido recurso de embargos.

Outro ponto, agora ético. Num Estado constitucional, democrático, republicano, com separação de poderes, como ocorre no nosso Brasil, não haveria fórmula legítima para colocar-se, no Poder Legislativo elaborador de leis, um golpista do tipo Jair Bolsonaro.

Trata-se de ex-presidente, Bolsonaro, que quis rasgar a nossa Constituição. Mais ainda, transformar-se em ditador, com derrubada do presidente legitimamente eleito.

Bolsonaro como senador vitalício seria, para usar uma expressão latina cunhada pelos romanos, uma "contradictio in adjecto" (contradição pelos argumentos) e, também, provocaria um dano moral "in re ipsa" (visível, sem precisar de comprovação).

Domingo, no seu discurso numa orla de Copacabana esvaziada, com pouco mais de 18 mil gatos-pingados, Bolsonaro voltou a sugerir que "não perdeu a eleição de 2022 no voto".

Como se percebe, Bolsonaro continua com o discurso mentiroso e que serviu de motivo ao golpismo, este desejado desde o primeiro dia que assumiu a presidência e tramado no palácio, quarteis, acampamentos etc.

Itália e Rússia

Na Itália e na Rússia, por criação constitucional, existe a figura do senador vitalício. O motivo não foi casuísta, para se dar poder a golpistas com a lama a atingir as narinas, caso de Bolsonaro.

Duas são as hipóteses previstas, quer na Itália, quer na Rússia:

  1. Trazer os que ilustraram a pátria, e em tal quesito Bolsonaro seria reprovado, pois, além dos atentados à Constituição, democracia e saúde pública, até joias subtraiu, como peculatário;
  2. A experiência dos antigos chefes de Estado que cumpriram os seus mandatos até o prazo final. Bolsonaro foi internacionalmente considerado um pária, sua experiência foi nefasta. Serviria apenas para se fazer o diverso do feito ou imaginado por ele, mas, para isso, não há necessidade de travesti-lo de senador, basta uma olhada as suas opiniões e ações de então.

Quanto aos que honraram a pátria pelos altíssimos méritos adquiridos, ficaram demarcados, na Itália e na Rússia, os campos de atuações: social, científico, artístico e literário. E aqui convém não esquecer o negacionismo bolsonarista referente à vacinação contra a covid.

Nessa segunda hipótese, campos social, científico, artístico e literário, ninguém ousaria, por razões óbvias, notórias, indicar Bolsonaro. Nem operadores de milagres do tipo Silas Malafaia.

Bolsonaro como farsante

Ontem, pareceu ter acabado de vez a pretensão de Bolsonaro em obter uma Lei de Anistia. Mas, a pretensão da anistia poderá ser ressuscitada na capital de São Paulo, em evento com igual motivação ao do Rio.

Bolsonaro, filhos e asseclas erram na estratégia. Colocaram os usados como massa de manobra no 8 de Janeiro como beneficiários da anistia.

Ora, ninguém se sensibiliza por vândalos pós o iluminismo civilizatório. Nem que tenham os vândalos sido fanatizados e ensandecidos pelo discurso do perdedor Bolsonaro.

Os crimes consumaram-se. Ocorreu, de fato, exagero nas penas. A destruição, no entanto, foi visível, como, ainda, o uso deles como massa de manobra (dos réus condenados) a fim de abrir caminho à efetivação do golpe. Tudo isso ficou na cara, bastando ter olhos de ver.

Atenção: pela segunda vez a "raia miúda" foi usada e enganada por Bolsonaro.

A anistia é ampla, engloba até os que estão sendo investigados, denunciados e processados.

Claro, uma anistia beneficiaria Bolsonaro.

Isso pode ter passado despercebido, salvo, como se diz em italiano em eventos políticos esvaziados, para os "quattro gatti" (gatos pingados) que compareceram à orla de Copacabana.

Bolsonaro será o grande beneficiado de uma futura lei de anistia. Isso porque a anistia, como ensinam os doutrinadores, refere-se a fatos e não as pessoas.

Como farsante, Bolsonaro colocou os condenados pelo 8 de Janeiro na linha de frente. Escondeu deles poder ser a anistia aplicada antes de processos e condenações.

Em momento algum, em Copacabana, Bolsonaro disse que recusaria a anistia em favor dos processados pelo 8 de Janeiro. Como se sabe, a anistia pode ser recusada.

Continua após a publicidade

Anistia, inelegibilidade e urgência

A anistia é o esquecimento jurídico de uma ou mais infrações criminais, sabe disto até um reprovado em exame de qualificação profissional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Bolsonaro busca a anistia pelos crimes de golpe de Estado, abolição violenta ao estado de Direito e organização criminosa para tal fim.

Acontece estar Bolsonaro, na Justiça Eleitoral, condenado por fatos outros, ou seja, abuso de poder político e econômico. O motivo foi a convocação de embaixadores e adidos estrangeiros para mentirosamente sustentar a existência de urnas viciadas, que seriam empregadas em fraude eleitoral.

Nessa lei de anistia sonhada, pensada para pessoa certa e determinada (Bolsonaro), os legisladores, por emenda ao projeto do deputado Rodrigo Valadares (União-SE), terão de fazer contorcionismos para incluir os fatos abusivos reconhecidos pela Justiça Eleitoral. E Lula poderá vetar.

Uma cogitada tramitação em regime de urgência do projeto de lei de anistia dependerá do tamanho da manifestação programada para São Paulo.

Por enquanto, os "gatos-pingados" da orla de Copacabana não sensibilizaram parlamentares a ponto de influenciar na adoção do regime de urgência no projeto de lei de anistia. Um regime de urgência para contrastar com o julgamento do processo que será aberto e julgado pela Primeira Turma do STF.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Deixe seu comentário

O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.