Wálter Maierovitch

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Opinião

Netanyahu está em guerra com chefão da inteligência que sabe tudo sobre ele

Com Donald Trump como guarda-costas, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, decidiu, como amplamente divulgado, romper a segunda fase do acordo de cessar-fogo, firmado em janeiro com o Hamas, e reiniciar os bombardeios na faixa de Gaza. Tudo foi calculado e acertado pela dupla siamesa Trump-Netanyahu.

Com o rompimento, Netanyahu trombou de frente com Ronen Bar, poderoso chefe do Shin Bet, a agência interna de espionagem israelense. Ronen Bar, no cargo desde 2021 e com mandato até o final de 2026, não concordou com o rompimento, pois o Shin Bet havia sido peça fundamental nas negociações.

Atenção: o Shin Bet é uma agência de inteligência (espionagem) de Estado, e não de governo.

'Qatargate'

Até o fim da primeira fase do acordo, 33 reféns foram libertados pelo Hamas e, em troca, Israel soltou dos seus presídios 2.000 palestinos.

Segundo os dois serviços secretos israelenses, Shin Bet e Mossad (inteligência externa), o Hamas ainda mantém cerca de 59 reféns em cárcere privado desde o ataque terrorista de 7 de outubro de 2023. Pelas informações dos 007 das inteligências, interna e externa, apenas 24 estariam vivos.

Para as famílias das vítimas e para os opositores do governo Netanyahu, o rompimento do acordo, sob alegação de descumprimento por parte do Hamas —que desmente—, põe os reféns sob risco de eliminação. Isso deu causa, em 23 de março, a um protesto gigantesco na frente da residência de Netanyahu em Jerusalém.

Com a pressão popular, entrou em cena Ronen Bar, o chefe do Shin Bet, que atrita com Netanyahu desde os ataques terroristas do Hamas.

O dissenso aumentou com o chamado escândalo "Qatargate": malas de dinheiro eram mensalmente enviadas, num acerto de Netanyahu com o Qatar, para a cúpula diretiva do Hamas. Netanyahu imaginava estar comprando os responsáveis pelo Hamas, mas, como apurou o Shin Bet, o dinheiro foi usado para a construção de túneis, aquisição de armas e no ataque de 7 de outubro de 2023. Netanyahu imaginava ter a cúpula do Hamas no bolso e se enganou.

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Ronen Bar não aceitou Netanyahu tirar o corpo fora da responsabilidade pela tragédia do 7 de outubro. Para o primeiro-ministro, a responsabilidade exclusiva recai nas forças de segurança.

Na verdade, essas forças protetivas da linha de fronteira com Gaza migraram, por determinação do governo Netanyahu, para a Cisjordânia, para proteger a ilegítima expansão dos assentamentos pelos israelenses da direita radical, que dá maioria ao premiê no Parlamento.

Para os radicais direitistas e supremacistas e para os religiosos sustentados pelo Estado e dispensados do serviço militar, a Cisjordânia pertence a Israel, pois era dos reinos judaicos bíblicos. Para eles, o direito internacional não tem nenhum valor quando em desconformidade com os preceitos religiosos.

Ronen Bar quer uma "Comissão de Estado" para apuração das responsabilidades pelo 7 de outubro, incluindo o "Qatargate". Dada a sua insistência, Bar foi demitido por Netanyahu. Como tem mandato de Estado até o final de 2026, Bar não deu a mínima bola para a demissão. De novo: ele é chefe de agência de Estado, e não de governo, sendo Netanyahu apenas chefe de governo, e não de Estado.

O premiê nomeou um almirante da Marinha para assumir o Shin Bet. Desmoralizou-se por três motivos: o almirante não falava árabe, algo fundamental no Oriente Médio, dados os históricos problemas com os vizinhos árabes. O almirante era um diletante em termos de inteligência. E como Bar tinha mandato de Estado, a Justiça israelense o manteve no posto. Netanyahu demitiu o almirante a avisou que está procurando outro nome.

Bar foi contra o rompimento do cessar-fogo com o Hamas, e o Shin Bet empenhou-se, junto ao Egito e ao Qatar, para que o acordo vingasse. Pelo que foi vazado, o chefão do Shin Bet tem todas as informações sobre a trama executado por Netanyahu para, por um projeto de "reforma da Justiça", reduzir os poderes dos juízes e da Suprema Corte de Israel. Com a reforma, Netanyahu lograria livrar-se de processo de corrupção contra ele e o filho.

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Guerras interna e externa

Netanyahu enfrenta guerras externas contra o Hamas e o Hezbollah: foram retomados os ataques ao Líbano, centrados nos territórios dominados pelo Hezbollah, após a organização libanesa ter voltado a lançar bombas na fronteira contra o território de Israel. Internamente, Netanyahu entrou em guerra interna contra Ronen Bar, que tem todo o apoio dos seus comandados.

Num pano rápido, Netanyahu tem o apoio dos radicais de direita e dos religiosos e tem sinal verde de Trump para aventuras que resultem na eliminação do Hamas e na desocupação, pelos palestinos civis, da faixa geográfica de Gaza, que lhes pertence.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.