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Enfermagem: Bolsonaro sancionou piso e Lula, origem da verba

17.mai.2023 - O tuíte mente ao comparar dois PLs diferentes sobre o piso da enfermagem; Bolsonaro e Lula sancionaram leis distintas - Arte/UOL sobre Reprodução/Twitter
17.mai.2023 - O tuíte mente ao comparar dois PLs diferentes sobre o piso da enfermagem; Bolsonaro e Lula sancionaram leis distintas Imagem: Arte/UOL sobre Reprodução/Twitter

Do UOL, em São Paulo

18/05/2023 14h47

É falso que Lula tenha sancionado o piso da enfermagem, como sugere um post que viralizou no Twitter, que questiona se o atual presidente "roubou os louros do governo Bolsonaro".

O tuíte se refere à lei publicada no DOU (Diário Oficial da União) na manhã da última sexta-feira (aqui) e que, na verdade, define a fonte de pagamento do piso da categoria.

O que diz o post

A publicação começa com uma falsa cronologia do piso da enfermagem:

"Piso da enfermagem

4.8.2022 - Bolsonaro sanciona a lei.

16.9.2022 - ÉsseTF (grafia de 'STF' geralmente usado por desinformadores) suspende a lei.

3. 2023 - ainda em suspensão

5. 2023 - Lula 'sanciona' a lei.

O Lula está dando um jeito de 'roubar' os louros do governo Bolsonaro?", conclui o tuíte. "Ps. Qto a xoquei (sic) tá ganhando?".

Na sequência, vem um print de um tuíte da Choquei, que informa: "Agora: presidente Lula sanciona lei que destina R$ 7,3 milhões para pagar o piso da enfermagem". A publicação é de 12 de maio deste ano.

A postagem também traz uma montagem de títulos de matérias como tentativa de embasar a falsa cronologia:

"Bolsonaro sanciona piso salarial de R$ 4,7 mil para enfermeiros", diz uma matéria do site oficial do Senado de agosto de 2022;

"Por 7 a 4, STF suspende o piso salarial para a enfermagem", afirma Uma reportagem do UOL de setembro de 2022;

"Piso de enfermagem ainda não vale e depende de decisão do STF", registra texto do Poder 360 de março de 2023;

Por que é falso

Bolsonaro e Lula sancionaram leis diferentes, ao contrário do que sugere o post.

O que Bolsonaro sancionou: a lei nº 14.434, de 04/08/2022 (aqui), que estabelece o piso salarial para profissionais de enfermagem no ano passado.

Lei sancionada por Bolsonaro foi suspensa pelo STF. Em 15 de setembro de 2022, após a sanção do ex-presidente, o Supremo decidiu manter a suspensão dos pagamentos do piso salarial da enfermagem até que fossem feitos cálculos sobre as maneiras de financiar a nova lei.

Data errada. O post erra ao indicar 16 de setembro como data da suspensão.

A suspensão ocorreu após a CNS (Confederação Nacional de Saúde) entrar com uma ação no STF questionando a constitucionalidade da lei, porque o texto não previa a fonte de custeio. Por isso, os efeitos da lei foram suspensos temporariamente.

O que Lula sancionou: a lei nº 14.581 (aqui), de 11/05/2023, que disponibiliza crédito extraordinário como fonte de custeio para pagamento do piso.

Piso mobilizou Executivo, Legislativo e Judiciário

A aprovação do piso da enfermagem envolveu uma discussão que durou cerca de três anos, mobilizou os Três Poderes e envolveu a articulação em torno de dois projetos de lei e de duas PECs.

O primeiro projeto de lei, proposto pelo Senado e aprovado na gestão Bolsonaro, estabeleceu o piso.

O segundo, proposto pelo Executivo e aprovado no governo Lula, viabilizou o pagamento do valor.

Entenda abaixo os detalhes.

O primeiro PL: texto do piso partiu do Congresso

O PL que estabelece o piso da enfermagem foi criado durante a pandemia da covid-19. A justificativa foi o baixo valor do serviço frente a importância do trabalho da categoria na crise sanitária.

A proposta veio da oposição ao governo Bolsonaro. O PL 2564/20, que estabelece o piso, é de autoria do senador Fabiano Contarato, na época filiado à Rede-ES, hoje no PT-ES. O projeto altera lei de 1986 e institui piso salarial para enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem e parteiras (aqui).

No Senado, a aprovação do PL ocorreu em novembro de 2021 (aqui).

Na Câmara, o projeto foi aprovado em 4 de maio de 2022 (aqui), com 449 votos a favor e apenas 12 contra.

A orientação da liderança do governo Bolsonaro na Câmara era dizer "não" ao piso.

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e mais 11 votaram contra o PL. Foram oito votos contrários do Novo e três de bolsonaristas. Além de Eduardo, votaram contra o piso Kim Kataguiri (União-SP), José Medeiros (PL-MT) e Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo Bolsonaro na Câmara (confira todos os votos aqui).

A primeira PEC: para legitimar o primeiro PL

A lei que institui o piso de enfermagem partiu do Congresso, mas deveria ter vindo do Executivo, como previsto na Constituição (aqui).

São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que disponham sobre criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração."
Artigo 61, parágrafo 1, inciso II, linha a da Constituição

Houve então articulação para a aprovação de uma PEC para legitimar a vigência da lei proposta por um parlamentar.

A PEC 124/22 determinou que o piso deve ser instituído por lei federal —que pode ser proposta, entre outros, por parlamentares (aqui). A proposta é de autoria da senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), também da oposição ao governo Bolsonaro. O texto foi aprovado em julho de 2022 (aqui) —a PEC foi incorporada à Constituição no art. 198, parágrafo 2 (aqui).

Criar a PEC foi uma forma de evitar que se questionasse o "vício de iniciativa". Ou seja, quando um dos poderes toma uma atribuição que seria de outro. Isso poderia gerar insegurança jurídica, justamente porque o texto partiu do Congresso quando deveria ter saído do Executivo.

Com a lei e PEC aprovadas, Bolsonaro sancionou o piso em agosto de 2022.

Suspensão no STF

O Conselho Nacional de Saúde questionou no STF a validade da lei, argumentando que não seria constitucional (aqui). A entidade alegou que:

O texto do PL não passou por uma comissão parlamentar;

Não houve estudos sobre a viabilidade financeira do novo piso nos estados e municípios;

A autoria do projeto deveria ter partido do chefe do Poder Executivo, não do Congresso.

O Supremo suspendeu o piso da enfermagem um mês após sua aprovação. A decisão considerou a possibilidade de risco da estabilidade econômica de estados e municípios, levando em conta a chance de demissão em massa e a precarização da qualidade dos serviços de saúde, uma vez que o texto não determinava de onde sairiam recursos para o reajuste salarial (aqui).

A segunda PEC: para viabilizar o pagamento do piso

Enquanto a primeira PEC deu respaldo para que o Congresso estabelecesse um novo piso da enfermagem, uma segunda PEC apontou a origem dos recursos para pagamento do piso.

A nova PEC permitiu que a União destinasse recursos a estados, municípios e unidades filantrópicas para pagamento do novo piso da enfermagem. Também apontou como origem do dinheiro o superávit de fundos públicos do Executivo.

Autoria é da oposição. A proposta, de dezembro de 2022 (aqui), veio do deputado federal André Figueiredo (PDT/CE) —que também não era da base bolsonarista.

A emenda foi aprovada no mesmo mês pela Câmara e pelo Senado (aqui).

Nova PEC abriu caminho para o segundo PL, desta vez do Executivo

A aprovação da nova PEC permitiu que o poder Executivo apontasse a fonte de custeio do piso da enfermagem por meio de um novo projeto de lei.

O novo projeto saiu em abril de 2023. O governo federal enviou ao Congresso um PLN (Projeto de Lei Nacional) —proposta orçamentária enviada exclusivamente pelo presidente— que abriu um crédito especial no valor de R$ 7,3 bilhões para viabilizar o pagamento do piso da categoria por estados, municípios e unidades filantrópicas.

O projeto foi aprovado pelo Congresso (aqui) no dia 26 e a lei, sancionada pelo presidente na última sexta-feira (12) (aqui).

Sugestões de checagens podem ser enviadas para o WhatsApp (11) 97684-6049 ou para o email uolconfere@uol.com.br.

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