Posts enganam ao usar vídeo com falas distorcidas de Lula sobre pobres
Ricardo Espina
Colaboração para o UOL
21/01/2025 15h46
O presidente Lula (PT) não deu uma série de declarações em tom ofensivo à população pobre, como insinuam publicações compartilhadas nas redes sociais.
As peças enganosas recortaram trechos de falas de Lula em diversas ocasiões, tirando-as do contexto original, para dar a impressão de que o presidente menospreza os mais pobres.
O UOL Confere considera distorcido conteúdos que usam informações verdadeiras em contexto diferente do original, alterando seu significado de modo a enganar e confundir quem os recebe.
O que diz o post
A publicação contém a seguinte mensagem: "As pessoas tem que passar fome diz Lula".
Abaixo, há um vídeo compilando falas de Lula sobre pobres, dando a entender que o presidente os trata com desdém.
"As pessoas têm que passar fome para aprender a lutar", "Pobre é imbecil, é ignorante", "O pobre é um número, às vezes bonito para se utilizar em campanha", "Acabou as eleições, acabou o interesse pelo pobre" são algumas delas.
Por que são distorcidas
Falas de Lula foram retiradas de contexto. Todas as declarações do presidente utilizadas nas publicações enganosas omitiram o contexto original nas quais foram ditas. Em uma busca reversa (aqui), verifica-se que a primeira fala ("As pessoas têm que passar fome para aprender a lutar") foi dada originalmente durante uma premiação da Fundação Bill & Melinda Gates, em 23 de setembro de 2024 (aqui, a partir de 4min09, e abaixo). A declaração completa do presidente é a seguinte: "Eu quando era mais jovem, eu imaginava, eu dizia assim: 'As pessoas têm que passar fome para aprender a lutar. É preciso'. Aí eu descobri que a fome não leva ninguém à revolução. A fome leva as pessoas à submissão. Então, cabe ao Estado, seja ele o americano ou brasileiro ou chinês ou finlandês ou norueguês, ter como premissa básica atender as necessidades do mais pobre".
Lula criticou linha de pensamento de oligarquias do Nordeste. O UOL Confere pesquisou no Google a frase dita no segundo trecho utilizado pelas publicações enganosas ("Pobre é pobre. A gente tem que ganhar voto de pobre na eleição. Para que cuidar de pobre?") (aqui). A declaração de Lula foi feita no encerramento da Caravana Federativa e do anúncio de investimentos no Piauí, em 21 de junho de 2024 (aqui, aqui e abaixo). No discurso original, o presidente criticou a forma de pensamento de antigos governantes locais, que só se importavam com os pobres na época das eleições. Checagens de agências verificadoras já haviam desmentido outras peças desinformativas sobre este episódio (aqui, aqui e aqui).
Petista defendeu Bolsa Família de queixas da elite do país. A terceira declaração de Lula ("Pobre é imbecil, é ignorante") aconteceu em uma entrevista dada ao podcast PodPah em 2 de dezembro de 2021 (aqui, a partir de 38min38, e abaixo), como se nota a partir de uma busca reversa (aqui): "Quando nós criamos o Bolsa Família, o que que a elite brasileira falava? 'Ah, o Lula está criando vagabundo! O Lula está criando um exército de desempregados! Essas pessoas não querem mais trabalhar! Essas pessoas só querem agora fazer filho pra poder ganhar mais!' Sabe o que acontece? É a falta de crença no povo pobre! É a falta de respeito às pessoas pobres. Porque todo mundo acha que pobre é imbecil, é ignorante. E está cheio de gente que acha que o cara é pobre porque ele quer". As declarações também foram usadas em outros posts desinformativos, desmentidos por agências de checagem (aqui e aqui).
Presidente ironizou governantes que dão atenção apenas aos mais ricos. Uma busca no Google pela declaração dada no quarto trecho ("O pobre é um número. Às vezes um número bonito para se utilizar em campanha") (aqui) leva ao discurso proferido por Lula no Dia Mundial da Alimentação em outubro de 2021 (aqui, a partir do minuto 33, e abaixo), cuja fala completa é a seguinte: "Nenhum presidente de nenhum país do mundo se esquece do orçamento das Forças Armadas. Nenhum país do mundo se esquece dos orçamentos do Itamaraty, do orçamento do Ministério Público, do orçamento da Polícia Federal. Mas se esquece de colocar o pobre no orçamento. Por que o pobre não é levado em conta. O pobre é um número. Às vezes um número bonito para se utilizar em campanha. Eu há vinte anos atrás dizia: 'Pobre é utilizado como se fosse papel higiênico. Tem uma baita de uma utilidade na época da eleição, mas depois joga ele fora e esquece.' Eu estou falando isso, coisa que eu já falei há trinta anos atrás". Agências verificadoras também desmentiram conteúdos que retiravam esta fala de contexto (aqui).
Lula falou da importância da participação popular na política. O quinto trecho ("Quanto mais miserável é o povo, quanto mais desgraça ele tem, mais ele acredita em coisas fáceis. Quanto mais miserável ele é, mais ele acredita em fantasma") recorta uma participação do petista no Show de Calouros, antigo programa do SBT e apresentado por Sílvio Santos, exibida em 1989. Então candidato à presidência da República, Lula foi convidado pela atração e, ao responder uma pergunta do jurado Sérgio Mallandro, falou da importância de o povo se interessar e participar da política (aqui).
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