Obrigação de vacinar criança continua; decisão no PR vale para um caso

Não é verdade que a Justiça do Paraná tenha reconhecido que a vacina infantil contra covid-19 é "experimental" e tenha desobrigado a vacinação entre todas as crianças.

Publicações nas redes sociais distorcem o efeito da decisão de um juiz de primeira instância do TJPR (Tribunal de Justiça do Paraná), que não se aplica a outros casos e que vai na contramão da decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça). Este sim, que cria jurisprudência.

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O que diz o post

Publicações no Facebook reproduzem uma notícia veiculada no site da organização negacionista e antivacina "Médicos pela Vida" que diz: "Justiça do Paraná reconhece caráter experimental de vacinas Covid e proíbe obrigatoriedade em crianças".

Por que é distorcido

Juiz usou site sobre pesquisas em andamento para alegar que vacina é "experimental". Na decisão, o magistrado Glaucio Francisco Moura Cruvinel, do TJPR, usou uma série de capturas de tela traduzidas do site da Pfizer para alegar que a vacina disponibilizada pela empresa não teria encerrado a fase de testes. As páginas são sobre "clinical trials" (estudos clínicos) em andamento.

Processo de pesquisa é contínuo, mesmo após aprovação final da vacina. Ao UOL Confere, o infectologista e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, Renato Kfouri, esclareceu que os estudos clínicos citados não são "experimentos", mas monitoramento de dados da vida real que acontecem com qualquer medicamento ou imunizante.

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Estudos clínicos se fazem com autorização e assinatura de termo de consentimento prévio, como prega os comitês de ética em pesquisa de todo mundo. Uma vez aprovada, não se trata mais de experimento, e sim monitoramento de dados de vida real, que continuam acontecendo com qualquer medicamento ou vacina. São estudos de fase quatro ou vigilância após comercialização, que após bilhões de doses serem aplicadas continuam constatando a segurança do produto. Renato Kfouri

A vacina infantil da Pfizer possui registro definitivo na Anvisa desde 2021. De acordo com a agência reguladora, para a comprovação de segurança e eficácia são exigidos relatórios de estudos não clínicos (não realizados em seres humanos) e de estudos clínicos (realizados em seres humanos).

A análise desses dados é pautada na relação benefício/risco do produto, sendo registradas as vacinas cujos estudos comprovem que os benefícios superam os riscos em determinado contexto epidemiológico. Além disso, é mandatória a apresentação pela empresa e aprovação pela Anvisa do Plano de Gerenciamento de Risco da vacina, o qual a empresa seguirá para a realização do monitoramento da segurança do produto após a sua introdução no mercado. Anvisa

Monitoramento pós autorização é conhecido como "farmacovigilância". Ao UOL Confere, a Pfizer esclareceu que este monitoramento é contínuo e que, por lei, os dados são compartilhados com as agências regulatórias de cada país.

O termo "clinical trials" refere-se a estudos clínicos conduzidos globalmente para avaliar a segurança, eficácia de novos medicamentos, incluindo a imunogenicidade no caso específico das vacinas. As agências regulatórias exigem estudos clínicos de fases 1, 2 e 3. Os estudos de fase 3, chamados de pivotais, são os que possibilitam a aprovação do estudo e comercialização do produto. Estes estudos seguem rigorosos padrões científicos e éticos, com supervisão de autoridades regulatórias em cada país. Pfizer

Decisão no Paraná não se aplica a outros casos e vai na contramão de entendimento de tribunal superior. Ao contrário do que afirmam as publicações enganosas, a decisão do juiz do Paraná não desobriga a vacinação contra covid-19 em crianças de forma geral, como explica Daniel Cappechi, professor de Direito Constitucional da UFRJ. No caso específico, a ação foi proposta pelo Ministério Público com o objetivo de impor a obrigação de vacinar e aplicar multa aos pais de uma criança no Paraná. O juiz Glaucio Francisco Moura Cruvinel decidiu que os pais não devem ser multados pela "impossibilidade de vacinação compulsória pela inviabilidade de submissão a tratamento experimental".

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STJ decidiu por aplicação de multa a pais que não vacinarem os filhos. Em março, a Terceira Turma do STJ decidiu que pais que não vacinarem os filhos contra a covid-19 podem ser multados (leia aqui). O colegiado levou em consideração a decisão do Supremo de que é constitucional a obrigatoriedade da imunização caso a vacina tenha sido incluída no PNI (Programa Nacional de Imunizações), tenha sua aplicação obrigatória determinada em lei ou seja objeto de determinação da União, Estado, Distrito Federal ou município com base em consenso científico (aqui). Na ocasião, o STJ confirmou a aplicação de multa de três salários mínimos aos pais de uma criança que não foi vacinada mesmo após notificação do conselho tutelar.

Cabe recurso a instâncias superiores. De acordo com o especialista Cappechi, juízes de primeira instância podem adotar entendimentos diferentes dos firmados pelos tribunais superiores devido à independência funcional e a livre motivação das decisões judiciais. Nesses casos, porém, é possível a interposição de recursos às instâncias superiores com o objetivo de uniformizar a interpretação jurídica.

Juiz do Paraná não comentou a decisão. O UOL Confere procurou o juiz Cruvinel por meio da assessoria de imprensa do TJPR, que respondeu que o tribunal "não comenta decisões de magistrados".

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