Ativistas atribuem mortes em rebelião no MA à lentidão da Justiça e à falta de ação do Estado
Ao fim de uma rebelião que durou dois dias, o Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís (MA), contabilizou 18 mortos --três deles decapitados-- nessa terça-feira (9). Ativistas ouvidos pelo UOL Notícias atribuem o desfecho do episódio, classificado de "catastrófico" e "estarrecedor", à falta de ação do Estado governado por Roseana Sarney (PMDB) e à lentidão da Justiça.
"O quadro do sistema penal no Maranhão já vinha sendo premeditado. Há meses presos vêm morrendo e sendo assassinados e não houve nenhuma tomada de providência dos órgãos de segurança", diz Vicente Mesquita, da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos. Nesta quarta (10), outro motim foi iniciado, desta vez no Amazonas. Presos rebelados mataram quatro colegas em uma cadeia no centro de Manaus. O tumulto já foi controlado.
"O maior problema de todos é que a Justiça é muito, muito lenta. Quem está condenado e pode cumprir a pena em liberdade não pode sair porque o documento não chega", diz o padre Luca Mainente, da Pastoral Carcerária. "Há uma demanda muito grande e não há resposta aos processos. A Justiça penal daqui deixa muito a desejar", afirma.
Segundo um relatório divulgado no início deste ano pela Pastoral Carcerária, o Maranhão é o segundo Estado com o maior número de casos de tortura em presídios (30), atrás somente de São Paulo (71) e à frente de Goiás (25). Os dados são referentes a denúncias recebidas entre 1997 e 2009.
"Neste três Estados, em relação aos demais, o número de providências tomadas pelas autoridades é consideravelmente relevante, o que pode indicar que existe um maior grau de pressão exercido pelas pastorais desses Estados, que também apresentam um maior número de casos acompanhados", ressalva o documento.
"Estarrecedor"
Tanto Mesquita quanto Mainente participaram das negociações para o fim da rebelião no presídio maranhense. "Eu presenciei a retirada dos corpos do lixo", diz Mesquita. "A grande maioria dos detentos é de pessoas negras e pobres, e o nosso Estado é um dos menos desenvolvidos da nação. [A rebelião] é
reflexo do sistema", afirma o ativista. "Eles estão jogados, abandonados. Não poderia ter havido outro resultado. Foi catastrófico, estarrecedor."
Outro fator que piora a situação é a presença de detentos do interior do Estado no presídio da capital. "Se eu fosse de Balsas, que fica no sul do Estado, até São Luís, teria de gastar mais ou menos R$ 90 só de passagens, e ainda teria de me hospedar e arcar com a alimentação", diz Mainente. Para ele, a dificuldade em ver os parentes aumenta a revolta dos presidiários. "Para uma família que não tem renda fixa, tem que se gastar entre R$ 150 e R$ 200. Fica meio complicado", afirma.
A falta de água no presídio e até mesmo seu modelo de construção também são apontados como fatores que levaram ao motim. "Além da superlotação, há também a falta de atendimento das necessidades essenciais, como água, a qual eles só têm acesso por duas horas no dia, pela manhã e no final da tarde", diz o padre, especificando que o anexo 3, onde ocorreram 15 das 18 mortes, tem "técnicas de construção boas para o sul do país, não para o norte". "É muito quente", diz.
"O anexo não tem nada pensado para o trabalho e a educação dos presos. No presídio São Luís [também integrante do Complexo de Pedrinhas], tem espaço para a escola, mas está tudo ocioso, não tem aula. Não tem como tem como educar", diz o padre. "Tem que haver uma ação conjunta do governo do Estado para melhorar as condições de vida dos detentos, passando principalmente por uma ação do judiciário", finaliza.
O governo foi procurado pela reportagem para comentar as críticas, mas ainda não deu retorno. Ontem, o secretário de Segurança Pública do Estado, Aluísio Mendes, falou sobre o motim. "Uma rebelião atípica, sem nenhum dano ao presídio e que será investigado pela adjunta de inteligência da Secretaria de Segurança, sendo que nós chegaremos aos responsáveis por estes atos", disse.
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