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Cirurgião-dentista se livrou de punição por infração ética no CRO-DF três vezes

Janaina Garcia<br>Do UOL Notícias<br>Em São Paulo

10/05/2011 11h00

Por um acordo firmado com o Ministério Público do Distrito Federal (MP-DF), o dentista que tirou todos os dentes de César Oliveira Ferreira, 19, desembolsará, em parcelas de R$ 3 mil que ele termina de pagar este ano, a soma de R$ 51 mil. Pelo CRO-DF (Conselho Regional de Odontologia do Distrito Federal), contudo, o procedimento feito à revelia dos responsáveis pelo rapaz teve destino muito mais brando: ele se livrou da punição no processo que analisava infringência a quatro incisos do Código de Ética Odontológico em seu artigo quinto --justamente o que trata dos deveres fundamentais dos profissionais e entidades de Odontologia.

Na votação de cinco profissionais constituídos “juízes” do caso, três votos favoráveis a ele bastaram. O presidente do CRO-DF, Júlio César, que seria voto de minerva em caso de empate, afirma que foi voto contrário. Em seguida, ressalva: “Soube que ele agiu de boa fé. Eu achei que foi um erro ele não ter avisado a família sobre o procedimento. Independente do julgamento técnico tem a questão ética --não pode fazer um procedimento como o adotado sem avisar o paciente ou os responsáveis por ele. Mesmo que tenha que ser feito, tem que avisar. Caso contrário, é uma infração ética”.

Indagado pelo UOL Notícias se, como profissional da área, tecnicamente teria adotado o procedimento do colega que escapou de punição --mas com a devida autorização de familiares --, o presidente do CRO-DF disse: “Eu sei o que eu faria se estivesse na situação naquele momento, teria falado com os responsáveis. Sobre a retirada total, verificaria as condições, se seria necessário retirar de uma vez ou daqui a dez ou cinco anos, por exemplo”, resumiu.

César refutou qualquer traço de corporativismo na decisão final do conselho. Além do caso do jovem de 19 anos, o mesmo profissional, cujo nome não é divulgado, também foi investigado pela retirada de todos os dentes de outros dois pacientes com deficiência mental do DF, anos atrás. Também nesses casos, foi liberado de punição pelo CRO-DF.

“Não entrei no conselho para defender o dentista, mas a profissão. Agora, quem achar que é corporativismo, paciência: é como no no caso da Ficha Limpa (em março passado, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a lei Ficha Limpa não teve validade no ano passado por ter sido promulgada menos de um ano antes das eleições) --eu mesmo me indignei, tanto que votei achando que era um erro do profissional, mas os juízes é que decidem.”

Sobre os outros dois casos, o presidente da entidade garantiu que, em análise do CRO-DF, teria ficado constatada a necessidade de retirada de todos os dentes de ambos os pacientes. “Percebemos ali que ou havia necessidade mesmo, ou tinha parentes querendo se aproveitar do profissional, uma vez que o caso do César já era público. Não vamos deixar ninguém levar vantagem sobre ou extorquir um profissional”.

Por outro lado, o dirigente afirmou que o caso do jovem de 19 anos serviu para mudanças na forma de atendimento odontológico de pacientes com deficiência mental. “Propusemos ao Ministério da Saúde, por meio de sua Coordenadoria de Saúde Bucal, um protocolo de atendimento --antes daquele caso, por exemplo, atendia-se paciente deficiente mental sem um raio-x anterior; pelo menos aqui no DF, a secretaria estadual de Saúde determinou que hospitais ou clínicas que atendam paciente especial tenham aparelho de raio-x. Vamos ver se outros Estados seguem isso, pois ao menos os CROs já foram informados”, comentou.