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Sargento que parou atirador de Realengo diz que poderia ter salvado mais vidas

PM que parou atirador de Realengo disse que poderia ter salvado mais vidas, se tivesse chegado antes - Paula Giolito/Folhapress
PM que parou atirador de Realengo disse que poderia ter salvado mais vidas, se tivesse chegado antes Imagem: Paula Giolito/Folhapress

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

07/04/2012 06h00

Ao subir as escadas do colégio Tasso da Silveira, em Realengo, bairro da zona oeste do Rio de Janeiro, na manhã do dia 7 de abril do ano passado, o sargento da PM Márcio Alves era a única esperança para mais de cem crianças inocentes que ainda estavam sujeitas à crueldade de Wellington Menezes de Oliveira, 23, o ex-aluno que momentos antes havia assassinado 12 crianças.

"Eu cumpri o meu dever. Mas todo dia penso que poderia ter chegado mais cedo ao colégio", afirma o policial, um ano após a tragédia. Outros 12 estudantes foram baleados, mas sobreviveram.

Alves, que se transformou em herói e acabou sendo promovido e condecorado pelo governador do Estado, Sérgio Cabral, foi mais rápido do que o criminoso e o baleou na região do abdomen. Mesmo ferido, Oliveira conseguiu atirar contra a própria cabeça, e deu fim a uma barbárie sem precedentes no país. O ex-aluno portava dois revólveres, carregador e muita munição.

O sargento, então lotado no BPR (Batalhão Policial Rodoviário), estava em uma blitz quando o estudante Alan Ferreira da Silva, 13, que conseguiu fugir do colégio mesmo atingido por um dos 66 disparos efetuados pelo criminoso, o alertou sobre a chacina. "Muitas mortes foram evitadas. Mas eu poderia, sim, ter salvado mais vidas", disse.

"Penso que se ele tivesse sido abordado antes de entrar no colégio, essas mortes não aconteceriam. Mas também não tínhamos como saber quais eram as intenções dele. Seria mais uma ocorrência de porte ilegal de armas", afirmou Alves, que prefere não entrar em detalhes sobre a falta de rigor na legislação, mas faz uma crítica implícita. "Ele seria preso por porte ilegal. Em 15 dias, estaria solto, infelizmente. Mas pelo menos as crianças não morreriam".

O policial militar afirma que inicialmente o fato narrado por Alan parecia ser o de uma briga entre alunos. No entanto, ao se deslocar pela rua Jardim Novo e observar a intensa movimentação na rua Bernardino de Mattos, onde está situado o colégio Tasso da Silveira, viu que se tratava de algo muito pior. "O clima era de total desespero", lembra.

Alves conta que só conseguiu chegar em casa às 4h do dia seguinte à tragédia. "A primeira coisa que fiz foi ver o meu filho. Pensei nele no momento em que entrei na primeira sala de aula onde estavam as crianças mortas. Acariciei a cabeça do meu filho, ele acordou e disse: 'Pai, estou orgulhoso de você'. Também fiz questão de olhar a minha filha dormindo, mas ela não acordou. Fiquei preocupado com a segurança deles após a tragédia", disse.

O policial ganhou do comando da PM uma semana de folga para se recuperar do trauma e aproveitou para viajar com a família para Rio das Ostras, no litoral. "Nos primeiros dias, eu não conseguia dormir. As lembranças não deixavam, passava uma espécie de filme pela minha cabeça. Depois consegui retomar a minha vida normalmente e não tive nenhum problema psicológico", disse.

Festa no retorno ao colégio

O sargento Márcio Alves diz que não tinha intenção de retornar ao colégio Tasso da Silveira após o massacre do ano passado, porém foi convencido por professores e psicólogos da Secretaria Municipal de Educação com o argumento de que a sua visita seria produtiva para a recuperação dos alunos.

Relembre em vídeo o caso do "massacre de Realengo"

Segundo ele, todos os alunos fazem festa quando Alves volta ao Tasso da Silveira, que hoje conta com um esquema de segurança bem mais estruturado em comparação com o período anterior ao massacre. "Vou à escola pelo menos uma vez por mês e as crianças sempre me tratam com muito carinho. Fazem uma grande festa", disse.

O policial militar acredita que a comunidade escolar ainda não está totalmente recuperada do trauma, porém tem convicção de que o tempo curará as feridas. "Eles ainda estão se recuperando, são crianças, é natural que demore. Mas ainda tem muitos alunos lá precisando de um acompanhamento mais específico, alguns sequer conseguiram retornar. Teve momentos em que eu visitei o colégio e reparei na tristeza de muitos alunos. Na última segunda-feira (2), por exemplo, muitos estudantes choraram quando eu fui abraçá-los", finalizou.

 

A tragédia

No dia sete de abril do ano passado, por volta de 8h30, Wellington Menezes de Oliveira entrou na escola Tasso da Silveira, em Realengo, da qual era ex-aluno, dizendo que iria apresentar uma palestra. Já em uma sala de aula, o jovem de 23 anos sacou a arma e começou a atirar contra os estudantes. Segundo testemunhas, o criminoso queria matar apenas meninas.

Wellington deixou uma carta com teor religioso, onde orientava como queria ser enterrado, e deixou sua casa para uma associação de proteção de animais.

O ataque, sem precedentes na história do Brasil, foi interrompido após um sargento da Polícia Militar, avisado por um estudante que conseguiu fugir da escola, balear Wellington na perna. De acordo com a polícia, o atirador se suicidou com um tiro na cabeça após ser atingido. Wellington portava duas armas e um cinturão com muita munição.

Doze estudantes morreram --dez meninas e dois meninos-- e outros 12 ficaram feridos no ataque.