Topo

No Rio, manifestantes acusam polícia de uso excessivo da força durante protestos

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, No Rio

21/06/2013 02h46

Jovens que participaram do protesto contra a tarifa do transporte público no Rio de Janeiro, nesta quinta-feira (20), ficaram encurralados por pelotões da Polícia Militar em bares da Lapa e de outros pontos do centro da capital fluminense.

Segundo o estudante Lucas Pereira, que ficou preso em um restaurante por cerca de 1h30, agentes da Tropa de Choque e do Bope lançaram bombas de gás lacrimogêneo "a esmo", inclusive em ambientes fechados.

A reportagem do UOL flagrou o momento em que estudantes que gritavam palavras de ordem foram surpreendidos com três granadas de efeito moral, na avenida Mem de Sá, na Lapa. Mesmo com a situação aparentemente controlada, explosões ainda são ouvidas na região.

"Tudo começou quando o Bope e o Choque, do nada, passaram na Mem de Sá tacando bombas. As pessoas que estavam nos bares começaram a vaiar e a jogar garrafas em direção aos policiais. Os bares fecharam com as pessoas lá dentro, mas eles continuaram tacando bombas. Havia muita garrafa de cerveja quebrada no chão", disse Pereira.

O confronto na avenida Mem de Sá teve início por volta de 22h, na versão do estudante. Os jovens, segundo ele, não estavam mais protestando, e sim reunidos nos diversos bares ao longo da via.

Pelo menos dois blindados do Bope, veículos conhecidos popularmente pela alcunha de "caveirão"", circulavam pelas ruas da Lapa, o que assustou a portuguesa Andreia Ferreira, residente no Brasil há quatro meses. Ela participou pela primeira vez da onda de protestos gerada a partir da insatisfação popular com o aumento da tarifa de ônibus.

"Pareciam tanques de guerra. Achei demasiada a ação da polícia, parecia que eles queriam assustar as pessoas com esses blindados. Acho que lá em Portugal a gente não tem nem tanque. Não era para tanto", disse Andreia, levada à 5ª DP (Gomes Freire) porque um amigo brasileiro que a acompanhava na passeata foi detido por carregar uma placa de sinalização de trânsito.

"Fomos parados por dois policiais descaracterizados, que começaram a perguntar porque ele estava com aquela placa que indicava limite de velocidade de 50km/h. Sendo que ele tinha achado no chão da [avenida] Presidente Vargas, e resolveu, por brincadeira, que a levaria para casa. Por isso estamos aqui", afirmou Andreia.

Já um fotógrafo, que preferiu não se identificar, relatou ter "enfiado a cabeça no freezer" para aliviar os efeitos do gás de pimenta, enquanto estava em um bar próximo à avenida Presidente Vargas, em um local conhecido como Balança Mas Não Cai.

Segundo o fotógrafo, assim como teria ocorrido na Lapa, os policiais militares encurralaram civis em ambientes fechados com bombas de efeito moral e disparos de bala de borracha.

"A gente estava com crianças, idosos, pessoas jogando baralho, enfim, um clima absolutamente normal até a polícia chegar. Primeiro eles chegaram já lançando bombas e depois recuaram um pouco, depois que um oficial foi lá conversar conosco. Mas, do nada, eles voltaram a tocar bombas, inclusive no lugar onde estavam os próprios colegas. Quando eu fui lá negociar acabei levando spray de pimenta no rosto. Tive que voltar correndo para o bar e colocar a cabeça no freezer", disse.

Protesto

Após a chegada de cerca de 300 mil pessoas ao prédio da prefeitura do Rio de Janeiro, alguns manifestantes que se aproximaram demais da cavalaria da Polícia Militar entraram em confronto com os PMs às 19h. Bombas de efeito moral foram lançadas pelos policiais e houve muita correria no local. Manifestantes jogaram pedras nos policiais e colocaram fogo em sacos de lixo. Segundo a Secretaria Municipal do Rio, 62 pessoas ficaram feridas e foram encaminhadas ao Hospital Souza Aguiar --ao menos três atingidos por balas de borracha, um policial militar e dois guardas municipais.

Policiais do Bope (Batalhão de Operações Especiais) cercaram todo o quarteirão onde fica a prefeitura. Segundo um agente que preferiu não se identificar, apenas em um das ruas do entorno há cerca de 100 PMs. O efetivo total não foi divulgado pela corporação, mas há homens de vários batalhões.

Um carro da equipe de reportagem do "SBT" no Rio de Janeiro foi totalmente incendiado na Praça Onze. A emissora informou, ao vivo, que nenhum funcionário ficou ferido no incidente. Um jornalista da "Globonews" foi ferido na cabeça por uma bala de borracha.

Policial à paisana usa arma de fogo em protesto no Rio

Após a dispersão na sede da prefeitura, os manifestantes começaram a se deslocar em direção ao Maracanã, mas encontraram um bloqueio do Batalhão de Choque e foram recebidos por balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo.

Na Lapa, a rua Mem de Sá, com a maior concentração de bares do bairro boêmio, foi totalmente tomada por policiais do Batalhão de Choque e do Bope.

As pessoas que optaram por deixar o protesto no início do confronto saíram da manifestação sem pânico e cantando o hino nacional a plenos pulmões.

O auxiliar de marceneiro Cléber Tavares, 23, disse que foi atingido na confusão. "Jogaram uma pedra ou um pedaço de madeira que atingiu minha cabeça. Fiquei tonto", contou ele que foi atendido por um grupo de voluntários.

O professor André Oliveira, 31, contou que estava próximo à prefeitura quando a confusão começou. Ele estava em cima de um viaduto que liga a acenda Presidente Vargas e a Praça da Bandeira. "De onde eu estava, não deu para ver se houve vandalismo. O que eu vi foi uma chuva de bomba de gás lacrimogêneo. O choque foi subindo o viaduto e nós corremos para o outro lado, que também tinha choque", afirmou. "Só tinha família ali. Ficamos 15 minutos encurralados, até eles irem embora e a gente conseguir sair."

O último protesto na cidade, que ocorreu na segunda-feira (17) e terminou com a depredação da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) e policiais e manifestantes feridos, reuniu 100 mil pessoas. Por volta das 18h30, a passeata chegou à prefeitura da cidade, onde era aguardada pela cavalaria da PM, Batalhão de Choque, Guarda Municipal e homens da Força Nacional de Segurança. Manifestantes soltaram fogos em frente ao prédio e gritavam para os policiais: "Você aí fardado também é explorado".

Alerta para atentados

O governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), recebeu uma ligação telefônica do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, na qual tomou conhecimento de que a facção criminosa Comando Vermelho poderia cometer atentados terroristas durante a passeata.

Segundo a assessoria do governador, os principais alvos da facção, cujos membros estariam infiltrados entre os manifestantes, são Palácio Guanabara (sede do governo do Estado), a Prefeitura do Rio e a Assembleia Legislativa. O Palácio Guanabara foi cercado por grades.