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Quebra de sigilo telefônico por 'comissão anti-vandalismo' criada por Cabral é 'inconstitucional', diz especialista

Gil Alessi

Do UOL, em São Paulo

23/07/2013 14h21Atualizada em 23/07/2013 17h55

A Comissão Especial de Investigação de Atos de Vandalismo em Manifestações Públicas, o Ceiv, criada pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), e anunciada no Diário Oficial nesta segunda-feira (22), é ‘inconstitucional e tem alma ditatorial’, diz especialista.

De acordo com a lei, que passa a valer a partir de hoje, a comissão pode solicitar a quebra do sigilo telefônico e de internet de suspeitos. As operadoras tem até 24h para atender à demanda.

“A quebra dos sigilos sem a chancela do poder Judiciário é um atentado à democracia. A Ciev ignora a tradição do direito penal liberal, isso é inconstitucional”, diz Bernardo Santoro, advogado e diretor do Instituto Liberal.

"Caberá à Ceiv tomar todas as providências necessárias à realização da investigação da prática de atos de vandalismo, podendo requisitar informações, realizar diligências e praticar quaisquer atos necessários à instrução de procedimentos criminais com a finalidade de punição de atos ilícitos praticados no âmbito de manifestação públicas", diz o artigo 2 do decreto.

Artigos da lei também garantem que as solicitações da comissão --composta por representantes do Ministério Público do Estado do Rio, da Secretaria de Segurança do Estado e das polícias Civil e Militar-- aos órgãos públicos tenham “prioridade absoluta em relação a quaisquer outras atividades da sua competência ou atribuição.”

“Dar prioridade de investigação para crimes de vandalismo é um absurdo. Todo crime tem que ser investigado, independente de onde seja cometido, não existe hierarquia para crimes. Fazer isso introduz um componente político para a investigação criminal, o que é inaceitável”, afirma  Bernardo.

Segundo o texto, os chefes das instituições indicarão os integrantes da comissão, que será composta "por tantos membros quantos por elas considerados necessários". A presidência da comissão caberá a um dos representantes do Ministério Público, indicado pelo Procurador-Geral da Justiça.

Procurada, a assessoria de imprensa do governador ainda não se pronunciou.

Teles dizem não ter acesso a dados espionados

Em nota, o SindiTelebrasil (Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal) afirmou que "mesmo nas quebras de sigilo realizadas em casos específicos, por ordem judicial, as teles não têm acesso ao conteúdo das comunicações, que são de conhecimento apenas da autoridade policial ou do representante do Ministério Público, conforme disposto na determinação do juiz."

"Nesse sentido, qualquer ato ilícito, como compra e venda de dados dos clientes, sem o consentimento dos mesmos, é repudiado pelas prestadoras. Esse tipo de comércio ilegal é crime e penaliza não apenas o cliente mas também a operadora, que é vítima de fraude.", enfatiza o sindicato.

 

Protestos

A comissão foi anunciada pelo governador depois dos protestos da quarta-feira (17), quando uma manifestação na rua onde ele mora terminou em confronto com a polícia.

Bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha foram usadas para dispersar os manifestantes, 15 pessoas foram detidas e ao menos quatro PMs ficaram feridos. Agências bancárias, lojas e pelo menos uma banca de jornal foram depredadas.

Na ocasião, ele disse que "a comissão dará maior efetividade às investigações que é o que a sociedade deseja. Estamos respondendo à sociedade, diante da indignação e da perplexidade com atos que aconteceram".

Ontem (22), com a chegada do papa Francisco à cidade para participar da Jornada Mundial da Juventude, mais protestos tomaram o Rio. Duas pessoas foram presas, cinco, autuadas, um menor foi apreendido e ao menos seis pessoas ficaram feridas depois de um confronto entre policiais e manifestantes, nas imediações do Palácio Guanabara, segundo balanço final da Polícia Civil.

Um dos presos foi liberado após pagar mil reais de fiança, enquanto o outro - Bruno Ferreira Telles, acusado de jogar um coquetel molotov sobre policiais - segue na 9ª DP, no Catete. Entre os feridos está um fotógrafo japonês da AFP (Agência France Press), que foi golpeado na cabeça por um policial com um cassetete.

Prisões

O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro denunciou hoje à Justiça dois homens por vandalismo durante as manifestações no dia 17 de junho, em frente à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, e no dia 20 de junho, em frente à prefeitura. O Ministério Público também pediu a prisão preventiva dos acusados para garantia da ordem pública.

(Com Agência Brasil)