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Paulistanos dizem que água é cortada cada vez mais cedo

Vinícius Segalla

Do UOL, em São Paulo

12/09/2014 17h01

A falta de água nas residências da cidade de São Paulo não é novidade há pelo menos três meses. Em julho, o número de queixas de cortes no abastecimento na capital bateu recorde, segundo relatório da Agência Reguladora de Saneamento e Energia de São Paulo (Arsesp). Já no mês passado, pesquisa do Instituto Datafolha mostrou que a falta de água na torneira de casa era um problema que já vinha atingindo 35% dos paulistanos.  

Segundo relatos de consumidores ao UOL, o problema, tudo indica, ficou maior, com o desabastecimento ocorrendo cada vez mais cedo.

Antes, o corte no fornecimento ou redução na quantidade de água fornecida por hora ocorria a partir de 22h ou 0h. Agora, a redução ou corte começa mais cedo, por volta das 20h. 

Reservatórios de água na Grande SP

Confira entre quais reservatórios se divide o abastecimento de água na Grande São Paulo

Raio-x dos sistemas

Outro problema detectado é que, em locais onde só faltava água uma vez por semana, agora falta duas ou até três vezes a cada sete dias. Há, ainda, os locais onde os problemas de fornecimento ainda não tinham chegado, e que agora estão sofrendo com a falta de água.

A Sabesp, empresa estatal responsável pelo fornecimento de água, afirma que não existe qualquer tipo de racionamento na cidade.

Ao UOL, a empresa solicitou o envio dos endereços de cada um dos locais detectados em que há problemas de fornecimento, para que fosse verificado qual era o problema, classificado como "pontual" (vazamento, cano quebrado, etc) pela empresa.

Veja o relato de paulistanos com problemas de abastecimento de água.

 

"Decidimos fazer um racionamento decente por conta própria"

"No dia 30 de agosto, a água foi cortada meia-noite e só voltou 11h. Voltou com uma pressão muito baixa. A vazão normal é de 4,5 mil litros por hora. No dia 31, chegou a apenas 1.000 litros por hora. Quando deu 18h, o abastecimento foi cortado novamente. Nos dias seguintes, continuou a mesma coisa.

Ligamos na Sabesp para saber qual era o problema, nos disseram que tinha uma obra na região, mas não contaram que obra era essa, e disseram que a situação iria ser normalizada no dia seguinte, o que não ocorreu.

Então, fizemos uma assembleia do condomínio e decidimos fazer um racionamento decente por conta própria, um racionamento privado. Então, para que não falte água totalmente para ninguém, agora é assim: agua durante o dia todo, só deixamos no banheiro do lavabo, para emerg~encia. Na cozinha, tem água das 8h às 12h30 e das 23h às 5h. Nos banheiros, tem água das 23h às 8h e das 18h às 20h30.

Assim, garantimos uma condição razoável de vida, já que, em setembro, o fornecimento de água até agora está sendo de metade do normal".

André J., síndico de um prédio da rua João Moura, em Pinheiros, zona oeste de São Paulo


"Paramos de regar o jardim. Algumas plantas morreram, mas ainda temos água"

"Aqui no prédio, temos água da caixa d´água para abastecer os apartamentos e água da rua para as torneiras do térreo e da garagem. Desde segunda-feira (8), a água desapareceu dessas torneiras a partir das 20h, e só volta no dia seguinte, às 8h. Daí, no dia seguinte, aquela pressão da água, quando voltou, estourou o nosso hidrômetro. Vieram consertar na quinta (11).

Desde que a crise de água piorou, no começo do ano, não lavamos mais as garagens, calçadas e áreas comuns. Apenas varremos esses locais, sem água. Também mudamos a política com nosso jardim. Antes, regávamos o jardim três vezes por semana. 

Quando começou o problema, passamos a regar uma vez por semana, e só quando não chove! Quando chove, não regamos. Algumas plantas morreram, é radical demais regar só uma vez por semana, com este calor. Mas, pelo menos, ainda temos água." 

Marília H., subsíndica de um condomínio na rua Casa Forte, no bairro da Água Fria, zona norte da capital

 

"Não tenho água para o banho depois do futebol"

"Na minha casa, a água perdia muita pressão desde maio, a partir da meia-noite, e só voltava ao normal na manhã seguinte. Ficava tão pouca água que não dava para tomar banho quente nessa hora, porque não tinha água suficiente dentro do chuveiro para acionar a resistência.

Já nessa semana, desde segunda-feira (8), a água começa a sumir da torneira já por volta das 19h, 19h30. Resultado, quando vou jogar futebol após o trabalho, não tenho onde tomar banho quente quando eu volto. Tenho que escolher entre banho frio e com pouca água, dormir sujo ou tomar banho na casa de alguém antes de voltar para casa."

Daniel G., morador de uma casa na rua Rodrigo Lobato, bairro de Sumarezinho, zona oeste da cidade 

 

"Racionamento acabou com nossas válvulas"

"Na semana passada, houve um corte de água que atingiu nosso condomínio, que durou até a caixa d'água esvaziar. Quando a água voltou, veio com tal pressão que destruiu os sistemas dos vasos sanitários em dois dos 12 apartamentos, provocando vazamento e nos deixando três dias com quase nada de água.

Quando a situação se normalizou, ou achamos que tinha se normalizado, começou a faltar água de novo, à noite, só voltando no dia seguinte."

Yara C. moradora de um condomínio na rua General Góis Monteiro, no bairro de Sumarezinho

 

"Vou fazer minhas próprias reformas"

"Na minha casa, desde o começo do ano que eles (Sabesp) racionam o fornecimento durante a noite. Nessa semana, porém, a coisa ficou muito pior, chega muito pouca água já a partir das 19h.

Em casa, a água quente é da rua e a fria é da caixa. Andei até tomando uns banhos gelados em dias que não estavam tão frios e não tinha como dormir sem banho, depois de jogar bola, por exemplo. Eu tenho filho pequeno, eu e minha esposa temos que nos organizar para dar banho cedo, porque não vamos dar banho gelado no menino.

Tudo ficaria mais fácil se a Sabesp nos informasse a verdade sobre o racionamento, assim poderíamos nos organizar melhor. Mas, como não é assim, eu, como governador da minha casa, pretendo fazer investimentos em infraestrutura para tentar solucionar o problema: mudar o encanamento, instalar uma segunda caixa d'agua, captar água da chuva, por que a previsão é de que isso aí só vai piorar, não é?"

Thomas P, morador de uma casa na rua Acácio Vasconcelos, no Parque Jabaquara, zona sul de São Paulo

"Puxei um cano por cima do telhado"

Trabalho com serigrafia, minha casa e meu ateliê são no mesmo imóvel. A caixa d'água serve os quartos, mas a cozinha e o ateliê só tinham água da rua. Faz dois meses que falta água todas as noites aqui, às vezes a partir das 20h, às vezes a partir das 21h... Eu fiz um encanamento por fora da casa, tive que furar a parede do prédio vizinho, passar o cano por cima do telhado, para trazer a água da caixa para a cozinha.

Já faz dois meses que estamos convivendo com isso. Eu poderia investir em uma obra mais estrutural, ou deixar de trabalhar em casa, mas como tomar uma medida mais séria sem saber até quando irá o problema? Quando ligo para a Sabesp, eles dizem que não há racionamento, mas o funcionário que faz a leitura sempre fala, "tem racionamento, sim".


Renato L. morador de uma casa na Bela Vista, região central de São Paulo


"No fim de semana, fico louca com a sujeira na cozinha"

Na minha casa, moramos eu, meu marido, dois filhos adolescentes e um cachorro. Há dois meses, falta água pelo menos uma vez por semana. Mas falta o dia inteiro. Começa a faltar à noite e só vai voltar no fim da tarde do dia seguinte. Quando falta água, já sabemos que a louça vai acumular no dia seguinte, e nada de lavar o quintal.

De umas três semanas para cá, começou a faltar duas vezes por semana, e na última semana faltou água por três dias. No fim de semana, quando estão todos em casa, meus filhos às vezes trazem amigos para cá, fico louca com a sujeira da minha cozinha.

Rose S., moradora da rua Jureia, na Chácara Inglesa, zona sul da capital


Leia, abaixo, a íntegra da nota da Sabesp enviada ao UOL como resposta aos motivos da falta de água nas torneiras dos paulistanos:

"Não há racionamento ou restrição de consumo em nenhuma das 364 cidades atendidas pela empresa no Estado de São Paulo. Mesmo diante da pior seca da história, a companhia garante o abastecimento da população. Para isso, tomou as seguintes medidas:

- Em 1º de fevereiro, foi criado o programa de bônus: clientes abastecidos pelo Sistema Cantareira que economizarem 20% no consumo ganham 30% de desconto no valor da conta. Em 1º de abril, o programa foi expandido para os 31 municípios da RMSP que são operados pela Sabesp, atendendo, então, aos clientes abastecidos por outros sistemas. A partir de 1º de maio, clientes de mais 12 cidades da Região Bragantina e da Região Metropolitana de Campinas, que são atendidas pela Sabesp, passaram a contar com o benefício;

- Aumento nas ações de controle de perdas, que já fizeram o índice cair, contribuindo para o máximo aproveitamento dos volumes acumulados nas represas;

- Uso de 182,5 bilhões de litros de água da reserva técnica das represas Jaguari/Jacareí e Atibainha, que compõem o Sistema Cantareira, desde 15 de maio. A Sabesp já solicitou – e está sob análise dos órgãos reguladores – mais 100 bilhões de litros, que serão utilizados apenas se for necessário;

- Avanço dos sistemas Alto Tietê, Guarapiranga, Rio Claro e Rio Grande para atender bairros que são originalmente abastecidos pelo Cantareira.

A Sabesp pede os endereços dos imóveis que apontam falta de água para verificar o que acontece e dar uma resposta adequada aos moradores."