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Zeladores nordestinos usam vivência na seca para captar água para paulistas

Camila Neumam

Do UOL, em São Paulo

19/02/2015 06h00

“Fomos criados com cisterna, sem água encanada e nem por isso a gente morreu. Essa água a gente bebia, se banhava... Por que hoje não podemos aproveitar a água de poço para lavar, usar nos vasos sanitários [em São Paulo]?”, diz o baiano Admilson Santana, 49, que criou um sistema de captação de água da chuva em um condomínio de Higienópolis, bairro na zona oeste de São Paulo.

Zelador do prédio Rio Piracicaba há 16 anos, Santana instalou o encanamento para levar a água que cai do telhado até um poço com capacidade para 30 mil litros localizado no subsolo. O poço, que antigamente recebia água de uma mina, estava desativado. A vivência na construção de cisternas e um curso de encanador lhe deram conhecimentos para o trabalho elogiado pelos moradores.

Água de chuva para... os moradores

A água da chuva então usada para limpar as áreas externas e regar o jardim, hoje está sendo poupada para ser usada pelos condôminos em um futuro próximo. O motivo: a crise hídrica em São Paulo.

Para não faltar água para os moradores dos 28 apartamentos de 220 a 240 metros quadrados, com quatro banheiros cada, o baiano do pequeno município de Crisópolis (BA), de 21 mil moradores, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), lava esporadicamente o amplo saguão do edifício e a calçada. “Agora é só varrendo. Se piorar, vou lavar mesmo só daqui uns seis meses”, diz.

Prevendo o rodízio de água, Santana já estuda armazenar mais água da chuva em duas caixas d' água a serem instaladas no pergolado de concreto no térreo. Segundo ele, o consumo das quatro caixas d'água do prédio, de 35 mil litros cada uma, dura até quatro dias.

“Com o racionamento não vai ter água entrando nas caixas, então os moradores poderão pegar a água do poço para usar na limpeza da casa, dos banheiros, e reservar a água potável para lavar a louça, para o banho e para fazer uma janta. A ideia é nunca faltar água, e isso só depende deles”, diz.

Zelador tem a ‘chave’ da água

Amarai dos Santos, 43, de Heliópolis, cidade do agreste baiano, é zelador do condomínio Basileia, em Higienópolis. Sabendo como é viver com pouca água, Santos é responsável em captar o que vem da chuva no prédio onde trabalha. A água é armazenada em uma antiga piscina do edifício, que foi desativada nos anos 1970, e hoje está enterrada no subsolo do prédio.

“No nordeste usar água de chuva é comum. A minha família mesmo fazia captação de água de chuva. Todo mundo tinha uma biqueira em casa para isso”, diz.

É o administrador do condomínio, como é conhecido, que abre e fecha o registro quando começa a chover e quem fiscaliza a vazão de água nas calhas e nos ralos que foram instalados no terraço do prédio, onde somente ele tem a chave de acesso.

“Temporais são bem-vindos, pois ajudam a encher a piscina de 55 mil litros. Temos quatro torneiras para usar essa água, mas ela é usada para lavar as garagens, áreas comuns e regar o jardim. Se os moradores precisarem, é só pedir e vir pegar nas quatro torneiras de acesso”, diz.