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Atendimento de graça a animal de pessoa carente é vetado no interior de SP

Fabiana Marchezi

Colaboração para o UOL, em Campinas

02/02/2016 16h56

O médico veterinário Ricardo Fehr Camargo foi proibido pelo Conselho Regional de Medicina Veterinária de São Paulo (CRMV-SP) de atender gratuitamente animais de pessoas carentes em sua clínica, em São Carlos (255 quilômetros de São Paulo). 

O veto foi comunicado no último sábado (30) e provocou revolta nas redes sociais depois que o veterinário publicou um vídeo revelando o caso. Segundo o órgão, o atendimento gratuito só é autorizado em casos de pesquisa, ensino e utilidade pública. O atendimento gratuito ocorrido em clínica particular não é considerado utilidade pública pelo conselho.

De acordo com Camargo, foram atendidos gratuitamente cerca de 50 animais em dois sábados. Entretanto, no último dia 30 de janeiro, uma fiscal do CRMV-SP foi até a clínica e determinou a suspensão dos atendimentos, informando que o veterinário iria responder a um processo interno, caso não cumprisse a determinação.

“A fiscal disse que o que eu estou fazendo não é de utilidade pública porque não está vinculado à nenhuma entidade sem fins lucrativos e que eu teria de parar de atender porque estava ferindo o Código de Ética. Eu achava que era utilidade pública, não sabia que para isso precisaria estar vinculado a uma entidade”, explicou o veterinário.

A ideia de Camargo surgiu em meio às várias consultas domiciliares que fez em bairros mais pobres. “Eu sempre tive vontade de ajudar e a cada consulta domiciliar em áreas mais vulneráveis essa vontade aumentava. Eu via que as pessoas precisavam não só de atendimento para seus animais, mas de outros cuidados especiais, como noções básicas de manuseio, higiene. E isso aumentou minha vontade de ajudar.”

Os atendimentos gratuitos aos sábados, que estão temporariamente suspensos, só aconteciam depois que as famílias cadastravam seus animais e passavam por uma triagem para comprovação da condição social.

“Como eu percebi que aos sábados o movimento na clínica era tranquilo, decidi abrir as portas para atender essas pessoas. E não vou parar, já estou em contato com meu advogado e contador para criar uma ONG e poder atender segundo as exigências do conselho”, explicou.

Ele também admitiu que recebeu uma multa para regularizar a situação de sua clínica, que estaria sem registro no CRMV-SP por questões burocráticas. “Meu registro como veterinário está regular, tudo normal. Só a clínica que está irregular por falta de preenchimento de uma papelada. Mas tenho 30 dias para resolver isso.”

 

No vídeo, divulgado nas redes sociais pelo veterinário, aparece a fiscal explicando que esse tipo de atendimento só pode ser feito por entidades sem fins lucrativos. Ela também entregou a ele um manual com o código ético da categoria, ressaltando que os veterinários não podem prestar serviços gratuitos ou abaixo do preço de mercado.

No post do vídeo, Camargo escreveu: “Vamos fazer esse vídeo virar um abaixo-assinado mostrando que o que pretendo fazer é de utilidade pública. Vamos continuar lutando por um mundo melhor para os animais”. Às 15h desta quarta-feira (2),  o abaixo assinado online já contava com mais de 28 mil assinaturas - o objetivo é atingir 30 mil.

'Questão ética'

Em nota, o CRMV-SP citou que o estabelecimento veterinário estava funcionando de forma irregular, "não possuindo registro neste órgão de classe, assim como averbação de médico veterinário responsável técnico".

A nota reconhece que o veterinário é registrado e que “deve, por isso, seguir toda a legislação pertinente à atuação profissional, notadamente o Código de Ética Profissional, que proíbe a prestação e divulgação de serviços gratuitos, exceto em casos de pesquisa, ensino ou utilidade pública”.

O comunicado explicou também que “ações de utilidade pública são aquelas realizadas por entidades sem fins lucrativos como, ONGs, instituições públicas ou entidades e empresas a elas conveniadas, tendo total apoio deste órgão de classe quando a sua finalidade estiver vinculada ao atendimento de animais carentes”.

Ainda na nota, o conselho lamentou que “profissionais que estão no mercado desconheçam a legislação que ordena o exercício da profissão”. E ressaltou que continuará “zelando pelo bom nível do exercício profissional, em respeito à sociedade e a todos os colegas que atuam de acordo com o Código de Ética, estando atento para tomar todas as medidas cabíveis no presente caso”.