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Cotidiano carioca: 9 pessoas baleadas e 32 tiroteios por dia

Militares fazem treinamento do esquema de segurança na cidade para os Jogos Olímpicos Rio 2016 - Nilson Soares/Futura Press/Estadão Conteúdo
Militares fazem treinamento do esquema de segurança na cidade para os Jogos Olímpicos Rio 2016 Imagem: Nilson Soares/Futura Press/Estadão Conteúdo

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

29/07/2016 06h00

Uma cidade que registra nove pessoas baleadas diariamente e 32 tiroteios por dia. Poderia ser o cenário de um lugar onde há uma guerra civil, como na Síria. No entanto, isso ocorre na segunda maior cidade brasileira, que sediará os Jogos Olímpicos, um dos maiores eventos do mundo.

O cenário casa bem com um protesto até certo ponto inusitado: há algumas semanas, um grupo de policiais ganhou as manchetes dos jornais nacionais e internacionais ao receber os turistas que chegavam ao Rio de Janeiro pelo aeroporto internacional Antônio Carlos Jobim, o Galeão, com uma faixa em que se lia "Welcome to hell" ("Bem-vindo ao inferno"). Em protesto pelo atraso no pagamento dos salários da categoria, o texto alertava, em inglês: qualquer um que chegar ao Rio de Janeiro não estará a salvo.

Apesar de o ato ter como foco o atraso dos salários da categoria, quitado apenas depois que um aporte extraordinário do governo federal garantiu o pagamento na íntegra dos vencimentos dos trabalhadores de segurança pública da cidade em função das Olimpíadas, o protesto chama a atenção para uma realidade da capital fluminense: o aumento dos índices de violência.

Entre janeiro e maio de 2016, as quatro principais emergências municipais e a cinco principais emergências estaduais da cidade do Rio de Janeiro atenderam, juntas, 1.320 casos de pessoas vítimas de ferimentos causados por armas de fogo, segundo dados das secretárias de saúde do município e do Estado -- cerca de nove atendimentos por dia. 

O número é 24,4% a maior que o registrado em 2015, quando 1.059 pessoas procuraram as emergências devido a ferimentos causados por armas de fogo entre janeiro e maio, e representa cerca de 12% dos atendimentos do gênero realizados em todo o país. No mesmo período, de acordo com o Ministério da Saúde, foram realizados 11.037 atendimentos ambulatoriais e internações devido a perfurações por arma de fogo.

De acordo com o aplicativo Fogo Cruzado, criado pela Anistia Internacional e que cruza informações sobre tiroteios e/ou disparos de arma de fogo na capital fluminense e na região metropolitana recebidas por moradores com dados das forças policiais, apenas nas três primeiras semanas de julho ocorreram, em média, 32 tiroteios por dia na cidade. 

Para o sociólogo Ignacio Cano, pesquisador do Laboratório de Análise de Violência da da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), o aumento “não é surpresa” frente ao crescimento geral da violência na cidade. “Os números para este ano estão todos muito ruins”, afirma.

Ele atribui o aumento ao momento economicamente ruim do Estado em conjunto a impossibilidade de contratar policiais em horários de folgas. E a tendência é piorar. “O cenário para depois das Olimpíadas é preocupante”, afirma.

Problema financeiro

De acordo com a Secretária de Segurança do Rio de Janeiro, o Estado vem tomando as providências necessárias para a diminuição da violência na cidade e foram quitados no dia 6 de julho os salários de junho dos servidores ativos e inativos, além de pensionistas dos profissionais de segurança pública. No total, o valor líquido corresponderia a R$ 694 milhões. O pagamento ocorreu após a liberação do aporte do governo federal.

Procurada pelo UOL, a Polícia Militar informou ainda que "busca aprimorar constantemente o policiamento empregado nas ruas" e que "adota medidas para reduzir a incidência criminal no Estado".

A oito dias das Olimpíadas, o Estado sofre com a falta de recursos e quitou os salários de servidores, aposentado e pensionistas apenas após o depósito de R$ 2,9 bilhões da União, conseguido após o governador Francisco Dornelles (PP-RJ) decretar estado de calamidade pública em decorrência da crise financeira.

No decreto de calamidade, o governador justificou a medida frente ao temor de um "total colapso na segurança pública, na saúde, na educação, na mobilidade e na gestão ambiental" devido à falta de recursos.

O ministro da Defesa, Raul Jungmann, declarou nesta sexta-feira (15) que deve promover um arrocho nas medidas de segurança para o público durante os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos do Rio de Janeiro. Entre as medidas anunciadas, está um adicional de 3.200 homens das Forças Armadas, que se unirão aos mais de 21 mil militares já designados para a cidade do Rio durante os Jogos Olímpicos.

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AFP