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Após absolvição de acusados por cratera no Metrô, irmã questiona: 'Quem é o culpado?'

Vista aérea da cratera aberta após desabamento nas obras do metrô em Pinheiros (SP), que matou sete pessoas - Tuca Vieira/Folhapress
Vista aérea da cratera aberta após desabamento nas obras do metrô em Pinheiros (SP), que matou sete pessoas Imagem: Tuca Vieira/Folhapress

Nivaldo Souza

Colaboração para o UOL, em São Paulo

18/11/2016 12h55

A voz embarga e, em seguida, surge o som do choro ao telefone. Ivonete Agostinho da Silva, 65, a dona Nana, se emociona ao falar do irmão Cícero. O contínuo foi uma das sete vítimas fatais do acidente no então canteiro de obras da estação Pinheiros do Metrô (linha 4-amarela), em janeiro de 2007. Ela critica a decisão da 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), que absolveu os acusados pelo acidente. “Eles destruíram a minha família”, afirma.

O Ministério Público pedia a responsabilização de 14 pessoas entre técnicos do Metrô e executivos do Consórcio Via Amarela, formado pelas construtoras OAS, Queiroz Galvão, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez. Em junho deste ano, contudo, a juíza de primeira instância Aparecida Angélica Correia decidiu pela absolvição de 14 acusados. A 7ª Câmara manteve a decisão da magistrada nesta quinta-feira (17).

A dona de casa lamenta a decisão da juíza de primeira instância. “Se essa juíza tivesse passado pelo que a minha família está passando, ela não daria uma sentença dessas. Quem é o culpado? Ela é a culpada? Eu sou a culpada?”, questiona Nana.

O acidente é a maior tragédia da história do metrô paulista. Às 14h54 da sexta-feira de 12 de janeiro de 2007, conforme laudo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), o lado Faria Lima do túnel que corre por baixo do leito do rio Pinheiros desabou.

Uma cratera com 80 metros de diâmetro e 36 metros de profundidade surgiu na rua Capri, engolindo dois carros, seis caminhões e um micro-ônibus com quatro pessoas. Todas morreram, além do motorista de um caminhão e de duas pessoas que passavam pela rua, entre elas Cícero.

Segundo Nana, o acidente abalou toda a família. A mãe dela e de Cícero morreu de infarto. Em menos de um ano, outro irmão e um sobrinho morreram após mal súbito. “Minha mãe morreu de desgosto, porque o Cícero era o filho que ela mais adorava. Por aquele acidente, perdi também meu irmão mais velho e meu sobrinho, que veio dos Estados Unidos para o enterro da minha mãe e morreu de repente”, diz.

Velocidade

A 7ª Câmara do TJ-SP ratificou o argumento de primeira instância, que alegou que os técnicos não tinham como prever o acidente. A decisão venceu por 2 votos a 1.

O desembargador Freitas Filho foi o voto vencido. Ele sustentou que o processo continha provas de que o acidente ocorreu "por falhas do projeto e da execução da obra" e que os técnicos desconsideraram o “quadro de instabilidade e aumento do ritmo e velocidade das detonações" com dinamite para escavar o túnel do metrô.

Na decisão de julho, a juíza afirmou que "o plano de emergência foi colocado em prática e de maneira eficiente, o que se verificou por meio das provas realizadas".

O Relatório Técnico 99.642.205, produzido depois do acidente pelo IPT, porém, apontou falhas no sistema de evacuação de emergência no canteiro de obras.

“Mais de 10 a 15 minutos se escoaram entre os primeiros indícios e as manifestações do colapso. (...) Nenhuma ação de evacuação de moradores e fechamento do tráfego local foi tomada. O resultado da falha do plano de ações de emergência é o acidente da estação Pinheiros da linha 4-amarela do Metrô de São Paulo, que, além do colapso estrutural do túnel-estação sentido Faria Lima, amplia consideravelmente suas consequências, como danos e prejuízos materiais de vulto e, lamentavelmente, sete vítimas fatais”, registrou o relatório na página 341.

Protesto em janeiro

O advogado de defesa dos acusados, Antonio Claudio Mariz de Oliveira, afirmou durante a sessão da 7ª Câmara que nem todas as tragédias têm culpados. “Se é obra de Deus, se é obra do destino, se é o azar, não se sabe. Mas nem sempre, quando há uma fatalidade, quando há morte, quando há um desastre, quando há uma tragédia, é preciso que haja culpados. O imponderável está presente nas nossas vidas.”

O aposentado Celso Alembert, 77, pai do funcionário público morto no acidente Márcio Alembert, discorda do argumento da defesa. “Alguém tem de ser responsável. Será que diante de tudo o que aconteceu essa tragédia vai passar impune? Parece que a Justiça no Brasil não existe para os pequenos, os menos poderosos”, diz.

Celso entrou com novo pedido de indenização contra o Consórcio Via Amarela. Ele pede R$ 100 mil. O consórcio pagou indenização para a mulher de Márcio, que estava no micro-ônibus. A mulher dele e a filha do casal, hoje com 12 anos, se mudaram para o interior paulista. “Dinheiro nenhum vai devolver a vida do meu filho, mas isso é uma forma de punir os culpados”, afirma.

O pai de Márcio pretende mobilizar familiares de outras vítimas da tragédia em um protesto contra a decisão da justiça. O ato deve ocorrer em 12 de janeiro, quando se completam 10 anos do acidente na estação Pinheiros. “Eu penso que devemos fazer um encontro para lembrar”, diz.