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Dois lados de um protesto: avenida de quartel em Vitória vira "Faixa de Gaza"

7.fev.2017 - PMs observam de dentro do quartel o confronto entre familares e moradores contrários à paralisação da polícia - Paula Bianchi/UOL - Paula Bianchi/UOL
PMs observam de dentro do quartel o confronto entre familares e moradores contrários à paralisação da polícia
Imagem: Paula Bianchi/UOL

Paula Bianchi

Do UOL, em Vitória

07/02/2017 17h07Atualizada em 07/02/2017 19h22

De um lado, familiares de PMs acampados em frente ao principal quartel de Vitória; do outro, moradores de favelas vizinhas, contrários ao movimento que desde sábado (4) impede a saída dos policiais para patrulhamento por todo o Espírito Santo.

Os dois grupos transformaram, nesta terça-feira (7), a avenida Maruípe, em uma pequena Faixa de Gaza, controlada pelo Exército sob os olhares atentos dos PMs que permaneciam dentro do batalhão.

Enquanto as famílias dos PMs seguiam acampadas em frente ao quartel bloqueando as saídas, um pequeno grupo de moradores de favelas vizinhas passou a se reunir do outro lado da rua, acompanhando a movimentação.

Por volta das 16h, o grupo cresceu e tomou uma das faixas da avenida, ateando fogo a uma barricada improvisada formada por pneus e entulho. Eles gritavam palavras de ordem como “queremos segurança” e “vão lavar roupa” e pediam o fim da paralisação das forças policiais.

Conforme a situação se agravava, aumentava o número de PMs sem farda no local. Do alto do quartel, policiais de uniforme observavam a cena. Por volta das 17h, o Exército chegou.

Os militares foram aclamados pelos dois lados da avenida --os manifestantes favoráveis à PM cantavam, em uníssono, o Hino do Soldado; os contrários gritavam ‘fora, fora, fora’, apontando para as mulheres dos policiais.

O Exército apagou o fogo da barricada e retirou as pessoas da rua, pedindo que os moradores permanecessem na calçada. Os PMs que estavam sem farda em frente ao quartel ajudaram a varrer a avenida.

 

“Para vir aqui acabar com a nossa manifestação eles vêm, mas para acabar com a deles, fazer com que a polícia volte para a rua, o Exército não serve?”, questiona Vilma Santos, que ajudou a bloquear a avenida.

Meia hora depois, os moradores contrários à paralisação se reagruparam e atravessaram a rua, atirando pedras contra as famílias dos PMs. Uma mulher, identificada apenas como Priscila, foi atingida na cabeça.

Os militares, armados com fuzis, dispersaram o grupo com spray de pimenta.

“Isso aqui é um protesto civilizado, aquilo é baderna. Estamos aqui desde sábado e não causamos nenhum problema, enquanto eles ficam colocando fogo em coisas, jogando pedras na gente”, disse uma das mulheres que bloqueiam a entrada do quartel que preferiu não se identificar.

Um agente da Polícia Civil que passava pela avenida chegou a disparar quatro vezes para cima quando teve a passagem impedida pelos manifestantes. Em vários momentos, o grupo contrário ao movimento das mulheres dos PMs tentava chegar até a frente do quartel, sendo contido pelo Exército.

Por volta das 19h os dois grupos permaneciam protestando, cada um de um lado da avenida.

Entenda a crise no Espírito Santo

No sábado (4), parentes de policiais militares do Espírito Santo montaram acampamento em frente a batalhões da corporação em todo o Estado. Eles reivindicam melhores salários e condições de trabalho para os profissionais

Desde então, sem patrulhamento nas ruas, uma onda de violência tomou diversas cidades. 

A Justiça do Espírito Santo declarou ilegal o movimento dos familiares dos PMs. Segundo o desembargador Robson Luiz Albanez, a proibição de saída dos policiais caracteriza uma tentativa de greve por parte deles.

A Constituição não permite que militares façam greve. As associações que representam os policiais deverão pagar multa de R$ 100 mil caso a decisão seja descumprida.

A ACS-ES (Associação de Cabos e Soldados da Polícia Militar e Bombeiro Militar do Espírito Santo) afirma não ter relação com o movimento. De acordo com o cabo Thiago Bicalho, do 7º Batalhão da Polícia Militar do Estado e diretor Social e de Relações Públicas da associação, os policiais capixabas estão há sete anos sem aumento, e há três anos não se repõe no salário a perda pela inflação.

Segundo o secretário estadual de Segurança Pública, André Garcia, as negociações sobre salários e condições de trabalho de policiais serão feitas apenas quando o patrulhamento na rua for retomado e a situação estiver controlada.

O ministro da Defesa, Raul Jungmann, disse nesta segunda (6) em Vitória que militares das Forças Armadas ficarão no Espírito Santo durante o "tempo necessário" para que a ordem no Estado seja restabelecida.