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O que a morte de um jovem revela sobre segurança em cartão-postal do Rio

Homem apanha de banhistas após tentar roubar bolsa na praia de Ipanema - Hermes de Paula / Agência O Globo - 4.jan.2017 - Hermes de Paula / Agência O Globo - 4.jan.2017
Homem apanha de banhistas após tentar roubar bolsa na praia de Ipanema
Imagem: Hermes de Paula / Agência O Globo - 4.jan.2017

Gustavo Maia

Do UOL, no Rio

07/03/2017 04h00Atualizada em 07/03/2017 09h18

Mortes violentas como a do estudante Daniel Barbosa da Silva Gomes, 20, atingido por uma facada durante um assalto na noite do último sábado (4), não costumam acontecer em Ipanema, na zona sul do Rio de Janeiro.

Em janeiro, último mês com estatísticas criminais disponíveis, nenhum dos 186 crimes letais registrados na cidade –no Estado, foram 600-- ocorreu no bairro, um dos principais cartões-postais cariocas. Não à toa, a notícia deste fim de semana acendeu um sinal de alerta, evidenciando um cenário de insegurança crescente em uma das áreas mais valorizadas da capital fluminense.

Daniel Gomes, morto ao ser esfaqueado após reagir a um assalto na praia de Ipanema, no Rio - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
O estudante Daniel Gomes, morto em Ipanema
Imagem: Reprodução/Facebook

No sábado, Daniel tinha ido à praia num bloco de Carnaval com amigos. À noite, eles estavam num quiosque próximo ao Posto 9, quando oito pessoas os cercaram para roubá-los. Segundo testemunhas, o grupo reagiu ao assalto, houve um tumulto, e um amigo de Daniel foi agredido. O jovem interveio e levou uma facada nas costas.

O Corpo de Bombeiros foi acionado por volta das 23h30 para socorrer Daniel. Quando eles chegaram ao local, ele já estava morto. O sepultamento está previsto para esta terça-feira (7).

A reportagem do UOL foi ao local do crime na tarde desta segunda (6) e percorreu diversas ruas de Ipanema. Leia a seguir os fatores apontados por quem frequenta o bairro para explicar a insegurança à beira-mar:

Ladrões não temem a polícia

6.mar.2017 - Posto 9, em Ipanema, na zona sul do Rio de Janeiro, onde um jovem de 20 anos morreu após receber uma facada nas costas - Gustavo Maia/UOL - Gustavo Maia/UOL
Posto 9, em Ipanema, na zona sul do Rio, um dia após morte de estudante
Imagem: Gustavo Maia/UOL

“Deu sol na praia, tem roubo”, resume um comerciante que trabalha num quiosque próximo ao Posto 9 e pediu para não ser identificado, por temer ser vítima de eventuais represálias. “Hoje, os ladrões parecem mais inteligentes que a polícia.”

Para o manobrista de um restaurante que fica a quatro quadras da praia, que também pediu anonimato, os criminosos “perderam totalmente o respeito pelos policiais”. “Eles estão muito desinibidos, muito ousados. Quando tem PM perto, basta virar o rosto para atacarem”, afirmou. “E eles sabem que se forem pegos, daqui a pouco voltam para a rua”, completou.

Segundo comerciantes ouvidos pela reportagem, nos últimos meses a ação dos assaltantes têm encontrado maior resistência por parte de alguns frequentadores da praia, conhecidos como "justiceiros". "Quem está correndo atrás de ladrão são os próprios banhistas. Polícia só aparece para evitar que o ladrão morra nas mãos dos justiceiros".

Policiamento é escasso na área

É consenso entre os entrevistados pelo UOL: o policiamento em Ipanema está insuficiente e irregular. A redução em relação ao efetivo de verões passados, contam, é significativa tanto na orla quanto nas vias internas do bairro. “É muito difícil passar polícia por essas ruas aqui de dentro. Ficam muito desertas. Piorou muito do ano passado pra cá”, diz o manobrista.

A ausência de policiais na praia foi notada por duas turistas australianas que viajaram ao Rio na semana passada para aproveitar o Carnaval. "Ouvimos falar que era perigoso, por isso esperava ver policiais por aqui”, conta Scarlet Robertson, 20, de Melbourne. “No fim de semana, vimos alguns”, afirma a amiga, Matilda Stevens, 20.

Procurada pela reportagem para comentar as reclamações, a Polícia Militar informou, em nota, que “o patrulhamento é realizado com rondas em viaturas, motos, bicicletas e a pé, além de viaturas baseadas ao longo da orla e nos acessos aos bairros”. Durante as três horas em que percorreu o bairro, na tarde desta segunda, a reportagem não encontrou nenhum PM ou veículo policial.

Moradores estão receosos

Moradora de Ipanema há 34 anos, uma psicóloga que não quis se identificar contou que passou a evitar andar na rua à noite e até mesmo à tarde. “Com essa crise, tem gente te abordando a cada esquina. Eu ando com medo”, declarou.

Os tiros disparados por PMs durante uma tentativa de assalto no início do ano, na rua onde vive, são lembrados por ela como um dos motivos para o aumento do receio em sair de casa.

“Uma morte dessa [de Daniel] afeta o movimento. Com essa insegurança, um casal de namorados que poderia vir para o quiosque à noite, por exemplo, acaba ficando em casa”, lamenta um comerciante.

Número de roubos cresce 48%

A quantidade de roubos registrados em Ipanema --referentes às ocorrências na área de atuação da 14ª Delegacia de Polícia (Leblon), que também inclui o bairro vizinho -- aumentou 48% no último trimestre disponível, em relação ao mesmo período anterior.

Entre novembro de 2016 e janeiro desse ano, o total de roubos denunciados à polícia foi de 314. Entre novembro de 2015 e o primeiro mês do ano passado, foram 212 casos. Considerando apenas roubos a pedestres, o aumento foi de 40,7% -- 113 a 159 ocorrências.

Em 2016, Ipanema teve seis crimes com morte, dois a mais que no ano anterior.