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STF adia julgamento para transexual mudar gênero em documentos sem cirurgia

Curto de la Torre/AFP
Imagem: Curto de la Torre/AFP

Felipe Amorim

Do UOL, em Brasília

22/11/2017 16h11Atualizada em 22/11/2017 18h31

Um pedido de vista do ministro Marco Aurélio Mello interrompeu nesta quarta-feira (22) o julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal) de uma ação sobre se transexuais podem alterar o nome e o gênero nos documentos de registro civil sem a exigência de que se submetam a uma cirurgia de mudança de sexo.

O ministro pediu vista quando o julgamento havia alcançado um placar de cinco votos, entre os 11 ministros, a favor de que não seja necessário a exigência de cirurgia de mudança de sexo para que transexuais possam alterar o primeiro nome e o gênero na documentação oficial de identificação.

Votaram nesse sentido os ministros Dias Toffoli, relator do processo, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber.

Toffoli afirmou que a liberdade do indivíduo não pode ser restringida sem que haja uma justificativa prevista na Constituição Federal.

"Afirmo que qualquer tratamento jurídico discriminatório sem justificativa constitucional razoável e proporcional importa limitação à liberdade do indivíduo e ao reconhecimento de seus direitos como cidadão", afirmou o ministro.

“Não há como se manter um nome em descompasso com a identidade sexual reconhecida pela pessoa, que é aquela que efetivamente gera a interlocução do indivíduo com sua família, com a sociedade, tanto nos espaços privados, quanto nos espaços públicos”, disse.

Em seu voto, o ministro defendeu que a alteração precisa ser autorizada por meio de um processo judicial.

"O transexual, comprovada judicialmente sua condição, tem direito fundamental subjetivo à alteração de seu prenome e de sua classificação de gênero no registro civil", disse Toffoli.

"Condicionar a mudança no registro à cirurgia representaria adotar a inadequada visão de que a vivência da identidade de gênero se resume à genitália”, disse o ministro Barroso. "Nós estamos contribuindo para a superação desse preconceito”, afirmou o ministro.

O STF retomou nesta quarta-feira o julgamento de dois processos onde deve ser decidido se transexuais podem alterar o nome no registro civil sem a realização de cirurgia de mudança de sexo.

Hoje, decisões do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) reconhecem o direito à alteração do nome e do gênero por transexuais, mas uma decisão sobre o tema do STF, instância máxima do Judiciário, teria mais força para orientar futuras decisões em cartórios e tribunais de todo o país.

Toffoli é relator no STF de um recurso contra decisão da Justiça do Rio Grande do Sul, que negou autorização para que um cartório local alterasse o gênero na identificação civil de um transexual.

O ministro também votou contra a solução adotada pela Justiça do Rio Grande do Sul, que determinou que fosse anotado o termo “transexual” no registro civil do autor do pedido. Para Toffoli, essa medida provoca “descriminação” e “exclusão” e, portanto, não deve ser adotada.

O ministro foi o primeiro a proferir seu voto. Os outros dez ministros do STF ainda não votaram nesta ação. A ação de inconstitucionalidade apresentada pela PGR deve ser julgada depois desse processo.

Hoje, é necessário que os transexuais (pessoas que se identificam com o gênero oposto ao sexo de nascimento) entrem na Justiça para conseguir mudar o nome e o registro do gênero. Como não há uma lei que regulamente a questão, o andamento do processo depende de cada juiz. É comum ser exigido o depoimento de testemunhas e laudos psicológicos para atestar a condição de transexual.

Segundo advogados que atuam com o tema, tem se tornado mais comum que a Justiça conceda a alteração no registro sem exigir que o transexual tenha feito a cirurgia de mudança de sexo, mas em muitos casos o requisito ainda é um obstáculo imposto pelo Judiciário à obtenção do direito.

A cirurgia para mudança de sexo é uma intervenção médica feita para que a região genital adquira as feições do sexo oposto. O procedimento pode ser feito pelo SUS (Sistema Único de Saúde) desde 2008, por maiores de 21 anos.