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Caso Marielle: polícia investiga se suspeitos presos são pistoleiros de milícia

Luis Kawaguti

Do UOL, no Rio

24/07/2018 14h37Atualizada em 24/07/2018 18h11

A Delegacia de Homicídios da Capital investigará se dois suspeitos de ligação com as mortes da vereadora Marielle Franco (PSOL) e Anderson Gomes, presos na manhã desta terça-feira (24), atuavam como pistoleiros de uma milícia que age na zona oeste do Rio de Janeiro. A polícia diz já ter evidências que os ligam aos assassinatos de um policial militar e um ex-PM.

O policial militar reformado Alan Nogueira e o ex-bombeiro Luiz Claudio Ferreira Barbosa foram indiciados hoje pelos assassinatos de José Ricardo da Silva e Rodrigo Severo em 25 de fevereiro de 2017.

Segundo o delegado Willians Batista, Nogueira e Barbosa são integrantes de uma milícia chefiada por Orlando Oliveira de Araújo, o Orlando Curicica. A organização age na zona oeste carioca cobrando taxas de “proteção” ao estilo mafioso e comercializando irregularmente serviços de TV a cabo e gás em regiões de favela.

O advogado Leonardo Lopes negou o envolvimento de Nogueira com a milícia, com os assassinatos do PM e do ex-PM e nas mortes de Marielle e Anderson. “Ele nunca participou de nada e nega totalmente [as acusações da polícia]”, disse. 

Os advogados de Barbosa optaram por não dar declarações à imprensa.

“Eles foram apontados como membros da organização criminosa de maneira estável e permanente. Então é natural que em qualquer homicídio ou outro crime que, por ventura, seja atribuído a essa organização, eles também serão investigados”, disse o delegado.

Segundo Batista, ainda é cedo para afirmar se eles estavam entre os principais pistoleiros do bando, mas essa é uma das linhas de investigação da Polícia Civil.

Nogueira foi policial militar e acabou indo para a reserva após ser baleado em um confronto com criminosos. Ele tem passagens pela polícia por porte ilegal de arma, ameaça e agressão. Batista já respondeu pelo crime de homicídio e foi expulso do Corpo de Bombeiros.

O elo entre as mortes do PM e ex-PM e o caso Marielle é uma testemunha considerada chave pela polícia. Esse delator, cuja identidade vem sendo preservada, disse aos investigadores que os suspeitos presos pelas mortes do PM e ex-PM também teriam participado do atentado contra a parlamentar carioca.

O jornal “O Globo” informou nesta terça-feira que Nogueira teria estado em um dos carros usados na emboscada que matou a vereadora e seu motorista, conforme relato do delator. A informação, que será investigada, também foi relatada ao UOL por fonte policial.

Mas, como a polícia não tinha evidências suficientes para prendê-los pelo ataque à vereadora, os mandados de prisão temporária de 30 dias cumpridos nesta terça foram baseados em uma investigação que estava mais avançada: a das mortes do PM e do ex-PM José Ricardo da Silva e Rodrigo Severo.

Milicianos assassinados teriam traído chefe do bando

Essa investigação começou a avançar consideravelmente há cerca de três meses, quando a testemunha-chave, que foi ligada ligada à quadrilha de Orlando Curicica, deu informações sobre os dois assassinatos.

Segundo o delegado Batista, as vítimas Silva e Severo também faziam parte do bando. “As duas vítimas fariam parte da organização criminosa que atua na zona oeste do Rio, organização esta que é comandada pelo Orlando, vulgo Orlando da Curicica. E o Orlando acreditava que as duas vítimas estariam preparando o chamado ‘golpe de Estado’, estariam traindo o Orlando naquele grupo miliciano”, disse o delegado.

Os dois teriam então sido atraídos para uma falsa festa em um sítio em Guapimirim, na região metropolitana, e assassinadas pelos suspeitos supostamente a mando de Curicica. A testemunha deu detalhes de como e onde eles foram mortos. Essas informações foram confirmadas depois por análises periciais.

As principais evidências encontradas no caso foram imagens de câmeras de segurança que mostram um Honda Civic, supostamente usado pelos pistoleiros, acompanhando o carro onde estavam os corpos das vítimas logo após os assassinatos. O veículo foi levado para um local isolado e incendiado com os corpos dentro.

As imagens mostram o carro dos suspeitos acompanhando o veículo onde estariam os corpos a uma distância de dois segundos. O Civic também foi filmado em diversas áreas próximas do local onde o carro com os cadáveres foi incendiado. Esse veículo seria, segundo a polícia, o mesmo que foi apreendido com Nogueira nesta terça-feira.

“Eles [suspeitos] serão ouvidos e assim como houve esse trabalho de confirmar o que a testemunha tinha falado [no caso das mortes do PM e do ex-PM] também está sendo feito e continuará sendo feito [trabalho semelhante] no caso Marielle com relação à prisão desses dois”, disse o delegado.

Nogueira e Barbosa devem, a partir de agora, prestar depoimento sobre suposto envolvimento no ataque à vereadora, ocorrido no dia 14 de março no centro do Rio.

Defesa de ex-PM diz ter álibi

No final da tarde de hoje, o advogado Rafael Rangel afirmou que Nogueira tem um álibi para a noite dos assassinatos de Marielle e Anderson.

“Temos material documentado para provar a não participação do meu cliente no momento do crime”, afirmou. Ele disse que a defesa apresentará comprovantes de uso de cartões de crédito em estabelecimentos longe do crime para tentar provar a inocência de Nogueira.

“Vejo isso [prisão de Nogueira] como uma forma de resposta para a sociedade que precisa de uma resposta para um crime tão bárbaro. E alguém tem que ser colocado como culpado”, afirmou.

O defensor disse ainda que o cliente está sendo mantido sob custódia e não teria prestado depoimento à polícia até o fim da tarde desta terça-feira e estaria sendo mantido isolado em uma sala. Rangel disse entender que a situação seria uma forma de pressionar seu cliente para dizer algo que não quer falar. Até o fechamento da reportagem, a polícia não havia comentado as afirmações.

O advogado disse que uma das estratégias da defesa será tentar anular a acusação apontando supostas falhas no procedimento policial. Ele disse que algumas delas seriam a suposta dificuldade de acesso aos advogados e um depoimento que Nogueira teria prestado há um mês sem a presença de defensores.