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Engenheiros investigados por tragédia em Brumadinho atuaram em 35 barragens

Imagem mostra momento exato do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG) - Reprodução
Imagem mostra momento exato do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG) Imagem: Reprodução

Leandro Prazeres

Do UOL, em Brasília

23/02/2019 04h00

Dois engenheiros da empresa alemã Tüv Süd, investigados pelo rompimento da barragem em Brumadinho (MG), atuaram em 35 estruturas semelhantes em todo o Brasil. Dessas, 31 são consideradas de dano potencial alto, ou seja, em caso de rompimento, os estragos humanos e materiais serão altos.

O levantamento foi feito pelo UOL com base em dados da ANM (Agência Nacional de Mineração). Para o MPMG (Ministério Público de Minas Gerais), Vale e Tüv Süd montaram um conluio para maquiar a situação da barragem de Brumadinho.

A Tüv Süd é uma das empresas contratadas pela Vale e outras mineradoras para fazer a análise sobre a estabilidade de barragens de rejeito de minério.

Após o rompimento da barragem em Brumadinho, dois engenheiros da Tüv Süd foram presos pela Polícia Civil de Minas Gerais: Makoto Namba e André Jum Yassuda.

Os dois foram responsáveis pela declaração de estabilidade da barragem de Brumadinho, emitida em setembro de 2018. O rompimento em Brumadinho deixou pelo menos 177 mortos e 133 pessoas desaparecidas.

Dados da ANM indicam que, além da barragem de Brumadinho, Makoto Namba e André Jum Yassuda atuaram em outras 34 barragens.

No cadastro do SIGBM (Sistema Integrado de Gestão de Segurança de Barragens de Mineração), mantido pela ANM, os nomes dos dois engenheiros aparecem como técnicos responsáveis pela declaração de estabilidade das estruturas ou pelos laudos de revisão dessas declarações.

A dupla atuou na análise da estabilidade de cinco das dez barragens que a Vale avaliou como sendo as mais críticas entre as que ela mantinha em Minas Gerais: Norte/Laranjeiras, em Barão dos Cocais; Forquilhas I e II, ambas em Ouro Preto; Menezes II e a barragem I, ambas em Brumadinho.

Esse grupo de dez barragens foi classificado pela Vale como dentro do que chamou de "alarm zone" (zona de alerta). Documentos internos da companhia mostravam que, desde outubro de 2018, ela tinha conhecimento que esse conjunto de dez estruturas tinha mais chances de se romper que as outras barragens da empresa.

Os documentos só vieram a público depois do início das investigações sobre o rompimento da barragem em Brumadinho.

Veja o momento do rompimento da barragem

UOL Notícias

Empresa no centro das investigações

Respeitada internacionalmente, a Tüv Süd entrou no centro das investigações sobre a tragédia em Brumadinho porque foi a empresa responsável por atestar a estabilidade da barragem.

O sistema de monitoramento da segurança das barragens de minério no Brasil é do tipo autodeclaratório. Isso significa que as donas dessas estruturas contratam empresas privadas para fazerem a avaliação sobre os níveis de segurança das barragens.

Após a análise dos técnicos dessas empresas, os dados são repassados o SIGBM. A ideia é que, sempre que um problema for detectado pelas empresas de análise, o SIGBM seja informado para que as autoridades possam entrar em ação e evitar desastres.

O que as investigações das polícias Civil e Federal e da ANM querem saber é: como uma represa cuja estabilidade havia sido informada meses antes se rompeu sem que as autoridades tivessem nenhuma indicação de que ela tinha problemas?

As suspeitas sobre a forma de atuação da empresa aumentaram depois que o engenheiro Makoto Namba disse em depoimento que se sentiu pressionado por funcionários da Vale para assinar uma declaração de estabilidade referente à barragem de Brumadinho.

Detalhes sobre como os funcionários da empresa eram submetidos a pressões da Vale ficaram ainda mais explícitos depois que e-mails trocados por Makoto Namba e outros funcionários da Tüv Süd vieram a público na semana passada.

Em maio de 2018, o engenheiro enviou um e-mail a seus colegas dizendo que, embora as análises iniciais referentes à barragem de Brumadinho indicassem problemas na estrutura, ele sabia que a Vale iria pressioná-lo.

"A primeira resposta que será dada é que os estudos ainda serão auditados [...] portanto, os resultados mostrados não são definitivos [...] mas como sempre a Vale irá nos jogar contra a parede e perguntar: e se não passar, irão assinar ou não", afirmou.

Na avaliação do promotor William Coelho, do MPMG, o trabalho da Tüv Süd na declaração de estabilidade da barragem de Brumadinho está sob suspeição.

"Alguns funcionários [da Vale] participaram ativamente de um conluio para dissimular a situação crítica da barragem com a empresa Tüv Süd", disse na semana passada.

Em nota sobre o assunto, a Vale disse que "está colaborando plenamente com as autoridades e permanecerá contribuindo com as investigações para a apuração dos fatos, juntamente com o apoio incondicional às famílias atingidas".

Outro lado

Procurado, o gerente de segurança de barragens da ANM negou que o fato de Makoto e Yassuda terem atuado em Brumadinho coloque em xeque a situação das outras barragens onde eles trabalharam. "Isso só aconteceria se houvesse judicialização", disse. 

A reportagem do UOL enviou questionamentos à Tüv Süd sobre a atuação de Makoto Namba e André Jum Yassuda, mas a empresa se limitou a dizer que "não pode comentar sua relação com clientes".

A reportagem também enviou questionamentos aos advogados de Namba e Yassuda, Augusto Botelho, mas até a última atualização desta reportagem, as perguntas ainda não haviam sido respondidas.