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O que explica as fortes chuvas e a baixa temperatura no Sudeste

Morador de Realengo, no Rio, observa estragos causados após fortes chuvas que atingiram estados do Sudeste - José Lucena/Futura Press/estadão Conteúdo
Morador de Realengo, no Rio, observa estragos causados após fortes chuvas que atingiram estados do Sudeste Imagem: José Lucena/Futura Press/estadão Conteúdo

Lucas Borges Teixeira

Colaboração para o UOL, em São Paulo

03/03/2020 14h54Atualizada em 03/03/2020 14h54

Resumo da notícia

  • Alto volume água é reflexo de um fenômeno chamado Zona de Convergência do Atlântico Sul
  • Pontuais, temporais chamam atenção por causa das tragédias
  • Chuva forte é a causa para queda na temperaturas na região

Tem sido um ano chuvoso no Sudeste. Janeiro bateu recorde de 110 anos de volume de chuvas em Minas Gerais, São Paulo teve o fevereiro mais chuvoso de 77 anos e, em 12 horas, a Baixada Santista registrou o volume de chuva esperado para março.

Apesar dos recordes, meteorologistas afirmam que este volume de chuva não é tão estranho no verão e que é a causa para as baixas temperaturas na região. Os temporais são pontuais, mas chamam atenção por causa das tragédias que geram, uma questão recorrente neste período do ano no Brasil.

Segundo informações da Climatempo Consultoria, este alto volume de chuvas é reflexo de um fenômeno chamado Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS). Junto a outros episódios de convergência de ventos, o ZCAS forma corredores de umidade que saem do Norte, na região amazônica, rumo a Centro-Oeste e Sudeste. Isso gera "fortes e persistentes áreas de instabilidade sobre estas regiões".

Apesar da intensidade da chuva bater recordes, os especialistas explicam que este fenômeno não é tão estranho assim. "A natureza é cíclica. Nós, meteorologistas, até brincamos que fazia tempos que não víamos o ZCAS, mas ele não é tão raro quanto parece", afirma Jonas Ribeiro, da Somar Meteorologia.

Segundo ele, a corrente de umidade vinda da região amazônica somada a uma frente fria estacionária que desembarcou no Sudeste, em especial sobre a região litorânea, tem causado estes picos de chuva. Ele ressalta, no entanto, que são pontuais e, em grande parte, típicos do verão.

"A frente fria já deixa o tempo instável, vem umidade da Amazônia e a chuva fica persistente por um período de tempo maior. A questão, neste ano, é que massa de ar frio foi extremamente intensa e está persistindo", explica Ribeiro. "Na configuração do que está ocorrendo, [o volume de chuva] não é tão estranho, embora chame atenção do senso comum."

Volume de chuvas já era previsto, o problema são as tragédias

Este volume elevado de chuvas já estava previsto e deve de ser visto como eventos pontuais — o que faz chamar atenção são as repetidas tragédias e os danos causados à população.

"[Picos de chuva] são características do verão: chove muito pontualmente e de forma mal distribuída. Enquanto em um ponto específico apresenta um alto volume, em outros lugares não chove nada", afirma a meteorologista Naiane Araújo, do INMET (Instituto Nacional de Meteorologia). "Você experimenta isso especialmente em grandes centros urbanos, capitais."

"Todo verão chove mais, é uma estação chuvosa para maior parte do país. Tem eventos, embora pontuais, que superam a média e, então, tem tragédias, pois as cidades mudaram muito, as populações mudaram, cresceram nas encostas, diminuiu a permeabilidade do solo. Isso tudo chama atenção [para as chuvas]", afirma Araújo.

"É o que vimos em Minas, depois São Paulo, agora no Rio e na Baixada [Santista]: eventos extremos não são tão raros, mas esse tipo de chuva muito volumosa e intensa infelizmente penaliza as pessoas em áreas de risco", diz Ribeiro.

Alto volume de chuvas também explica baixas temperaturas

Você também acha que tirou o casaco mais cedo do armário neste ano? Não é um sinal dos tempos, é culpa do tempo nublado. A conta é simples: quanto menos o sol penetra, menor a sensação térmica.

"A chuva age como um termorregulador. Quando há muita nebulosidade, bastante nuvem no céu e chove, a temperatura é menor. Em especial a temperatura máxima, que é registrada à tarde. Ela é mais impactada porque o período com sol foi reduzido", explica Araújo, do Inmet.

"A temperatura mínima, no começo da manhã, não [sofre tanta alteração]. Tanto que estamos tendo algumas manhãs abafadas, mas, à tarde, como não há aquele tempo aberto, a temperatura não dispara", conclui a meteorologista.
Resquício da Antártida?

Uma das questões levantadas é o aumento da temperatura na Antártida, que, em fevereiro deste ano, apresentou temperaturas recorde. Isso impactaria também no nosso clima?

Segundo Ribeiro, da Somar, ainda é difícil dizer. "Eu não sou especialista em Antártida, mas ela tem uma dinâmica muito específica, que pode estar ligada à mudança [de temperatura] no globo inteiro, mas se influencia diretamente na América do Sul não dá para bater o martelo", avalia o especialista.

Ele explica que o Brasil é diretamente impactado pelos fenômenos El Niño e La Niña, que ocorrem na região do oceano Pacífico Equatorial. "Mas agora não está ocorrendo nenhum dos dois, está em neutralidade, o que significa que não influenciaram nestas chuvas", diz Ribeiro.

Pode esperar mais chuva para março

De acordo com a Climatempo, as regiões Sudeste e Centro-Oeste devem continuar com picos de chuvas elevadas, pois os corredores de umidade continuam a se formar, mas um pouco mais ao norte.

"Todo o estado de SP, do RJ e triângulo mineiro ficam com chuva entre a média e ligeiramente abaixo. Nas outras áreas da Região, incluindo as capitais BH e Vitória, a chuva fica acima da média", informa a consultoria meteorológica.

A região Sul deverá continuar seca e quente, enquanto a região Norte e o norte da costa nordestina deverão experimentar chuvas abundantes.