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Fundadora de projeto de balé de Manguinhos morre em decorrência da covid-19

Daiana Ferreira, 32, fundadora do projeto social Ballet Manguinhos - Ana Maria Silva/Ballet Manguinhos
Daiana Ferreira, 32, fundadora do projeto social Ballet Manguinhos Imagem: Ana Maria Silva/Ballet Manguinhos

Marcela Lemos

Colaboração para o UOL, no Rio de Janeiro

19/01/2021 11h32

A Fundadora do projeto social Ballet Manguinhos, no Rio, Daiana Ferreira, morreu ontem aos 32 anos. Diagnosticada com covid-19, a diretora, fundadora e professora do programa, que ficou conhecido internacionalmente após uma reportagem do jornal "The New York Times", sofreu uma parada cardíaca e não resistiu. Daiana foi internada na sexta-feira (15) e intubada no dia seguinte.

Centenas de moradores da comunidade manifestaram luto nas redes sociais pela perda de Daiana, que foi nascida e criada na favela localizada na zona norte da cidade.

Ao UOL, Edna Corrêa disse que a irmã chegou a trabalhar em quatro locais para conseguir manter o projeto funcionando com dinheiro do próprio bolso.

"A favela cria sua própria cultura e a ideia era levar para a favela o que não havia lá, pois a cultura que é de fora, a favela não conhece. Minha irmã chegou a trabalhar em quatro empresas diferentes para manter o balé funcionando e a gente brincava que ela era diretora, professora, secretária, até que em 2018 veio o patrocínio."

O Ballet Manguinhos foi criado em 2012 e começou a oferecer aulas de balé para crianças e adolescentes em uma igreja na comunidade, que fica localizada na zona norte da cidade.

O projeto já passou por seis endereços. Ele começou no pátio de uma igreja na favela, foi transferido para um centro cultural na região e depois foi para a Biblioteca Parque de Manguinhos. Posteriormente, as aulas precisaram ser transferidas para o espaço conhecido como Casa do Trabalhador, depois para a Fiocruz, e hoje permanece em um espaço alugado com patrocínio e ajuda de apoiadores.

"Isso mostra a persistência da minha irmã. É a pessoa mais persistente que conheci na vida. Ela fazia do programa a vida dela", disse Edna.

Até 2019, o programa atendeu mais de 3.000 crianças e adolescentes. Em 2016 foi aberta uma turma para as mães das bailarinas inscritas. As aulas atendiam mães e filhas no mesmo horário.

Homenagens na internet

Após a página da escola publicar uma nota de pesar sobre o luto de Daiana, a publicação recebeu centenas de mensagens de carinho e admiração pelo trabalho da bailarina, que começou a praticar balé com 14 anos.

"Fica meu reconhecimento a ela e ao Ballet Manguinhos. Através do Ballet Manguinhos, minha filha hoje faz parte da equipe júnior de nado artístico do Clube de Regatas do Flamengo." "Ela fez sua história! Gratidão!"

Já Silvia Ribeiro destacou a importância do projeto para a comunidade.

"Uma perda muito grande, que não deixem seu legado ficar esquecido, ela lutava por uma comunidade melhor através da dança, mulher negra, da favela, inteligente, humana (...)"

Ao UOL, a moradora disse que chegou a matricular a filha do Ballet Manguinhos, mas que não a menina não pôde continuar devido ao trabalho.

"Muito coerente e educada. Muitas meninas cresceram ali e fazem parte do balé até hoje. Uma oportunidade é um ganho para a favela, né? É uma escola que não fica atrás de nenhuma outra de grande nome."

Daiana desafiou o governo

Além de fundadora do Ballet Manguinhos, Daiana esteve à frente da ocupação da Biblioteca Parque da comunidade para impedir o fechamento do espaço. Em dezembro de 2016, o governo anunciou o fechamento do local por falta de verbas. Na época, o governo chegou a proibir o acesso ao local, o que provocou a ocupação.

Na ocasião, o Ballet de Manguinhos funcionava no espaço da biblioteca. O programa aliava a dança à leitura e outras atividades culturais. Com o fechamento, Daiana viu as aulas ameaçadas e ocupou o local com outros moradores. A Secretaria de Cultura resistiu ao ato, mas depois permitiu a ocupação.

Em 2018, o Governo do Estado reassumiu a responsabilidade pelo local, após um ano e quatro meses de ocupação. Na cerimônia de reabertura do espaço, Daiana e algumas alunas bailarinas fizeram uma apresentação em forma de protesto diante do então governador Luiz Fernando Pezão. As meninas permaneceram deitadas no chão, com os collants de bailarina pintados com tinta vermelha, simbolizando manchas de sangue.

"Só para mostrar que todo dia a gente sangra", disse ela durante o evento.

Após a reabertura oficial da biblioteca, hoje chamada de Biblioteca Parque Vereadora Marielle Franco, Daiana precisou deixar o local.

De luto, a família disse que o Ballet Manguinhos irá continuar.