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Urina preta: Município do Pará proíbe consumo e venda de peixes populares

Luciana Cavalcante

Colaboração para o UOL, em Belém

09/09/2021 19h20

Uma determinação da Prefeitura de Juruti, município do oeste do Pará, está dividindo opiniões e causando prejuízos para pescadores e restaurantes locais. Está proibido, por tempo indeterminado, a venda e até o consumo dos peixes pirapitinga, pacu e tambaqui, os mais populares na região.

A decisão é uma prevenção à doença de Haff, conhecida como doença da "urina preta". Desde que um caso suspeito foi notificado no município vizinho de Santarém, há duas semanas, as vendas já vinham caindo. No Pará, três casos suspeitos estão sendo investigados, sendo um em Santarém; um em Trairão e um na capital, Belém.

Em Santarém, a vítima é um homem, que morreu após apresentar sintomas compatíveis com os da doença. Nos outros dois casos, os pacientes foram atendidos e estão fora de perigo. Amostras foram encaminhadas para análise e aguardam resultado.

Juruti tem apenas uma cooperativa de pescadores artesanais, a Z-42, que reúne quase mil integrantes, que dependem desse trabalho para o sustento da família. Segundo o presidente da cooperativa, os meses de agosto, setembro e outubro são os que a pesca dessas três espécies é abundante.

"Essa é a época da pesca forte. Quem trabalha por dia, pega até trinta quilos e quem faz viagem por semana, até meia tonelada. A gente pesca de todo tipo, mas esses são os que mais vendem [os três proibidos]. Quando avisaram da proibição, muitos pescadores ficaram preocupados porque já tinham estoques grandes, que estão no gelo, e só devem durar uma semana. Aqui não temos outras formas de armazenamento", lamentou Renato de Melo.

Ainda segundo ele, o estoque de pescado armazenado varia de pescador, mas alguns podem perder até 200 quilos com a proibição. O presidente da colônia de pescadores diz ainda que a medida afetou até as vendas de outros tipos de peixe. "Quando começou a correr o boato, as pessoas ficaram com medo e não queriam mais comprar nenhum tipo de peixe".

Renato Melo, diz que a decisão de proibir a comercialização e consumo dos três tipos de pescado foi exagerada. "A gente nem sabe ainda se o nosso pescado está com essa doença e já proibiram".

Restaurantes também amargam prejuízos

Nos restaurantes, o cenário é o mesmo. Na Peixaria do Keké, o prejuízo foi de 80%. "Eu só trabalho com pescado e entre os mais apreciados está o tambaqui, que por ser um peixe gordo, servimos assado na brasa. Com a proibição, minhas vendas caíram muito. A gente até tenta convencer as pessoas a levar outros, mas muitos não querem", conta o proprietário Kledson Guimarães.

O espaço funciona para almoço e também faz entrega, mas segundo Klebson, o prejuízo começou bem antes da determinação municipal, há pelo menos duas semanas. "Logo que falaram do caso de Santarém, o povo já ficou com medo de consumir peixe e isso já foi reduzindo a nossa venda, tanto que não compramos mais pescado por isso. Quando a determinação chegou, já não tinha mais no estoque".

Como saída para tentar evitar os prejuízos, desde então o restaurante vem tentando incluir pratos com outras proteínas no cardápio como calabresa, bisteca de porco. "Mas o problema é que o peixe é mais barato e, do jeito que está, o preço da carne não dá para colocar. A gente vai aguentando até sei lá quando, mas tem que acatar a decisão".

Klebson também achou a decisão de proibir a venda dos pescados precipitada. "Na minha opinião, foi precipitado porque o caso suspeito foi em Santarém, que, apesar de ser na região, recebe pescado de Manaus. O certo era proibir a entrada do pescado de lá em Santarém". Os pescadores vão participar de uma reunião com órgãos de saúde do município para discutir a situação.

Doença de Haff

A Síndrome de Haff é provocada por uma toxina encontrada em alguns peixes como o tambaqui, o badejo e a arabaiana ou crustáceos (lagosta, lagostim, camarão), quando ele não é armazenado de forma correta. No Brasil, o local com mais concentração de casos suspeitos é o Amazonas.

Rigidez e dores musculares, dor torácica, dificuldade para respirar, dormência, perda de força em todo o corpo e urina cor de café são alguns dos sintomas, que podem aparecer entre 2h e 24 horas após o consumo do peixe contaminado. A hidratação é fundamental nas horas seguintes ao aparecimento desses sintomas.

A principal forma de prevenção é evitar o consumo de pescados ou crustáceos de origem, transporte ou armazenamento desconhecidos. Em caso de aparecimento dos sintomas, após o consumo desses produtos, procurar imediatamente uma unidade de saúde.