Topo

Rio: Como moradores e turistas reagem ao fim da obrigatoriedade de máscaras

"Em vários locais, as coisas já melhoraram e, depois, pioraram novamente", afirmou Cícero Duarte da Silva, de 70 anos - Saulo Pereira Guimarães
"Em vários locais, as coisas já melhoraram e, depois, pioraram novamente", afirmou Cícero Duarte da Silva, de 70 anos Imagem: Saulo Pereira Guimarães

Saulo Pereira Guimarães

Do UOL, no Rio

27/10/2021 16h28

A desobrigação do uso de máscaras ao ar livre na cidade do Rio de Janeiro divide cariocas —enquanto muitos já haviam abandonado o item de proteção, há quem afirme que continuará a usá-lo contra o coronavírus. Na opinião de quem manterá a máscara, a flexibilização aconteceu cedo demais e há pouca fiscalização em relação ao uso do item.

O prefeito Eduardo Paes (PSD) publicou hoje decreto que dispensa o uso obrigatório de máscaras em locais abertos. A medida passa a valer após o governador Cláudio Castro (PL) sancionar lei aprovada ontem na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), o que está previsto para acontecer amanhã. O uso de máscaras continuará a ser obrigatório em ambientes fechados e transporte público.

"Ninguém sabe o que pode acontecer. Em vários locais, as coisas já melhoraram e, depois, pioraram novamente", afirmou o aposentado Cícero Duarte da Silva, 70, que esperava um ônibus na Praça Tiradentes na tarde de ontem (26). Ele pretende não abrir mão agora do item de proteção.

Para Silva, a mudança tem como finalidade o quesito economia. "Acho que eles estão com pressa por causa do Carnaval. Não querem perder dinheiro", opinou.

Já outras pessoas ouvidas pela reportagem disseram temer que a flexibilização tenha impacto nos números da pandemia na cidade.

"Tendo que usar, as pessoas já não usam. Sem a obrigatoriedade, vai virar uma bagunça", afirmou a diarista Kelly Cristine Araújo, enquanto aguardava um ônibus para o Recreio no terminal rodoviário localizado em frente à Central do Brasil.

Universitária Mônica Couto, de 23 anos, no Terminal Americo Fontenele, no Rio - Saulo Pereira Guimarães - Saulo Pereira Guimarães
"Com mais pessoas vacinadas, o risco de uma mudança assim se torna menor", defendeu Mônica Couto
Imagem: Saulo Pereira Guimarães

Apesar das críticas, há também quem seja a favor da medida. "Como estudante de biomedicina, acho correto desobrigarem o uso da máscara em espaços abertos", defendeu a universitária Mônica Couto, 23.

"Com mais pessoas vacinadas, o risco de uma mudança assim se torna menor", afirmou.

Praia e calçadão de Copacabana

26.out.2021 - Praia de Copacabana, no Rio - Saulo Pereira Guimarães - Saulo Pereira Guimarães
Praia de Copacabana, no Rio, na tarde desta terça (26)
Imagem: Saulo Pereira Guimarães

Usada por grande parte dos passageiros de transporte público que circulam no centro, a máscara tem menos prestígio entre moradores e turistas no calçadão de Copacabana.

Nesta terça, por volta das 15h, havia nove pessoas sem proteção e quatro com nos 850 m de ciclovia que separam a avenida Princesa Isabel e o Copacabana Palace.

No calçadão, o quadro não era muito diferente. Do MIS (Museu da Imagem e do Som) ao Posto 5, por volta de 15h30, eram 34 mascarados contra 55 pessoas sem o item.

A diferença era ainda mais gritante na faixa de areia. Às 16h10, entre o MIS (Museu da Imagem e do Som) e a rua Xavier da Silveira, havia 42 pessoas sem máscaras e apenas uma protegida.

Os motivos para o desprestígio do item são os mais diversos.

"Usamos mais para atender os clientes. No calor, fica muito abafado", afirmou Karen Visarrea, 29, vendedora de máscaras que atuava no calçadão na tarde de terça.

Já uma idosa que preferiu não se identificar disse que a proteção dificulta a respiração e comemorou o fim da obrigatoriedade. "Na academia, por exemplo, é horrível. Mas acho que todos devem tomar os outros cuidados, como não aglomerar", afirmou ela, com a máscara no pulso.

Reações mais violentas à proteção são mais raras, mas existem. "Já usamos esta coleira ideológica há muito tempo e a pandemia nunca fica controlada", disse um turista de São Paulo, sem máscara, após tirar uma foto na estátua do poeta Carlos Drummond de Andrade.

"Se for seguro, acho que está certo", afirmou Solange Rocha, de Vitória (ES), sobre o fim da obrigatoriedade.

Pouca fiscalização

Durante a pandemia, houve pouca fiscalização em relação à obrigatoriedade do uso de máscaras no Rio. Várias pessoas relataram ao UOL que nunca viram ações do tipo, enquanto outras disseram que as presenciaram apenas em ambientes fechados.

"Já vi no VLT [Veículo Leve sobre Trilhos], em que os fiscais cobram e muitos passageiros usam", contou a autônoma Dione Bernardo, enquanto aguardava o bondinho na estação Saara.

Apesar da pouca fiscalização, são comuns avisos sobre a obrigatoriedade do uso de máscaras nas estações cariocas.

26.out.2021 - estação Carioca do metrô, no Rio - Saulo Pereira Guimarães - Saulo Pereira Guimarães
Na maior parada do metrô, a Carioca, há cartazes em, pelo menos, 8 pontos diferentes - além de um aviso sonoro
Imagem: Saulo Pereira Guimarães

Na Praça 15, há um aviso na entrada de acesso às barcas. Na estação Carioca do metrô, há cartazes em ao menos oito pontos diferentes, além de aviso sonoro. "Máscara não é bobagem. É uma atitude consciente de quem segue especialistas em saúde", diz a mensagem.

Em uma viagem de 28 minutos e quatro paradas entre as estações de trem Madureira e Central do Brasil no fim da manhã de ontem, 13 vendedores passaram por um dos vagões —dez estavam sem máscara e três com a proteção.

Em setembro, o UOL publicou reportagem que alertava para o grande número de passageiros sem máscaras nos trens da Supervia. À época, a concessionária informou que o papel de fiscalizar o cumprimento das medidas sanitárias cabe ao poder público.

Durante a pandemia, a prefeitura estipulou multa de R$ 562,42 para quem for pego sem máscaras na cidade. O próprio Paes chegou a ser autuado em maio após participar de roda de samba sem a proteção.

Para vendedores, máscaras farão falta

Jornaleiro Claudio Francisco, de 49 anos, em sua banca de jornal na Avenida Presidente Vargas, no Rio - Saulo Pereira Guimarães - Saulo Pereira Guimarães
"Para as vendas, a máscara foi um desafogo. Junto com o cigarro, é algo que as pessoas não conseguem ficar sem", disse Claudio Francisco
Imagem: Saulo Pereira Guimarães

Entre os camelôs que vendem máscaras, o fim da obrigatoriedade é lamentado não só pelos possíveis riscos, mas também pela provável queda nas vendas.

"A máscara sai mais que os sutiãs. O pessoal está com medo de morrer", afirmou Claudia Esclamosine, vendedora no Terminal Américo Fontenele, no centro. Segundo ela, alguns fregueses usam duas proteções ao mesmo tempo e chegam a comprar dez por semana.

"Para as vendas, a máscara foi um desafogo. Junto com o cigarro, é algo que as pessoas não conseguem ficar sem", disse o jornaleiro Claudio Francisco, 49, que trabalha na avenida Presidente Vargas, no centro.

Ele relata que, desde que a exigência da vacina para entrar em academias, estádios e outros espaços começou a valer no Rio, em setembro, as vendas vêm caindo.

O movimento também é percebido por Leidiane Teixeira, que comercializa os itens no Buraco do Lume, no centro. "No começo da pandemia, em 2020, cheguei a vender mil máscaras em um dia. Hoje, vendo 25 num dia bom", afirmou ela.

A menor procura se repete em Copacabana. "Não vamos comprar mais para vender", disse Karen.