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Moradores do Salgueiro terão reuniões em Brasília: 'PM fora de controle'

Moradores do Complexo do Salgueiro pedem paz após chacina no último final de semana - MARCOS PORTO/AGÊNCIA O DIA/AGÊNCIA O DIA/ESTADÃO CONTEÚDO
Moradores do Complexo do Salgueiro pedem paz após chacina no último final de semana Imagem: MARCOS PORTO/AGÊNCIA O DIA/AGÊNCIA O DIA/ESTADÃO CONTEÚDO

Herculano Barreto Filho

Do UOL, em São Paulo

27/11/2021 10h40

Uma comitiva formada por representantes de favelas cariocas e moradores do Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio, participará de uma série de reuniões em Brasília na próxima quarta-feira (1º) para debater a chacina que deixou ao menos nove mortos na região. A viagem é um dos assuntos de um encontro, hoje (27), na própria comunidade. Há previsão de agendas no Congresso, Senado e Judiciário.

Os corpos das vítimas de uma operação do Bope (Batalhão de Operações Especiais da PM) foram retirados pelos próprios moradores de um mangue na manhã de segunda (22). As mortes ocorreram após o assassinato de um policial, segundo relatório da polícia.

Com a chacina, o Rio passou a registrar o maior número de mortes em ações por vingança em 14 anos, aponta estudo da UFF (Universidade Federal Fluminense) a pedido do UOL.

Os encontros estão sendo organizados pela Faferj (Federação das Favelas do Rio de Janeiro), que mobilizou a reunião de hoje com cerca de 20 lideranças comunitárias. A entidade critica a impunidade e a ilegalidade das ações policiais nas favelas cariocas, já que o STF (Supremo Tribunal Federal) limitou as operações policiais desde junho de 2020 até o fim da pandemia. Apesar da proibição, a polícia matou 766 pessoas em favelas no estado, segundo dados do Instituto Fogo Cruzado.

Estamos convivendo com massacres nas favelas. A situação está insustentável. A Polícia Militar do Rio está completamente fora de controle. A violência se agravou em um cenário de impunidade, já que essas ações são apoiadas por parte da sociedade."
Historiador David Gomes, diretor da Faferj

Em entrevista ao UOL News nesta semana, Gomes fez críticas à política de segurança pública do Rio. "Ela é tão desastrosa que não garante a segurança nem dos moradores de favela nem dos policiais que participam das operações", disse na ocasião.

A chamada ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), instituída liminarmente pelo ministro Edson Fachin, limitou as ações policiais em "caráter excepcional". A ação policial que resultou na chacina no Complexo do Salgueiro acelerou o julgamento da ADPF pelo STF, que deve decidir nos próximos dias sobre as restrições a essas operações em comunidades.

Em nota, a Secretaria de Estado de Polícia Militar do Rio diz que as operações realizadas "estão rigorosamente alinhadas ao que preconiza a ADPF" ao respeitar a "excepcionalidade para o planejamento das operações".

Em Brasília, a comitiva da Faferj também irá apresentar uma série de propostas, como a implantação de câmeras nos uniformes dos policiais, já levada pela federação em reunião com o governo do Rio no começo deste mês.

OAB e entidades cobram explicações ao MP

A Comissão de Direitos Humanos da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) enviou na última quinta (25) ofício ao MPF (Ministério Público Federal) e ao MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) para pedir explicações sobre a ação policial.

O documento também cita um levantamento exclusivo do UOL, que mostra serem do Rio de Janeiro oito das dez cidades com as maiores taxas de negros mortos pela polícia, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública —São Gonçalo ocupa a quarta posição da lista.

Além da comissão, as ONGs Conectas e Justiça Global e a Associação Juízes pela Democracia também assinaram o documento. As entidades argumentam que, diante dos altos índices de violência policial, não é possível falar em "excepcionalidade" que justifique o uso da força por por agentes de segurança do Rio de Janeiro.

Laudos apontam mortes a tiros

Os laudos de necropsia dos nove civis mortos apontam que todos foram vítimas de armas de fogo. Os documentos afirmam que não há sinal de facadas ou ferimentos por outros objetos. O esfaqueamento era a principal denúncia de tortura por parte de moradores, possibilidade agora afastada.

O relatório interno divulgado pelo UOL afirma que objetivo da operação era "reprimir ações de ataque às viaturas". A PM, em nota, afirma que a equipe em que ele estava foi atacada ao chegar na comunidade. A morte de Silva foi utilizada para justificar a "absoluta excepcionalidade da operação", no documento.

Um documento interno da Polícia Militar aponta que 75 policiais do Bope estiveram no Complexo do Salgueiro entre sábado (20) e domingo (21), quando ocorreram as mortes.

A Polícia Civil, que investiga o caso, ainda não tem a identificação de todos os agentes envolvidos na operação e encaminhou pedido sobre estas informações para a Polícia Militar.