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'Era só uma entrevista, fui presa e agora tenho medo de ficar sem emprego'

Lívia Ramos de Souza, jovem que estava presa no Rio e foi solta ontem - Reprodução / Redes sociais
Lívia Ramos de Souza, jovem que estava presa no Rio e foi solta ontem Imagem: Reprodução / Redes sociais

Daniele Dutra

Colaboração para o UOL, no Rio de Janeiro

22/06/2023 04h00Atualizada em 22/06/2023 20h01

Lívia Ramos de Souza foi presa no dia 5 de junho, com outras 17 pessoas, durante uma operação policial em uma suposta falsa empresa de consórcio no Rio de Janeiro. Desde o início, a família da jovem de 19 anos disse que ela estava no local para uma entrevista de emprego. Ontem à noite, Lívia foi solta.

Relato exclusivo de Lívia ao UOL

"Foi horrível! Eu estava presa com pessoas que já estavam sentenciadas, já tinham cometido homicídios, tráfico de drogas, vários crimes. Fiquei desesperada, tive crises de ansiedade, chorava dia e noite. Eu não imaginava que aquela empresa era errada. Tinha ido só para fazer uma entrevista.

Quando cheguei na audiência [de custódia], não perguntaram nada. Eu não tive a chance de falar nada. Eu ficava com medo e ansiosa, porque as pessoas que estavam lá dentro diziam que a gente ia ficar pelo menos três meses presa.

Era tudo muito precário. Eu não conseguia comer. A comida vinha com ração, passava gato e pombo em cima, as coisas vinham pisadas. Avisamos que tinha animal em cima da comida, e as guardas nos ignoravam.

Pensava sempre na minha mãe, que disse que me tiraria de lá. Todos os dias eu orava com as meninas. Nós sempre estávamos recebendo respostas negativas, ruins, mas nada abalou a nossa fé.

Estou com medo de não conseguir arrumar um emprego. As presas falavam que eu iria ter muita dificuldade em arrumar um trabalho por ser ex-presidiária, mas a gente precisa trabalhar.

Tenho, sim, a esperança de conseguir uma oportunidade em uma empresa boa, para ter minhas coisas e ajudar minha mãe. Queria trabalhar na parte administrativa, fazer faculdade, já estava fazendo planos com a minha família. Nunca imaginei passar por isso."

O que dizem Estado e Justiça?

O UOL questionou a SEAP (Secretaria de Estado de Administração Penitenciária) sobre as críticas feitas por Lívia à comida oferecida às detentas.

A informação não procede. A SEAP informa que as unidades prisionais vistoriam, pesam e atestam a qualidade das refeições diariamente e depois repassam as informações para o sistema Alipen, por meio do qual a secretaria realiza o controle do serviço prestado pelos fornecedores. Além disso, a secretaria conta com uma comissão que vistoria os itens distribuídos em todo o sistema prisional do estado.
SEAP (Secretaria de Estado de Administração Penitenciária), em nota

O TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro) negou que Lívia não tenha sido ouvida na audiência de custódia.

Informamos que consta na assentada da audiência de custódia, realizada no dia 8 de junho de 2023, que os custodiados, além de estarem acompanhados de suas respectivas defesas técnicas, também se manifestaram."
TJ-RJ, em nota

Lívia Ramos e sua mãe Cristiane Ramos - Reprodução / Redes sociais - Reprodução / Redes sociais
Lívia Ramos e sua mãe Cristiane Ramos
Imagem: Reprodução / Redes sociais

Entenda o caso

Segundo a família, Lívia foi até o local, no último dia 5, para se candidatar para a vaga e estava havia quatro horas em um treinamento quando a polícia chegou. Ela e outras 17 pessoas foram detidas.

A mãe da jovem, Cristiane Ramos, diz que ela estava desempregada havia dois meses e em busca de uma nova oportunidade de trabalho. Assim que viu a vaga na internet, decidiu no mesmo dia ir até o local para se inscrever e pegar mais informações.

A jovem chegou às 10h, se candidatou e, no mesmo momento, a empresa pediu para que ela fizesse um treinamento no computador. A vaga seria para vender consórcios com direito a comissão em cima das vendas.

Por volta das 14h, os agentes chegaram à sede da empresa e realizaram prisão em flagrante dos 18 jovens que trabalhavam naquele momento.

Na internet, a Icon Investimentos se autodenomina uma empresa especializada em consórcio, mas, segundo a Polícia Civil, eles praticavam golpes com anúncios de carros, motos e caminhões inexistentes e fizeram ao menos 1000 vítimas. A corporação explicou que as prisões ocorreram após investigação motivada por registros de ocorrência.

Advogada da empresa, Tânia Faial, diz que a "Icon Investimentos é idônea, que todos são inocentes e que tudo será provado".

O que disse a Polícia Civil sobre o caso

"Durante diligência no escritório onde os golpes eram aplicados, 18 pessoas que trabalhavam no local, naquele momento, foram presas em flagrante. Houve apreensão de computadores, aparelhos de telefone celular, documentos, incluindo contratos em nome das vítimas e um roteiro utilizado para a prática do estelionato. O grupo foi conduzido para delegacia e optou por só se manifestar em juízo. O caso foi enviado à Justiça que, em audiência de custódia, manteve as prisões."